Produtores questionam se tudo deve virar musical após MC Guimê ganhar o seu
A notícia de que em breve deve entrar em cartaz um espetáculo musical inspirado em MC Guimê levantou uma questão: afinal, tudo pode virar um musical? Cláudio Botelho, que já produziu no Brasil "Os Miseráveis", "West Side Story", "Miss Saigon", entre outros, acha que sim, mas com ressalvas.
"A Bíblia já virou musical, com ‘Jesus Cristo Superstar’, as tragédias gregas também já viraram, Shakespeare já virou. Até a história de um assassino serial, com Sweeney Todd, também já foi para os palcos", diz ele. "Porém, todas elas foram obras de arte. O que vemos no Brasil não é dramaturgia, e, sim, um sósia interpretando as músicas de cantores famosos", criticou o produtor, lembrando das peças sobre a Cássia Eller, Tim Maia, Elis Regina e Cazuza. Além do musical sobre a vida do Chorão, do Charlie Brown Jr., que Botelho disse não saber quem é.
Já o musical de MC Guimê, ainda sem nome, terá orçamento de R$ 1,5 milhão e ainda está na fase de captação. De acordo com os produtores, ele contará a história de Piu, o filho de uma família humilde de Osasco, na Grande São Paulo, que se apaixona por uma menina que é fã de MC Guimê. Para conquistá-la, o garoto vai usar todo o seu talento para também virar rapper.
"Acho uma grande responsabilidade", disse MC Guimê ao UOL, por e-mail. "Acho que é uma forma de poder contar ao meu público uma trajetória que é a realidade de muitos meninos do Brasil. Um garoto humilde da periferia que tem o sonho de ter uma vida melhor", contou. "O musical não é sobre a minha vida. Ele é inspirado na minha imagem para falar sobre a cultura da periferia."
Para Botelho, essas peças não têm nada a ver com "teatro musical". "Não sei como não fizeram ainda um sobre a Dilma", alfinetou. "Não questiono se a peça é boa ou não. Apenas que ela não é musical. As canções de Cássia Eller ou Elis são ótimas e serão tocadas durante muitos anos ainda. Mas será que esses teatros musicais sobre elas serão remontados daqui a 20 anos, como ocorre com a "Ópera do Malandro", do Chico Buarque?", questionou.
O produtor cita como exemplo o musical sobre Elis Regina. "Ele conta a história da Elis? Acho que não, porque ele não conta como ela morreu. As artistas fazem superbem o cover da Elis, mas o programa do Raul Gil também está repleto de bons cantores que fazem cover. Nem por isso viram musicais."
Mas até Cláudio Botelho já fez musicais inspirados em artistas famosos, como os Beatles, Milton Nascimento e Chico Buarque. "Mas não eram biográficos. Essas produções usavam as músicas dos artistas como suporte, num gênero chamado 'de revista’, amplamente utilizado pela Broadway", explicou.
A produtora Stephanie Mayorkis, diretora da Divisão de Teatro da T4F, empresa responsável por trazer ao Brasil musicais da Broadway como "Mudança de Hábito", "O Rei Leão" e "A Bela e a Fera", também acha que há espaço para todos. "Acreditamos que o público sabe escolher o que é bom e o que é ruim. Se um musical não for bom, não vai ter público", garantiu. "Fazer um musical exige muitas coisas. As pessoas poderiam fazer só um teatro ou só um show. Mas, ao misturar os dois, as coisas complicam", disse.
Stephanie lembra que um musical tem, no mínimo 23 atores, de 10 a 15 músicos, e uma equipe de backstage que pode chegar a 100 pessoas. "Um aumento de produções musicais é saudável para o mercado. No final, acho que o filtro é o público. Vai ser ele que vai escolher se aquele tema mereceu virar musical ou não."
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