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Grupo mapeia arte urbana de Rio e SP com ajuda do Instagram

Mariane Zendron

Do UOL, em São Paulo

11/03/2015 11h03

Desde que nasceu no Brasil, na década de 1970, a arte urbana grita os sentimentos de uma cidade, mas também sofre com sua constante mutação. Nada garante que o grafite de hoje será o mesmo amanhã. Alguém pode, por exemplo, acusar uma obra de representar o rosto de um controverso líder latino-americano, e ela sofrer alterações dias depois, como ocorreu nos Arcos do Jânio, no centro de São Paulo, em fevereiro deste ano.

Com uma hashtag e auxílio do Instagram, o grupo formado pelos amigos  Marcelo Alves, Miguel Athayde, Joana Palhares e Rafo Castro criou uma ferramenta para mapear a arte das ruas e reunir informações sobre ela. Em um ano e meio, o movimento independente Street Art já reuniu mais 13 mil imagens de 1.200 colaboradores no Rio de Janeiro.

Em São Paulo, onde funciona há apenas alguns meses, já são mais de 6.000 imagens reunidas. Para participar, o usuário do Instagram marca a foto da obra com a hashtag #streetartsp (no caso de São Paulo) ou #streetartrio (no Rio). Depois, as imagens ficam reunidas nas respectivas páginas de cada movimento. Nelas, os usuários podem acrescentar o nome do artista, localização e detalhes da obra. "Incentivamos as pessoas a continuarem tirando fotos das obras, mesmo que elas já tenham sido mapeadas, justamente por causa desse movimento contínuo", diz Marcelo Alves, por telefone, ao UOL, referindo-se à constante mudança por que passam os grafites.

BH, Curitiba, Paris e Londres

Rafo Castro e Marcelo Alvez em entrevista para a Rede Globo - Reprodução/Rede Globo - Reprodução/Rede Globo
Rafo Castro e Marcelo Alves, criadores do movimento Street Art, em entrevista para a Rede Globo
Imagem: Reprodução/Rede Globo
Em dezembro, de 2013, a famosa dupla de artistas OsGemeos fez um grafite em um muro conhecidamente proibido na lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro. Poucos dias depois, o mural foi coberto de cinza pela prefeitura, mas o movimento registrou a pintura desde sua criação até o seu fim. "Isso sem mídia, foi tudo espontâneo. Quando lançamos o movimento, queríamos saber se as pessoas achariam tão legal quanto a gente, e deu certo."

Até agora, o único retorno que o grupo teve foi a adesão das pessoas. O retorno financeiro ainda é zero, garante Marcelo. Neste ano, o grupo deve lançar os movimentos em outras capitais do Brasil e do mundo, como Belo Horizonte, Curitiba, Salvador, Nova York, Paris e Londres. "Poderíamos lançar de uma vez no mundo todo, mas, quando você ativa cidade a cidade, cria laços com a comunidade local. E é por isso que o projeto tem tanto sucesso". A expansão global ganhará o nome de StreetArtHunters. 

Em breve também será lançado um aplicativo de reconhecimento de imagens que ajudará na catalogação dos artistas. "O funcionamento será parecido com o do Vivino, aplicativo que identifica o vinho e algumas de suas informações básicas: composição, ranking, país de origem. Com um aplicativo de reconhecimento, fica mais fácil expandir o projeto para qualquer cidade do mundo." 

Centro de referência

Marcelo Alves, do Street Art

  • Arte urbana é a voz da sociedade. Se acontece alguma coisa, já tem alguém falando bem ou mal, e é para todo o mundo ver

    Marcelo Alves, Criador do movimento Street Art
Marcelo e equipe também buscam um espaço físico no Centro do Rio de Janeiro que servirá de centro de referência para o grafite. O espaço reunirá o que há por trás de cada intervenção, como a história envolvendo OSGemeos e a lagoa Rodrigo de Freitas. "Toda vez que apontava uma obra para (o artista plástico) Rafo Castro, que é um enciclopédia de arte urbana, ele me contava o que tinha por trás. Por isso queremos um espaço para reunir essas informações."

A ideia é que o espaço funcione nos moldes do Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, com muita tecnologia, história e interatividade. "Mas não gostamos de chamar de museu porque, se você pega a arte urbana e coloca no museu, ela vira arte contemporânea. A ideia é que as pessoas visitem o espaço e depois partam para as ruas para ver as obras de perto."

Falando do movimento na cidade, Alves também cita o artista Marcelo Eco, que, durante as manifestações de 2013, fez uma intervenção na própria obra, desenhando uma máscara sobre o rosto de um de seus personagens. "Daqui a dois, três anos, isso se perde e não terá mais sentido. Gostaria muito de explicar isso para o meu filho depois. Arte urbana é a voz da sociedade. Se acontece alguma coisa, já tem alguém falando bem ou mal, e é para todo o mundo ver."

Rio e São Paulo 

O empresário não coloca em oposição as duas cidades que já alimentam as hashtags e diz que a aceitação é muito boa nas duas capitais. "Quando um muro é apagado no Rio de Janeiro ou em São paulo, as pessoas reclamam. A recepção hoje é muito diferente da década de 80, quando as pessoas acreditavam que era mais uma forma de vandalismo."

Marcelo também acredita que o que aconteceu nos Arcos do Jânio faz parte de um debate saudável. "É importante que aconteça o que aconteceu nos Arcos do Jânio. A gente quer ver as pessoas refletindo. Começa um debate saudável e, partindo da arte urbana, se fala de outras coisas."