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Exposições pop de 2014 levaram público novo para museus, dizem curadores

Mariane Zendron

Do UOL, em São Paulo

19/12/2014 07h00

Yayoi Kusama, Ron Mueck, Salvador Dalí e David Bowie são artistas de estilos, nacionalidades e épocas diferentes. Em 2014, no entanto, eles dividiram o mérito de ter arrastado milhares de brasileiros para dentro de museus.

Só a exposição da japonesa Yayoi Kusama atraiu 500 mil visitantes ao Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, durante dois meses em cartaz com entrada gratuita. A de David Bowie, por sua vez, levou ao MIS (Museu da Imagem e do Som) mais de 80 mil pessoas entre 31 de janeiro e 20 de abril, com ingressos que iam até R$ 10. 

Ainda em cartaz, a mostra do artista plástico australiano Mueck, na Pinacoteca do Estado de São Paulo, já atraiu 100 mil pessoas em 30 dias. Já a que relembra o programa infantil de TV “Castelo Rá-Tim-Bum”, no MIS, atingiu o número de 300 mil visitantes nesta semana. A mostra, que vai até o dia 25 de janeiro, terá uma maratona de visitação durante toda a madrugada deste sábado (20) para o domingo. 

Para entender o que foi o 2014 agitado dos centros culturais e o legado que essas grandes exposições deixam para o público no país, o UOL conversou com curadores e diretores do MIS, da Pinacoteca, da OCA e do Tomie Ohtake, todos em São Paulo.

Organização e estrutura
Não é de agora que espaços dedicados a mostras de arte vêm atraindo um grande público. A exposição “O Mundo Mágico de Escher”, de 2011, por exemplo, levou mais de 380 mil pessoas ao Centro Cultural Banco do Brasil de São Paulo.

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Este ano, no entanto, foi essencial para que os espaços culturais aprendessem a lidar com grandes quantidades de visitantes. “Foi a primeira vez que o Tomie Ohtake recebeu esse volume de público. A gente foi descobrindo que são necessárias algumas adaptações”, contou o curador Paulo Miyada.

O Tomie Ohtake e o MIS, por exemplo, passaram em 2014 a trabalhar com o sistema de senhas nas filas, que limita a quantidade de pessoas por dia, diminui o número de gente esperando do lado de fora e evita a dúvida de que será possível entrar ou não. Outra medida, segundo Miyada, foi dobrar a quantidade de sinalização, monitores, seguranças e educadores.$escape.getH()uolbr_geraModulos('embed-citacoes','/2014/andre-sturm-1418762156444.vm')

Mesmo depois das exposições-hit de Stanley Kubrick –de 11 de outubro de 2013 a 12 de janeiro de 2014, com 80 mil visitantes— e David Bowie, o diretor do MIS, André Sturm, conta que o primeiro fim de semana da mostra Castelo Rá-Tim-Bum pegou todos de surpresa. “Já tínhamos tomado uma série de medidas do Kubrick para o Bowie, mas não esperávamos o que aconteceu com o Castelo. Na segunda seguinte, implementamos o sistema de senhas, e as filas diminuíram enormemente.”

Mesmo assim, alguns moradores fizeram um abaixo-assinado contra o museu para reclamar da perturbação do “descanso noturno, bem como da rotina diárias dos cidadãos” do bairro. Três meses depois da iniciativa, Sturm diz que o assunto já foi superado. “Isso foi um movimento de meia dúzia de vizinhos, mas não prosperou. É só egoísmo. Eu fico triste, mas é um assunto que eu considero superado”, diz ele.

Selfies
Ao vencer as horas de fila, muitos visitantes já entram nos espaços sedentos por uma selfie ou apenas uma fotografia da obra de arte, mesmo. O comportamento foi muito debatido pelos organizadores das exposições e tratado de maneira diferente por cada local.

Para Miyada, a fotografia é uma maneira que as pessoas encontraram de reagir quando estão diante de algo especial. “As pessoas tiram foto quando estão comendo algo especial, quando encontram alguém especial. É um instinto que começa antes das exposições. Acho legítimo e plausível, mas com o tempo teremos que lidar com isso inventivamente.” Segundo ele, será necessário identificar os momentos em que essa prática pode ser estimulada, eletiva ou que não seja possível.$escape.getH()uolbr_geraModulos('embed-citacoes','/2014/paulo-miyada-1418762252026.vm')

Já Sturm acredita que o “clique a clique” funciona como o “boca a boca”. É o que faz pessoas levarem os conhecidos para os eventos culturais. “Nós somos a favor. As pessoas têm essa relação com a foto, e isso tem efeito multiplicador. O antigo boca a boca é o novo clique a clique, e esse é o mais forte comunicador, porque você confia nos seus amigos.”

A administração do Museu da Cidade - OCA, por sua vez, que recebeu 380 objetos da civilização maia na exposição Mayas: Revelação de um Tempo sem Fim, entre 10 de junho e 24 de agosto deste ano, não viu outra alternativa a não ser proibir as fotos. “Estávamos com um material único, além do compromisso com entidades internacionais. Se uma pessoa se apoiasse para tirar uma foto, poderia danificar a obra”, disse Afonso Luz, diretor do museu.

Novos visitantes
Todos os espaços também receberam, em 2014, gente que entrou em contato com a arte pela primeira vez. Um indício disso é um levantamento feito pelo Google para a revista "sãopaulo", do jornal “Folha de S.Paulo”, que mostrou que o MIS foi o segundo lugar da capital paulista cujo endereço foi o mais buscado no site, perdendo apenas para a localização do Detran. “Isso mostra que, se as pessoas procuram o endereço, é porque não sabem onde fica, são novos visitantes”, diz Sturm.

Miyada garante que o público novo, que pode representar mais da metade de quem vai à maioria das exposições no Brasil, pode trazer uma visão interessante sobre arte. “Esse público, se for cativado e fidelizado, também pode ser bastante renovador para a discussão de arte no Brasil”, diz o curador.

“Oitenta por cento do público que vem ver o Ron Mueck nunca pisou na Pinacoteca”, diz Paulo Vicelli, diretor de relações institucionais da Pinacoteca. “Como é uma visita relativamente rápida, o visitante pode ver outras coisas, como obras do [Roberto] Burle Marx, ‘Tiradentes Supliciado’, de Pedro Américo, e nosso acervo. As pessoas acabam vindo para a exposição e descobrindo um museu todo novo também”, diz Vicelli.

Museu para todos
A aproximação do público geral também desmistificou a ideia de que museus são para visitantes muito especializados. “A arte contemporânea parece muito mais hermética do que realmente é. Claro que é uma linguagem nova, como ouvir uma música pela primeira vez. Pode ter um estranhamento necessário, aquele período de insistência” , diz Myiada.

Para que isso continue nos próximos anos, o curador do Instituto Tomie Ohtake acredita que é necessário fortalecer as exposições de médio porte também. “A gente tem um déficit de projetos de médio porte e longa duração. Espero que a gente consiga fechar essa lacuna em breve”, diz ele. 

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