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Escritora francesa usa humor para abordar temas sérios em suas obras

Rodrigo Casarin

Do UOL, em São Paulo

13/11/2014 05h00

Sentada no chão de sua casa com canetões, cola e tesoura ao seu redor, num processo de criação que define como verdadeiras bricolagens de palavras, ideias e desenhos. É dessa maneira que a francesa Françoize Boucher elabora os textos e ilustrações de seus bem-humorados e criativos livros. São obras com nomes bastante sugestivos: "O Livro que Faz Amar os Livros Mesmo que Você Não Goste de Ler", "O Livro que Explica Tudo Sobre Seus Pais (Por Que Eles Obrigam Você a Comer Legumes e Tudo Mais)", "O Livro Que Faz Você Megafeliz" e "O Livro que Finalmente Diz Tudo Sobre Meninas e Meninos (O Fim do Grande Mistério)", todos recém-lançados no Brasil.

Nas páginas desses títulos há personagens como Marco Página, o marcador de páginas, e tiradas que não funcionariam se reduzidas somente ao texto. Apesar do tom divertido, a cada título Françoize se concentra em um assunto "sério e importante, que diga respeito ao humano. Penso que em nosso mundo, que se tornou tão materialista, é super impotante abordar assuntos permanentes, como as relações entre pais e filhos, meninos e meninas, a felicidade...". O objetivo da autora é lançar um olhar novo, divertido e com uma nova perspectiva sobre os temas que aborda. "Desejo que meus livros ajudem os leitores a viver melhor, a se questionarem, a se construírem. Quero fazer meus leitores refletirem, quero surpreendê-los, mas de uma maneira sempre enternecida e positiva. Meu trabalho é falar de uma forma superséria brincando ao máximo!".
 
A partir disso, deseja que seus leitores possam ver a vida de forma mais leve e otimista. Para tal, diz que não há assunto a ser evitado, provavelmente por isso as abordagens em temas como a transexualidade e o possível ar de estupidez dos egocêntricos. "Com graça e inteligência, podemos tratar todo e qualquer tema", confia.

Françoize Boucher

  • Não posso imaginar que alguém consiga ser completamente feliz se não tiver bom humor, mas espero estar enganada

    Françoize Boucher
Cores e humor
 
Os livros de Françoize também chamam atenção pelas cores fluorescentes que a autora emprega a cada página – a começar pelas capas -, algo que considera sua marca e uma forma de transmitir felicidade. "Não sei viver sem cores. Em minha casa tudo é colorido". A junção de tons, desenhos, textos e, por vezes, situações ou tiradas pouco prováveis, resulta em livros que flertam com o surrealismo, algo que a própria francesa assume. "Gosto muito de me descolar um pouco da realidade por meio do humor, da poesia, do sonho, do absurdo... acho que isso enriquece a vida".
 
O humor, outro traço evidente a cada página das obras, é encarado como algo "diretamente ligado à felicidade e à leveza" pela autora. "Não posso imaginar que alguém consiga ser completamente feliz se não tiver bom humor, mas espero estar enganada". Contudo, ela alerta que não encara o substantivo como um simples traço superficial do caráter de uma pessoa, mas algo que permite a comunicação indireta de ideias muito sérias. "A função do humor é capital; ele permite distender o espírito do corpo para atravessar a vida, que, ás vezes, é difícil, de maneira alegre e positiva. O humor cria laços, cumplicidade, calor entre os seres humanos. Não estou falando do humor que zomba, falo de um humor mais sutil".

"Simplesmente eu"
 
A francesa demora cerca de seis meses entre a ideia e a finalização de uma obra, ainda que seu processo não seja nem um pouco linear. Sua inspiração pode vir de qualquer lugar. "Eu sou uma espécie de esponja que absorve tudo o que vê e escuta, mas minha inspiração vem também, em grande medida, do meu cotidiano". É que a autora vive junto de seu marido e dos quatro filhos, num ambiente "alegre, muito pouco organizado, mas muito caloroso e divertido".
 
Além disso, ela - que prefere não revelar a idade, mas entrega que tem um filho de 21 anos -, acredita que ainda carrega consigo um bom tanto da criança que foi outrora e colhe em um caderno as ideias que às vezes chegam aos montes, mas em outras oportunidades só aparecem depois de grandes esforços. "Geralmente não há ordem na criação. Tudo vem ao mesmo tempo: a ideia, as palavras, os desenhos".
 
O passado de Françoize provavelmente a ajuda nesse processo criativo. Antes de se dedicar aos livros, a autora formou-se em marketing, atuou em conceituadas organizações e foi diretora de coleção de uma empresa de moda. Além disso, desde pequena sempre escreveu muito em seus cadernos. Começa cada título após encontrar o tema do livro. Em seguida, anota e desenha tudo que lhe vem à cabeça. "Não me censuro em nada; amo essa fase de total liberdade. É como uma brincadeira". Depois, transforma todas as ideias em um livro coerente. "Talvez seja esse o momento que brinco menos", explica a artista que acha difícil rotular o seu trabalho. Escritora? Designer gráfica? Artista plástica? Desenhista? Nada disso. "Me categorizo como 'simplesmente eu'. Fabrico meus livros do mesmo modo como cozinharia".
 
"O Livro que Explica Tudo Sobre Seus Pais" - Divulgação - Divulgação
Capa de "O Livro que Explica Tudo Sobre Seus Pais"
Imagem: Divulgação
 
Novo livro, game, desenho para televisão...
 
Outro problema que Françoize encontra é definir qual o tipo de público que seus livros visam. "É claro que meus editores os classificam na categoria 'juvenil', mas eu me dirijo à porção de criança que todos levamos dentro de nós, e que é feita de espontaneidade, de alegria, de simplicidade, de disposição ao riso em todas as circunstâncias". Diz que suas obras normalmente fazem sucesso dentre os adultos e muitas vezes desencadeiam discussões sobre assuntos sérios a partir das brincadeiras aparentemente inocentes. "Bem no fundo do meu coração, meus livros se destinam aos humanos em geral, dos 3 aos 103 anos".
 
Dessa forma que viu seu trabalho, até o momento, ser traduzido para cerca de 20 línguas e ter sido publicado em países de todos continentes, exceto a África. Acaba de lançar na França um caderno de exercícios associado ao "O Livro que Explica Tudo Sobre Seus Pais" e, no momento, cria "O Livro que Finalmente Explica Tudo Sobre Seus Amigos” e desenvolve um game previsto para sair no Natal de 2015, que se chamará “O Jogo que Te Faz Super Feliz". Também elabora um projeto de desenho animado para a televisão, mas diz que isso levará mais tempo para se concretizar.
 
"O Livro que Faz Amar os Livros Mesmo que Você Não Goste de Ler"
"O Livro que Explica Tudo Sobre Seus Pais (Por Que Eles Obrigam Você a Comer Legumes e Tudo Mais)"
"O Livro Que Faz Você Megafeliz" 
"O Livro que Finalmente Diz Tudo Sobre Meninas e Meninos (O Fim do Grande Mistério)"
Autora: Françoize Boucher
Editora: Pá de Palavra
Número de páginas: 120 páginas cada
Preço: R$34,50 cada