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Em livro, Adriana Falcão transforma tragédia dos pais em história leve

Adriana Falcão lança o livro "Queria Ver Você Feliz" - Reprodução
Adriana Falcão lança o livro "Queria Ver Você Feliz" Imagem: Reprodução

Mariane Zendron

Do UOL, em São Paulo

13/10/2014 07h30

Adriana Falcão é ligada a projetos que, em comum, carregam o humor e a alegria. Ela escreveu roteiros e diálogos para as séries "A Grande Família" e "Louco Por Elas", da Rede Globo, e para os filmes "O Auto da Compadecida" e "Se Eu Fosse Você" (1 e 2). Também é escritora e seus livros de mais sucesso são dedicados ao público infantil. Mas, muito antes de pensar em escrever histórias felizes, Adriana enfrentou uma história trágica dentro de casa. Seu pai cometeu suicídio em 1978 e a mãe morreu de uma overdose acidental de medicamentos 13 anos depois. O caso foi transformado no livro "Queria Ver Você Feliz", lançado pela editora Intrínseca.

Para contar a história com final inevitável e trágico, Adriana foi leve como costuma ser. "Não só neste livro, mas na minha vida inteira, eu queria ver essa história da forma mais leve possível. Era importante para eu sobreviver, e não era impossível porque a minha mãe era uma pessoa muito engraçada", contou ela, por telefone, ao UOL. Adriana chegou a ouvir que essa ou aquela religião puniam os suicidas. "E eu sempre puxei pelo lado mais leve, dizia: 'Não, Deus vai entender que estava difícil para ele (seu pai)".

Não é ela, no entanto, quem narra a história de amor entre Caio e Maria Augusta, mas o próprio Amor. "Escolher o Amor como narrador nem foi para deixar a história mais leve, mas não quis contar na primeira pessoa porque tive medo de resvalar no piegas, no meu sentimento. Ao dar uma alma ao narrador, escondo a minha".

Maria Augusta e Caio se apaixonaram quase instantaneamente depois de trocarem olhares na Fonte da Saudade, no bairro carioca da Lagoa, no final dos anos de 1940. Assumidamente arrogante e bem humorado, o Amor analisa a história com todos seus acertos e tropeços, e com distanciamento. "O fato é que eu poderia contar qualquer história de amor, mas se hoje minha memória anda às voltas com esta, de Caio e Maria Augusta, culpo quem abriu um certo baú florido onde estavam guardados cartões, bilhetes, retratos e cartas", explica-se o Amor.

O baú florido

Quando Maria Augusta morreu, em 1991, depois de uma madrugada de agonia, calmantes e bebidas, as três filhas do casal tiveram de fazer a repartição dos objetos. "Aquele momento é horrível. Estava tão mexida que não queria ficar com nada, mas quando vi o baú, quis ficar com ele". Por muitos anos, o baú com as cartas que o casal trocou ao longo dos anos ficou quase intocado. "Algumas vezes chegava em casa e minhas filhas [Isabel e Clarice] estavam lendo as cartas. Tinha coisa triste ali, mas muita coisa engraçada também. As meninas se divertiam, mas me deixava um pouco agoniada".

A coragem de encarar o baú surgiu há três anos quando Adriana recebeu em sua casa a visita das irmãs, Rosina e Patrícia. "Ao lado delas eu me senti segura de ler as cartas. Rimos, choramos, tomamos Frontal [tranquilizante]. Enfim, foi uma catarse", disse ela. Rosina e Patrícia acreditavam que a irmã, que sempre foi boa com as palavras, podia dividir aquela história cheia de alegria e sofrimento com outras pessoas.

"Queria Ver Você Feliz", de Adriana Falcão - Reprodução - Reprodução
Capa do livro "Queria Ver Você Feliz", de Adriana Falcão
Imagem: Reprodução

No mesmo período, Adriana, passava por um momento de crise pessoal. Depois de um casamento de mais de 30 anos, ela estava se separando de João Falcão, também seu parceiro profissional de longa data. "Tinha acabado de me separar de um casamento longo e muito feliz, de um grande amor. Eu precisava reinventar a minha vida. De repente, aos 49 anos, eu pensei: 'Caramba, e agora? Como vai ser a vida?'. Acho que eu tive um momento de crise e foi legal dar esse mergulho na minha ancestralidade, no meu passado, na minha infância e na minha adolescência".

Doidices da família

Por meio das cartas é possível perceber a intensidade da mãe, o ciúme do pai, a ansiedade de ambos. Tudo isso fez com que Adriana e o Amor refletissem sobre os limites da doidice, como ela mesma diz. "É uma história que faz pensar em muitas coisas, em doidice de uma maneira geral, que é uma coisa que todo mundo tem. O livro se aprofunda no tema e pergunta: 'Até onde é normal? O que é ser normal?'".

Adriana conta que ela e as irmãs são tão intensas quanto os pais, mas que elas têm consciência disso. "Eu e minhas irmãs herdamos essas ansiedade, essa agonia, mas a gente tem muito cuidado com isso. Eu sinto que eu vivo no limite, do possível e do impossível. Aí eu tenho que dar um passo para trás. Esse é mais um motivo que eu achei que tinha que dividir essa história com os outros".

Adriana é mãe da atriz e cantora Clarice Falcão, que também herdou a "doidice" e as canalizou em letras de músicas tragicômicas, como "Oitavo Andar": "Quando eu te vi fechar a porta/ Eu pensei em me atirar pela janela do 8º andar". "A Clarice é outra louca. As outras (Tatiana e Isabel) também são. E eu acho isso lindo. Quando eu digo 'doida' é no melhor sentido da palavra. As três nasceram com esse humor. Quando o Gregório [Duvivier, marido de Clarice] terminou de ler o livro, ele disse: 'Caramba, acabei de entender completamente a Clarice'".