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"Ficamos expostos aos leões", diz ator sobre musical de "Se Eu Fosse Você"

Mariane Zendron

Do UOL, em São Paulo

12/08/2014 06h00

Helena e Cláudio têm mais de 40 anos e formam um casal em crise. Depois de mais um dia de brigas, eles misteriosamente trocam de corpo e são obrigados a viverem na pele as dificuldades de ser homem e mulher. Uma das histórias mais famosas do cinema brasileiro, "Se Eu Fosse Você", agora é um musical que chega a São Paulo no dia 15 de agosto, no Teatro Cetip, dentro do Instituto Tomie Ohtake, depois de uma temporada de quatro meses no Rio de Janeiro.

Nesse período, a peça foi arredondada e atores tiveram que provar que o que se mostra no palco é diferente do que foi visto nos dois filmes de Daniel Filho. Claudia Netto e Nelson Freitas encaram o desafio (nada fácil) de encarnar o casal que ficou muito marcado pelas atuações de Glória Pires e Tony Ramos, nos filmes de Daniel.

Em entrevista ao UOL, Nelson reconhece a dificuldade fazer um espetáculo em cima de um filme de sucesso. "Ficamos expostos aos leões. Foi muito difícil para mim e para Cláudia que estamos ali, no fogo", contou o ator, conhecido por sua atuação em "Zorra Total", mas que começou a carreira no teatro na década de 1980.

Apesar das dificuldades, os dois têm discurso parecido quando são questionados se houve preocupação em aceitar os papeis. "Tony é um monstro da atuação, claro, mas a contribuição dele foi para uma obra cinematográfica. Sei que às vezes a comparação do meu desafio e do ele é inevitável, mas há um abismo entre teatro e cinema. No teatro, tudo é aqui e agora".

Para Claudia, atriz que já encarnou Judy Garland em outro musical, diz que é uma honra e não um peso reviver um papel que já foi de Glória Pires. Mas para ela, teatro e cinema têm linguagens muito diferentes."A pessoa pode até chegar pensando na Glória, mas lá ela vai ter que desligar. Pra mim, teatro é outra linguagem e quando peguei o roteiro, vi que o papel era pra mim", disse ela.

Troca de atores

Hoje, eles se dizem muito tranquilos nos papeis que primeiramente foram oferecidos a Cláudia Ohana e Rodrigo Lombardi, que acabaram abrindo mão do trabalho por conta de outros compromissos. "Os atores já ensaiavam há mais de 20 dias quando recebi um telefonema do Alonso (Barros, diretor do espetáculo). Fui às pressas para o Rio. Foi meio na correria, mas foi muito bom", contou ela.

Mais do que não serem comparados a Tony e Glória, Claudia e Nelson dizem que se esforçaram para não ficarem caricatos durante a troca de corpos. "Achei que depois da Judy Garland, eu faria essa comédia com o pé nas costas, mas não foi bem assim. Tive que me desconstruir muito e observar muito o Nelson porque é fácil cair numa caricatura", disse ela.

Segundo Cláudia, Nelson e Alonso, o musical passou por muitas modificações ao longo da temporada no Rio. "Na Broadway, os atores viajam com a peça para testar a aceitação do público, cortar o que não serve. Não tivemos esse tempo. Fomos arredondando a história. Quem assistir agora verá uma espetáculo completamente diferente".

No início da temporada do Rio, o espetáculo recebeu críticas negativas. Segundo o jornal "O Globo", a impressão é de que se estava diante de um produto reciclado. Sem ser questionado diretamente sobre as críticas, Freitas também mencionou as mudanças do espetáculo. "Quando estreou era uma coisa e agora é outra totalmente diferente", disse. O diretor Alonso Barros, que mora em Viena, disse ter ficado dois meses sem ver o espetáculo e quando voltou, viu muitas mudanças. 

Daniel Filho disse à reportagem que não houve receio de levar para os palcos uma obra cujo sucesso nos cinemas ainda é recente. O primeiro filme foi lançado em 2006 e o segundo, em 2009. "Não houve receio, mas o cuidado para fazer uma adaptação em que houvesse um entrosamento completo entre texto, música e coreografias", contou. Para o diretor, a obra foi para o palcos como um musical porque o gênero já estava em seu sangue. Minha origem é musical, na comédia e na chanchada. Tive o prazer de trabalhar e aprender com Oscarito, Mesquitinha, Walter D´Avila, Silva Filho, uma loucura de comediantes e comediantes cantores. O musical já estava no nosso sangue e na nossa vontade". 

Coreógrafo-diretor

Apesar de ser o responsável pelo sucesso de "Se eu Fosse Você" nas telonas, Daniel Filho foi outro que teve de ser substituído por conta de compromissos profissionais. Alonso Barros, coreógrafo de grande musicais brasileiros e europeus, como “Hair”, “Despertar da Primavera”, "The King and I” e “West Side Story”. "A maioria dos musicais a que assisti é dirigida por coreógrafos. A integração é fundamental, pois não dá para fazer um texto, parar tudo e entrar os bailarinos. E o Alonso Barros, que já seria o coreógrafo, era a pessoa indicada para dirigir a peça, que faria com mais competência que eu, no sentido da integração do musical. Eu sabia que não poderia, mesmo se quisesse, estar presente nos ensaios diante dos compromissos que já tinha assumido". 

Alonso Barros contou que Daniel acompanhou toda a adaptação de perto e ainda falou da oportunidade que ganhou ao assumir a direção. "Aqui no Brasil não é mesmo muito comum ter um diretor-coreógrafo. Na Broadway, o coreógrafo é o segundo crédito mais importante. Então pra mim foi uma oportunidade muito legal". 

Músicas de Rita Lee

Toda essa costura musical nas danças e entre os diálogos é feita com músicas da Rita Lee, que Nelson Freitas classificou como o "pulo do gato de Daniel FIlho" no musical. "Eu estava certo de que o "Se eu fosse você" não poderia ser uma coletânea de músicas. Tínhamos que ter uma boa trilha de um compositor brasileiro. Colocado este problema, minha enteada Barbara Duvivier deu a ideia: e se fosse apenas Rita Lee? E temos a nossa trilha!". 

"A Rita fala muito do universo da mulher, dos desejos mais íntimos. A "Balada do Louco" que a Cláudia canta é a minha preferida. Tem um arranjo de chorar", disse Nelson. No final do espetáculo, um megamix com canções de Rita convida o público a levantar e soltar a voz. "É uma grande oportunidade cantar Rita Lee no teatro. Espero que São Paulo receba bem esta peça", completa Cláudia.