HQ mostra apocalipse zumbi na final da Copa do Mundo
Imagine a final da Copa do Mundo de 2014 disputada entre o Brasil e a Espanha. Imagine o Maracanã lotado. Imagine um vírus que transforma as pessoas em mortos-vivos canibais se alastrando pelo estádio. “Imagine Zumbis na Copa” é uma história em quadrinhos que será lançada no próximo dia 11 de junho, véspera do início do Mundial no Brasil. Escrita por Felipe Castilho e ilustrada por Tainan Rocha, a HQ marca a estreia do selo GiBiz, que pertence à editora Giz Editorial.
Na história, três personagens têm os destinos cruzados no gramado do Maracanã em meio ao início do apocalipse zumbi. O árbitro haitiano René Lyjean, que vive um conflito moral após aceitar suborno de dirigentes para favorecer a seleção brasileira no jogo; o craque camisa nove Edgar, que foge da concentração na noite anterior à final para torrar dinheiro com mulheres em uma boate carioca, onde acaba atacado e mordido por um estranho homem no banheiro; e o ex-ídolo da torcida Jorge Pedreira, alcoólatra e decadente, que tem seus problemas pessoais cruelmente explorados pela mídia e está prestes a se matar, quando recebe, por telefone, o convite para comentar o jogo na cabine de transmissão e acaba indo armado para o estádio.
Nesse contexto e com esses personagens, já dá para perceber que a HQ não retrata apenas uma carnificina com zumbis durante a Copa, mas também contém críticas à corrupção, ao abuso da mídia e ao desleixo dos jogadores milionários. Ou seja, tudo o que há de errado no futebol brasileiro.
Para o autor Felipe Castilho, a indústria do futebol no país pode ser definida como “uma pastelaria suspeita”. “Daquelas que fritam o óleo reutilizado de mais de duas semanas. O pastel é gostoso, mas é melhor não saber como foi feito ou do que foi feito. Confesso que o nosso futebol também é bem gorduroso e me dá mais desprazer do que alegrias”, diz o escritor, que admite que antigamente gostava mais do esporte “Em tempos de uma consciência política e social acessível a todos, acho que muita gente não consegue ter o mesmo tesão pelo esporte de antigamente, sendo que ele é bola rolando apenas em última instância. A politicagem e o executivo fica sempre na frente.”
Em meio à grande quantidade de protestos que acontece no país contra o Mundial e as suspeitas de superfaturamento na construção de estádios para o campeonato, Castilho opina: “imagino que organizar uma Copa não saia barato. Mas eu também imagino que não precisamos de um estádio de R$ 1 bilhão para que, depois da Copa, um time com público pagante em torno de apenas 800 pessoas o utilize. Eu odeio excessos.” Mas acrescenta: “Por outro lado, eu adoro o clima de Copa do Mundo, ou pelo menos adorava quando era apenas um sentimento transmitido pela televisão. Acredito que eu já esteja mudando de ideia”.
Tempo recorde
Segundo o ilustrador e o escritor, “Imagine Zumbis na Copa” foi produzida “em tempo recorde”. “ Foi um processo muito louco Levei exatos três meses para decupar o roteiro, esboçar, arte-finalizar, colorir e colocar os balões com a santa ajuda da minha mulher e de alguns amigos, que deram ‘pitacos’ na arte, cores e tal”, diz o desenhista Tainan Rocha. “E a versão final do roteiro até que saiu rápida”, completa Castilho.
O autor explica que a ideia da HQ surgiu em um trabalho encomendado por outra editora, que havia lhe pedido material em quadrinhos para a Copa. Ele lembra que o projeto “seria gigantesco”, com muito mais personagens. “A única coisa que tinha em comum com o que está sendo lançado era o fato de ser uma final com zumbis no Maracanã.”
Já perto do final de 2013, porém, a editora que havia encomendado o trabalho desistiu dele, mas permitiu que Castilho e Rocha lhe dessem continuidade. No entanto, os dois resolveram deixá-lo de lado por um tempo. No início deste ano, resolveram retomar a HQ. “Eu tinha ideia para outro viés da história toda da Final da Copa, com um árbitro e um ex-jogador, e aquilo ficou na nossa cabeça. No início do ano, resolvemos retomar tudo, meio que no ‘seja-o que-Deus-quiser-mesmo-estando-em-cima-da-hora’. Bom, algumas editoras se interessaram, até pelo tema ter um apelo de vendas muito bem-vindo”, explica Castilho.
Traço sujo e caótico
Uma característica marcante de “Imagine Zumbis na Copa” é o traço sujo e caótico de Tainan Rocha. “Tudo por culpa do meu pincel surrado! Sou cercado pelo caos, minha mesa é bagunçada e, se acabo esbarrando no vidro de nanquim, tento usar esses ‘erros’ sempre a favor. Assim como sempre tento apagar o mínimo possível do lápis, fazendo com que essa sujeira crie uma textura interessante no trabalho”, explica ele, que, no ano passado, lançou de forma independente o livro de poemas e ilustrações “Máquina de Sujar”.
“É como se eu colocasse para bater em uma máquina tudo o que me influenciou ao longo dos anos... Minha relação com o universo mais seco e sujão do rock and roll, a literatura na linha do velho Charles Bukowski e filmes como os do Quentin Tarantino, Robert Rodriguez etc”, diz o ilustrador, que também cita como influência os desenhos de Lourenço Mutarelli, Weberson Santiago, Brucke Caribé, Ralph Steadman e Roger Cruz. “Caras fantásticos, que colaboraram demais para que eu abrisse a minha cabeça e conseguisse trabalhar com ilustração, desenhando gente feia, gente de verdade.”
Perguntado se criou os traços dos personagens Pedreira e Edgar usando como inspiração, respectivamente, o ex-craque Sócrates (1954-2011) e o ídolo Neymar, Rocha admite: “Sim, sem dúvida! No caso do Pedreira, tanto eu quanto o Felipe somos corintianos e gostaríamos muito de homenagear visualmente esse grande ídolo do futebol que foi o Doutor. Mas tem uma pitada do Casagrande também! Já no caso do Edgar, não tive como fugir muito da referência ao Neymar... É um craque em evidência e, por conta do visual que ele ajudou a impregnar nas cabeças pelos campos afora, é uma figura marcante e de fácil associação popular”.
Universo zumbi
Autor da série de livros de fantasia “O Legado Folclórico” (editora Gutenberg), que mistura o universo do videogame com os mitos do folclore brasileiro, Felipe Castilho diz que deve lançar em agosto o romance “A Cidade Incompleta”, com referências à obra de escritores como Stephen King, Neil Gaiman e Phillip K. Dick. Fora isso, ele tem uma coluna de contos ilustrados no site Quotidianos.com.br e já está trabalhando com Rocha em outra HQ, que, avisa, não terá nada a ver com mortos-vivos.
Quanto às suas referências no universo zumbi, Castilho cita o filme “A Noite dos Mortos Vivos”, de 1968, escrito e dirigido por George Romero, cineasta considerado o "pai do gênero". “Inclusive, fizemos algumas homenagens ao George Romero na nossa história de zumbis, entendedores entenderão”, afirma o autor, que também se diz fã do filme de terror/humor negro “Zumbilândia” (2009), da série “The Walking Dead”, tanto na TV quanto em quadrinhos, e do game Left 4 Dead.
Na festa de lançamento de “Imagine Zumbis na Copa”, que acontece no próximo dia 11 em São Paulo, na sede da Quanta Academia de Artes (rua Dr. José de Queirós Aranha, 246, Vila Mariana), com entrada franca, haverá, além de uma mini-exposição das artes originais da HQ, em nanquim, projeção de filmes de zumbis. O evento é aberto ao público e tem entrada gratuita.
“Imagine Zumbis na Copa”
Editora: Giz Editorial
Autor: Felipe Castilho
Ilustrador: Tainan Rocha
Páginas: 48
Preço de capa: R$ 29,90
Onde encontrar: livrarias Cultura, Saraiva, Comix, loja Geek.etc.br e site da Giz Editorial.
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