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Corpo de García Márquez é velado em casa funerária na Cidade do México

Do UOL, em São Paulo*

17/04/2014 20h04Atualizada em 17/04/2014 23h06

O corpo do escritor colombiano Gabriel García Márquez, morto nesta quinta-feira (17) aos 87 anos, está sendo velado na funerária J. García López, na avenida San Jerómino, região sul da Cidade do México. Cerca de 20 policiais fazem a segurança do velório, fechado apenas para família e amigos.

O carro funerário deixou sua casa do autor de "Cem Anos de Solidão" às 19h (17h no horário local), escoltado por três viaturas policiais, e chegou à funerária, localizada nas proximidades, às 19h10. Um forte efetivo policial foi deslocado para fazer a segurança do local.

Um dos filhos acompanhou o corpo no carro funerário, enquanto o resto da família seguiu o cortejo. Atrás deles, dezenas de jornalistas e fotógrafos também o seguiram.

Desde o momento em que a notícia da morte de Márquez foi divulgada, amigos, familiares, leitores e colegas chegaram à sua casa em Paseos del Pedregal --entre eles, a jornalista Fernanda Familiar, próxima da família, e o escritor colombiano Guillermo Angulo, grande amigo de García Márquez.

O carro fúnebre chegou às 18h37 (16h37 na hora local) e entrou abrindo espaço entre representantes da imprensa local e internacional.

Enterro
Ainda não há notícias sobre onde o corpo do escritor será enterrado, mas o governo colombiano oferecerá apoio logístico à família, caso desejem enterrar o Nobel de Literatura em sua terra natal, informou à AFP a ministra colombiana da Cultura, Mariana Garcés.

"Não temos notícia, se é vontade de sua família, ou se Gabo se manifestou dessa forma, que fosse enterrado no México, ou na Colômbia, e, dependendo dessas circunstâncias, o presidente (Juan Manuel Santos) se deslocaria para o México, ou, de qualquer modo, o avião presidencial estaria disponível para a família de Gabriel García Márquez", disse Mariana Garcés à imprensa colombiana.

"Uma profunda tristeza nos embarga. O senhor presidente se dirigirá a todos os colombianos às sete da noite de hoje (horário local), e todos os atos em sua homenagem serão em perfeita concordância com Mercedes, Gonzalo e Rodrigo", frisou a ministra, referindo-se à mulher e aos dois filhos de García Márquez - escritor de língua espanhola mais popular desde Miguel de Cervantes, no século 17.

A ministra declarou ainda que o embaixador da Colômbia no México, José Gabriel Ortiz, esteve "muito próximo da família" de García Márquez nos últimos dias, e que, nesta quinta, o próprio presidente Santos esteve em comunicação por telefone com a família do escritor.

Homenagens e luto na Colômbia

As autoridades mexicanas farão, na próxima segunda-feira (21), uma homenagem nacional no emblemático Palácio de Belas Artes ao escritor colombiano.

"Na próxima segunda, realizaremos no Palácio de Belas Artes uma Homenagem Nacional a Gabriel García Márquez", anunciou o presidente do Conselho Nacional para a Cultura e as Artes de México (Conaculta), Rafael Tovar, em sua conta no Twitter.

Já o presidente colombiano, Juan Manuel Santos, decretou três dias de luto nacional pela morte do Nobel de Literatura. "Como governo e em homenagem à memória de Gabriel García Márquez, decretei luto nacional por três dias e dei ordem para que todas as instituições públicas em nível nacional hasteiem a bandeira a meio pau, como também esperamos que os colombianos façam isso em suas casas", disse Manuel Santos, em um pronunciamento pela televisão.

O escritor, que morreu em casa, foi hospitalizado no Instituto Nacional de Ciências Médicas e Nutrição Salvador Zubirán, na Cidade do México, em 31 de março, onde ficou até o último dia 8, quando voltou para casa. As informações sobre os problemas de saúde que levaram à internação do escritor são desencontradas: a família e o hospital falavam em infecção pulmonar e das vias urinárias; já o jornal "El Universal", o principal do México, afirmava que o escritor sofria de metástase no pulmão, gânglios e fígado -- consequência de um câncer linfático que o acometeu em 1999.

A notícia da morte do autor de "Cem Anos de Solidão" e outros clássicos da literatura universal foi divulgada inicialmente por jornais locais do México e pelo diário espanhol "El País". O presidente colombiano, Juan Manuel Santos, já comentou a morte de García Márquez e decretou luto. "Mil anos de solidão e tristeza pela morte do maior colombiano de todos os tempos", disse o representante do país. 

Em sua página do Twitter, Fernanda Familiar disse que eles estavam unidos no momento da morte. "Deixa de bater o coração de Gabriel García Márquez", escreveu ela na rede social. 

Vida e obra

Considerado o escritor de língua espanhola mais popular desde Miguel de Cervantes, no século 17, García Márquez alcançou celebridade literária que gerou comparações com clássicos das letras universais como Mark Twain e Charles Dickens. Suas obras ficcionais extravagantes e melancólicas --entre elas "Crônica de uma Morte Anunciada", "O Amor nos Tempos do Cólera" e "Outono do Patriarca"-- superaram em vendas qualquer outra publicação em língua espanhola, com exceção da Bíblia.

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O romance épico "Cem Anos de Solidão" vendeu mais de 50 milhões de cópias em mais de 25 idiomas. Publicado em 1967, é um dos exemplos principais do chamado realismo fantástico e marcou um boom da literatura latino americana que durou duas décadas. A obra narra a saga de gerações da família Buendí e foi "o primeiro romance em que os latino-americanos se reconheceram, que os definiu, que celebrou sua paixão, sua intensidade, sua espiritualidade e superstição, sua grande propensão ao fracasso", disse o biógrafo Gerald Martin à agência Associated Press.

Ao receber o Nobel, em 1982, García Márquez descreveu a América Latina como uma "fonte de criatividade insaciável, cheia de tristeza e beleza, do qual este errante e nostálgico colombiano não é mais que uma fração, destacada pelo destino. Poetas e mendigos, músicos e profetas, guerreiros e malandros, todas as criaturas daquela realidade desenfreada, deixaram pouco a extrair da imaginação, porque nosso problema crucial tem sido a falta de meios convencionais para tornar nossa vida verossímil".
 

Biografia
Gabo, como era carinhosamente chamado, nasceu no dia 6 de março de 1927, em Aracataca, na Colômbia. Criado pelos pais de sua mãe, cresceu ouvindo as histórias de seu avô, Nicolas Márquez, veterano da Guerra Civil colombiana, enquanto sua avó, Tranquilina Iguarán, costumava lhe contar lendas que misturavam fantasia e realidade. Essas narrativas foram fundamentais para que mais tarde o garoto se tornasse escritor.

As histórias de seus avós se tornariam também material para a ficção de García Márquez, e Aracataca inspirou Macondo, a vila cercada por plantações de banana no pé das montanhas da Sierra Nevada, onde "Cem Anos de Solidão" se passa. "Minha família me contou muitas vezes que comecei a recontar histórias e coisas assim quase desde que nasci", contou García Márquez em uma entrevista. "Desde que comecei a falar".

Enquanto atuava em jornais, esboçou os seus primeiros contos e uma extensa reportagem sobre o sobrevivente de um naufrágio na costa colombiana resultou no livro “Relato de um Náufrago”, hoje tido como um exemplo de bom jornalismo literário. Ao lado de escritores incluindo Norman Mailer e Tom Wolfe, García Márquez também foi um pioneiro da narrativa de não-ficção que se tornaria conhecida como New Journalism ou Novo Jornalismo.

Pobre e esfarrapado durante grande parte de sua vida adulta, García Márquez foi transformado por sua fama e riqueza tardias. Um "bon vivant" com personalidade travessa, o escritor era um anfitrião gracioso, que contava histórias longas, com animação, para os hóspedes. Ferozmente protetor de sua imagem, uma característica compartilhada por sua esposa, ele ocasionalmente se rendia a um temperamento explosivo quando se sentia menosprezado ou deturpado pela imprensa.

O homem político
Como muitos escritores latino-americanos, García Márquez transcendeu o mundo das letras. Desde cedo, Gabo tornou-se um herói para a esquerda latino- americana, aliando-se cedo ao líder revolucionário cubano Fidel Castro e criticando as intervenções violentas de Washington, do Vietnã ao Chile. Seus textos perfilaram o ex-presidente da Venezuela, Hugo Chávez, além de retratarem como traficantes de cocaína liderados por Pablo Escobar abalaram o tecido social e moral de sua Colômbia natal, sequestrando membros da elite, tema de "Notícias de um Sequestro".

A escrita de García Márquez foi constantemente informada por seus pontos de vista esquerdistas, forjados em grande parte por um massacre de militares a trabalhadores bananeiros em greve contra a United Fruit Company (mais tarde, Chiquita) em 1928, perto de Aracataca. Ele também foi muito influenciado pelo assassinato, 20 anos mais tarde, de Jorge Eliécer Gaitán, candidato presidencial esquerdista em ascensão.
Ao longo da vida, García Márquez recusou ofertas de postos diplomáticos e tentativas de o lançar à presidência da Colômbia, embora tenha se envolvido nos bastidores das negociações de paz entre o governo da Colômbia e os rebeldes de esquerda.

Os últimos anos
Os últimos anos de vida de Gabo foram marcados por relatos sobre problemas de memória , que não foram confirmados oficialmente. As aparições públicas de García Márquez também foram mais escassas, apesar de ele continuar a socializar com amigos.

Em março deste ano, quando fez 87 anos, o escritor foi homenageado diante da imprensa por amigos e simpatizantes, que lhe deram bolo e flores do lado de fora de sua casa, em um bairro de elite na Cidade do México. Na ocasião, o autor mostrou-se sorridente, recebeu presentes e tirou fotos, mas não falou com os jornalistas. Nos últimos anos, restringiu ao máximo suas aparições em público e declarações por motivos de saúde.

García Márquez deixa a mulher, Mercedes, e os dois filhos, Rodrigo e Gonzalo.