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Nova peça do grupo Satyros terá sexo explícito com transmissão online

Carlos Minuano

Do UOL, em São Paulo

21/02/2014 05h00

Conhecida por montagens ousadas, a companhia teatral paulistana Os Satyros vai comemorar o aniversário de 25 anos de maneira apimentada: com sexo explícito em cena e transmissão ao vivo pela internet. O ato, que será encenado por um casal de atores que terão seus nomes mantidos em segredo, faz parte da peça "Não Fornicarás".

O espetáculo estreia no dia 8 de março, dentro de uma maratona com 9h de duração que apresentará outras seis peças do projeto "E Se Fez a Humanidade Ciborgue em Sete Dias". Após a estreia, as encenações ("Não Amarás", "Não Morrerás", "Não Permanecerás", "Não Saberás", "Não Salvarás" e "Não Vencerás", além de "Não Fornicarás") se revezarão durante a semana no palco do Espaço dos Satyros, na Praça Roosevelt, no centro de São Paulo. Cada uma será apresentada em um dia da semana, sempre às 19h.

O sexo explícito de "Não Fornicarás" está entrelaçado ao tema central do projeto: o impacto da tecnologia na sociedade e nas relações. "Tudo partiu de nossas reflexões sobre o estado em que a humanidade se encontra, diante de uma revolução científica e tecnológica nunca antes vista", contou ao UOL Rodolfo García Vásquez, coordenador do projeto e cofundador do grupo.

A transmissão do sexo explícito, segundo ele, tem a ver com uma discussão cibernética pela qual o grupo tem enveredado. "O sexo contemporâneo está muito mais ligado às fantasias virtuais do que propriamente à sua concretude corporal", disse ele, adiantando que a transmissão será feita por um site de encontros de sexo virtual. "Veremos ao vivo a reação dos frequentadores desse site".

O sexo contemporâneo está muito mais ligado às fantasias virtuais do que propriamente à sua concretude corporal. A transmissão pela internet não é algo externo à peça. Pelo contrário, a reação das pessoas que assistirão ao ato faz parte da cena

Rodolfo García Vásquez

Outros elementos serão utilizados para o desenvolvimento das cenas e da dramaturgia, como robôs, celulares, aplicativos e experimentos científicos. "A transmissão pela internet não é algo externo à peça. Pelo contrário, a reação das pessoas que assistirão ao ato faz parte da cena", explicou Vásquez.

Roteiro de convidados
Para experimentar um processo de criação diferenciado, a companhia teatral convidou personalidades de diferentes áreas para colaborarem com textos-provocações que serão incluídos no roteiro geral. Toparam o desafio Contardo Calligaris, Dráuzio Varela, Marcos Piani, Marici Salomão, Rosana Hermann e Xico Sá.

Segundo Vásquez, não há apenas um texto ou referência sendo utilizado em cena. "Desenvolvemos a dramaturgia a partir de improvisos, textos clássicos e dos artistas envolvidos". O coordenador do projeto destaca ainda a presença do artista uruguaio convidado Pablo Benitez Tiscórnia, que trouxe elementos da robótica para a cena, além do depoimento anônimo de um black bloc e da presença de um hacker em cena.

Mandamentos ciborgues
Os Satyros também buscaram inspiração nos mandamentos bíblicos para a peça --referência declarada nos títulos do projeto e das montagens ("E se fez a Humanidade Ciborgue em Sete Dias"). A ideia, segundo Vásquez, foi buscar a inversão de algumas das "leis sagradas" do conhecido decálogo.

É nesta ponta que o projeto entra no conceito de "humanidade expandida". "Vivemos um tempo de novos paradigmas. Pensamos que somos eternos, indivíduos autônomos, que sempre escorregam por todas as mídias possíveis, que nunca poderemos saber sobre todo o conhecimento acumulado pela nossa espécie. Fazemos sexo virtual e buscamos Deus em novos lugares. Tudo isso faz parte da nova humanidade".

O diretor admite ter usado outras referências para o projeto, como Albert Einstein, Stephen Hawking e Nietzsche. Tudo isso, segundo ele, para entender melhor o "fenômeno da singularidade", sobre o qual os espetáculos buscam refletir. "Os mais renomados cientistas do mundo preveem que, em duas ou três décadas, a ciência fará avanços e descobertas em um ritmo tão veloz que nenhum ser humano poderá acompanhá-la efetivamente".

Novos caminhos para a dramaturgia
A busca por um teatro não linear não é novidade nos Satyros. Desde a criação da companhia em 1989, e de forma mais contundente a partir de 2000, o grupo tem trabalhos marcados pela ousadia e experimentação. A companhia ficou conhecida por montagens provocantes como a Trilogia Sadeana, baseada em Marquês de Sade, com "A Filosofia na Alcova", "Os 120 Dias de Sodoma" e "Justine".

Há cinco anos esse processo culminou em conceitos que o grupo decidiu chamar de "teatro expandido" e "humanidade expandida", e que serão colocados em prática no atual projeto apelidado de "Ciborgue". A pesquisa teve início com o espetáculo "Hipóteses Para o Amor e a Verdade" (2009) e teve prosseguimento nas montagens "Cabaret Stravaganza" (2011), "Inferno na Paisagem Belga" (2012) e "Édipo na Praça" (2013). A bola da vez é a tecnologia. "Hoje seria impossível viver sem nossas próteses cibernéticas", disse Vasquez.