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Vinicius de Moraes era desregrado e despudorado, lembra Geraldo Carneiro

O poeta Geraldo Carneiro na Bienal do Livro do Rio - Fabíola Ortiz
O poeta Geraldo Carneiro na Bienal do Livro do Rio Imagem: Fabíola Ortiz

Fabíola Ortiz

Do UOL, no Rio

07/09/2013 12h51

Vinicius de Moraes ainda não ocupa o lugar que merece na história da literatura brasileira, admitiu o poeta Geraldo Carneiro que, durante a sua juventude, conviveu com o "poetinha". Se estivesse vivo, Vinicius completaria cem anos no dia 19 de outubro. E, em uma homenagem ao centenário do maior poeta amoroso do Brasil, a Bienal do Livro realiza neste sábado (7) um tributo ao autor.

Em conversa com o UOL, Geraldo Carneiro contou como teve a oportunidade de conhecer e tornar-se amigo de um dos mais célebres poetas da literatura brasileira. "Eu não gosto de chamá-lo de 'poetinha', o diminutivo tem sempre um caráter pejorativo, e ele sempre foi um poeta popular", afirmou.

Carneiro foi o primeiro escritor a fazer a biografia de Vinicius de Moraes após a sua morte, em 1983, pela editora Brasiliense. "Ele falava com a maior simplicidade das coisas mais despudoradas", ressaltou.

Na noite deste sábado, Adriana Calcanhotto e os poetas Antonio Cícero e Eucanaã Ferraz farão uma homenagem a Vinicius no Café Literário.


UOL - Vinicius de Moraes já foi tema de escola de samba, de inúmeras homenagens e agora na Bienal. Nada melhor que um evento de livros para homenagear o centenário do poeta?
Geraldo Carneiro - Vinicius tem que ser homenageado permanentemente para que a gente possa admirar a grandeza que ele tem. Ainda mais uma poesia dessa densidade lírica, dessa capacidade de exposição e desse refinamento formal e existencial.

Como foi o seu contato com o Vinicius? Você  era muito jovem na década de 1970?
Eu tinha um pouco menos de 20 anos quando o conheci, e ficamos amigos. Eu tinha com ele uma certa resistência, uma burrice. Convivemos em muitos momentos, ele foi uma pessoa tão superior a tudo que olhou para mim e compreendeu a minha tolice.

Que impressão você teve naquele início de amizade?
Eu e o Paulo Jobim fomos visitar Vinicius, que estava recém separado, na casa de um amigo, em 1970. [Ele estava] Morando na sala de um casal que tinha acabado de ter um bebê, imagina. Era uma situação um pouco precária de alojamento, mas ele se sentia super bem, como se estivesse no Palácio de Buckingham, o rei da Inglaterra, no melhor sentido. Ele gostava de estar no mundo, era bonito ver a forma como se relacionava com o mundo. Comecei a achar ele meio estranho. [Tinha] Uma liberdade. Eu era muito limitado quando era menino. Ele era inteiramente desregrado e despudorado. Fiquei um pouco chocado com aquilo, mas depois compreendi, que a razão é uma forma de desrazão.

Por que, na sua opinião, Vinicius não merece ser rotulado como um poetinha?
Eu não gosto, o diminutivo tem sempre um caráter pejorativo. Acho que Vinicius ainda não ocupa o lugar que merece na história da literatura brasileira por causa do excessivo cultivo da personalidade em detrimento da obra. A sua vida é tão fascinante que eclipsa a força da obra.

Qual é o legado da obra de Vinicius?
É um legado monstruoso. Na minha opinião, ele é o maior poeta amoroso do Brasil que já tivemos. Na língua portuguesa como um todo, tem o Luís de Camões, Florbela Espanca e Fernando Pessoa. Ele é um concorrente.

Quais eram as grandes fontes de inspiração para Vinicius?
A bebida era um instrumento. A pessoa fica mais receptível ao afeto e se liberta das regras comuns do cotidiano. A maior inspiração de Vinicius foi o amor como ideia e o amor encarnado em mulher.

Na sua opinião, vida e obra de Vinicius correm o risco de serem esquecidos, de ficarem num passado distante?
Não creio. A vida talvez não desperte tanta atenção no futuro, mas a obra fica. Daqui a cem anos a obra ainda estará.

Você sempre tem o maior carinho de falar sobre o amigo Vinicius...
É falar de um pai, do grande pai da poesia lírica contemporânea. Acho que ninguém escreve palavras de amor hoje sem prestar tributo ao Vinicius. Para mim, é sempre um grande prazer e uma honra falar de um pai de todos nós.