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Shows, comida na rua, sono e arrastões; "Repórter Viradão" do UOL relata 24 horas de Virada

Thiago Azanha

Do UOL, em São Paulo

20/05/2013 08h28

A missão parecia simples: passar 24 horas na Virada Cultural de São Paulo assistindo aos melhores shows com um  roteiro pré-estabelecido. Mas o desafio ganhou ares de pura sobrevivência no cair da noite e com o surgimento dos temidos arrastões, facadas sangrentas e tiros no meio do público.

Para chegar ao evento, nada melhor que o metrô. Mesmo lotado e sem nenhum tipo de conforto, o transporte público ganha pontos por sua funcionalidade. Cheguei ao Centro com minha namorada às 18h e já seguimos para o show de abertura da cantora Daniela Mercury. O público era formado por casais – tanto do mesmo sexo, quanto do sexo oposto – em clima de romance num show vibrante e divertido.

Depois, revolvemos dar uma volta pelas ruas do Centro para sentir o clima, fazer algumas entrevistas para o UOL e nos deparamos com um ambiente de aparente segurança, repleto de policiais em quase todas as vias. Fizemos uma breve pausa para a janta e guardamos forças para as próximas horas de Virada.

Eis que, logo ao sairmos do restaurante, fomos pegos de surpresa por um barulho que parecia ser uma bomba forte e um imediato corre-corre de pessoas deu-se na sequência. Era o primeiro arrastão que presenciaríamos na noite – outros três arrastões nos aguardavam durante a madrugada.

Mesmo assim, resolvemos nos arriscar juntos e ver o ótimo show do Sidney Magal no Largo do Arouche. Poucos minutos depois, outro arrastão passou por nós, e tentamos nos proteger ao lado de um restaurante. Mais uma vez, saímos ilesos. Para ela, foi o limite da paciência e do temor. Sem hesitar, pegou o metrô e voltou para casa em segurança.

Segui o roteiro previsto e assisti na íntegra à apresentação da banda A Banca, da área reservada para a imprensa em frente ao palco na Avenida São João, na companhia do colega do UOL Tiago Dias. Àquela altura, as ruas do centro haviam se transformado em território de marginais que tocavam o terror no indefeso público, praticando todo tipo de crime.

Por volta das 6h, deixei de ser um espectador em busca de boas histórias e passei a me dedicar à cobertura dos graves crimes que aconteceram durante a madrugada. Passei pelo 2º Departamento de Polícia do Bom Retiro e me deparei com uma cena assustadora: delegacia lotada, com os detidos sentados na calçada, já que não havia mais espaço interno. Vítimas esperavam horas para fazer o Boletim de Ocorrência. Não muito distante dali, presenciei vítimas que chegavam em estado degradante à Santa Casa. A grande maioria envolvida em brigas, com direito a facadas e garrafadas. Um caso extremo chegou ao óbito após receber um tiro. Outro perdeu a vida após ter uma overdose.

De volta para a cobertura in loco da Virada, por volta das 8h, me deparei com as ruas habitadas por pessoas alcoolizadas e garis fazendo a limpeza das vias. Os palcos, por sua vez, estavam minguados de poucos madrugadores dominicais. A única exceção positiva recaia sobre a movimentação nas barracas do projeto Chefs na Rua. Meu café da manhã, inusitado, foi carne de porco com tutu de feijão!

Já com muito sono no final da manhã, e revoltado com a violência descabida, tentei voltar a atenção para os shows da Virada. Nem a apresentação de Wanderléa no Theatro Municipal (minha primeira vez no local) ou uma boa conversa com o Fábio Porchat na Praça da Sé conseguiram apagar as imagens na minha cabeça desta violenta edição da Virada no domingo. As notícias, no período da tarde, deveriam ser focadas no balanço da violência – o clima estava pesado de qualquer forma. Fernando Haddad, e o comando da PM, convocaram uma coletiva com os jornalistas para falar sobre os erros de sua primeira Virada Cultural como prefeito de São Paulo.

Desculpas não apagarão a péssima imagem que a 9ª edição da Virada Cultural deixou nos frequentadores. Eu, como jornalista e paulistano adotado, não pretendo mais voltar para conferir os shows nas ruas do centro da cidade. Por melhores que sejam as atrações, não vale o risco de levar um tiro em plena esquina da Ipiranga com a Avenida São João. Ou em qualquer outro canto da cidade.