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Conheça "O Homem do Ciguri", primeiro quadrinho de Moebius a chegar no Brasil após a sua morte

Jean Giraud, conhecido como "Moebius", posa em frente à Gruber, protagonista da HQ, na França - AFP
Jean Giraud, conhecido como "Moebius", posa em frente à Gruber, protagonista da HQ, na França Imagem: AFP

Carlos Minuano

Do UOL, em São Paulo

23/02/2013 07h00

Não têm do que reclamar os fãs brasileiros do mestre dos quadrinhos, o francês Jean Giraud, mais conhecido como Moebius. Boa parte de seu trabalho foi republicado no Brasil. Tudo em formato semelhante ao original europeu, com direito a capa dura e acabamento de luxo. Agora é a vez de "O Homem do Ciguri", que chega às livrarias no fim desse mês. Inédita no Brasil, a obra apresenta os mundos fantásticos do artista, em roupagem mais colorida e leve.

ENTENDA A HISTÓRIA

A história começa numa pacata saída de metrô, mas não demora pra descambar numa cruzada ambígua e insólita, cheia de naves perdidas e figuras improváveis. Através de uma porta secreta, Major Gruber chega a um mundo alternativo no circuito das Terras Aleatórias, localizada no primeiro nível da Garagem Hermética.

Indagações filosóficas, metafísicas e existenciais estão por toda a parte. Como no trecho em que uma dupla de personagens, um deles totalmente nu, é lançada numa queda vertiginosa rumo a uma constelação glacial "fora da morte", chamada na história de "deserto interno". “É um pouco estranho, mas a gente logo se habitua a não morrer por qualquer coisinha”, comenta um deles, já no chão. “E que fazemos agora?”, questiona o outro. “Caminhamos simplesmente”, responde no melhor estilo zen possível.

Nessa nova e louca jornada, o aflito Major Gruber procura o caminho de volta ao seu lar e aos braços da amada que o espera. Porém, ele se depara com um campo minado de ameaças, bruxarias e riscos de todos os tipos, além de uma legião de seres estranhos. Arqueiros, parasitas alienígenas e até uma jovem assassina dão ar da graça na HQ.

O resultado não poderia ser outro, mais uma vez o gênio dos quadrinhos conduz o leitor por uma aventura psicodélica e alucinada, carregada de surpresas e poesias e com boas doses de humor e erotismo. Por dois motivos, que não valem ser ditos aqui, o final surpreende

O lançamento é uma boa oportunidade para conhecer o premiado desenhista, falecido em 2012, cuja genialidade já foi comparada a de Picasso. A sua influencia é notada em várias gerações, no cinema, na música e em diferentes áreas. É o caso das roupas do Cirque du Soleil, inspiradas nas visões líricas do artista francês. Seu traço e imaginário também estão por trás de grandes sucessos, como "Alien, o 8° Passageiro" e "Blade Runner".

"O Homem do Ciguri", sexto álbum da Coleção Moebius (editora Nemo) traz um colorido vibrante que substitui o tradicional preto e branco. “Desde 1980, Moebius passou a publicar HQs em cores, deixando de lado os tracinhos que ele usava para dar brilho e volume. Com isso, o desenho foi se afinando e ganhando leveza”, observa o editor da coleção e pesquisador de quadrinhos, Wellington Srbek. 

Em "O Homem do Ciguri", o autor retoma a saga de Major Grubert, ou simplesmente Gruber, o mais conhecido personagem de Moebius. É ele o protagonista da antológica "Garagem Hermética" (também reeditada pela Nemo). A clássica HQ foi publicada na década de 1970, originalmente em episódios, na publicação francesa de quadrinhos Métal Hurlant – que influenciaria mais tarde a similar norte-americana, Heavy Metal, entre muitas outras.

Considerada pelo autor "um melodrama profético, cósmico", a saga de Gruber, cheia de seres e situações inusitadas, está entre as criações mais anárquicas do mundo dos quadrinhos. Sem concessões, Moebius mistura em seu balaio mundos diferentes e exóticos.

“Garagem Hermética não é uma obra fechada”, assinala Moebius em texto publicado na introdução da edição brasileira, lançada por aqui em 2012. “Abundam nela aberturas e correspondências”, completa o artista. “O Homem do Ciguri” segue a mesma rota fortuita e mantem o estilo episódico. “É uma história quimérica, totalmente improvisada”, avisa Moebius, no meio da trama.

De fato, estão lá a mesma atmosfera onírica e a tinta surrealista. Produzida décadas depois, em 1996, é entrelaçada por referências à obra dos anos 70, e está repleta de elementos de metalinguagem. Logo no início da nova aventura, Grubert encontra um livro com imagens de "Garagem Hermética" e mais uma vez o próprio Moebius vai parar dentro da HQ. Ele aparece desenhando em sua mesa. À sua volta, paredes forradas por cenas das antigas aventuras de um confuso Gruber, que o procura agora em busca de explicações.

Como um menino peralta que se diverte com as próprias traquinagens, o autor brinca com a linguagem e não economiza nas referências. Há menções, por exemplo, à magia, às cartas do tarô e ao escritor Carlos Castañeda, autor do clássico “A Erva do Diabo”, que popularizou os alucinógenos na década de 1960. Sabe-se, aliás, que muitas das HQs de Moebius foram influenciadas pelas experiências com psicodélicos, como o peiote. Batman e Bruce Lee também aparecem. 


Serviço
Título: O Homem do Ciguri
Autor: Moebius
Editora: Editora Nemo (Coleção Moebius)
Págs.: 56 págs.
Preço: R$ 49,00