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Revista literária "Granta" expande edições no exterior; inglesa terá número sobre brasileiros

Capa da edição nacional da revista "Granta" - Reprodução
Capa da edição nacional da revista "Granta" Imagem: Reprodução

Larry Rohter

The New York Times

16/09/2012 07h00

Quando o primeiro número de sua nova edição em língua chinesa for lançado no mês que vem, a revista literária londrina “Granta”, uma publicação que existe desde a era vitoriana, estará presente em quatro das cinco línguas mais faladas do mundo. Mas os planos para a globalização de um importante título trimestral, que chama a si mesma orgulhosamente de “a revista da nova escrita”, não param aí.

“Em cinco anos eu posso nos ver com 15 ou 17 edições estrangeiras”, disse John Freeman, editor da “Granta”, em uma entrevista há pouco tempo em Nova York. “Em vez de ficarmos batendo a cabeça contra a parede tentando encontrar aquele único estudante de criação literária em uma universidade que vai assinar, eu quero encontrar as pessoas que realmente querem e realmente precisam da revista, onde quer que estejam, e isso significa olhar para o mundo.”

Além de inglês e agora chinês, a “Granta” também é publicada em espanhol, português, italiano, búlgaro, sueco e norueguês. As edições em língua estrangeira não contam apenas com versões traduzidas dos artigos originalmente publicados na “Granta” em inglês, mas muitas das edições também contam com conteúdo original de escritores locais, alguns dos quais publicados nos últimos anos na revista em inglês (O árabe é a única língua das cinco mais faladas que não tem sua própria edição.)

Independente da língua em que a “Granta” é publicada, cada edição é organizada em torno de um único tema, geralmente um lugar (Reino Unido, Chicago, Rússia, Austrália) ou um tema (trabalho, sexo, medicina, pais). Mas o tema escolhido é tratado por meio de vários gêneros de ficção e não ficção, fornecidos por escritores célebres e desconhecidos, que também formam uma parte significativa dos leitores da revista.

A “Granta” foi fundada em 1889 como uma revista literária na Universidade de Cambridge, seu nome incomum tirado de um rio que passa pela cidade. Como uma publicação estudantil, ela fornecia um veículo inicial para escritores britânicos que ganhariam proeminência no século 20, incluindo A.A. Milne, E.M. Forster, Ted Hughes, Michael Frayn, Cecil Beaton e Stevie Smith.

Mas em sua encarnação moderna, a “Granta” data de 1979, quando, após um período de crescentes dificuldades financeiras, a revista se reformulou e começou a se concentrar em escritores e leitores além da comunidade de Cambridge. Quatro anos depois, ela publicou sua primeira lista dos “20 Melhores Jovens Escritores Britânicos”, agora uma tradição decenal que deu visibilidade internacional à “Granta” e se tornou parte da identidade da revista.

A lista inicial incluiu muitos dos escritores que atualmente dominam as letras britânicas, entre eles Martin Amis, Julian Barnes, William Boyd, Kazuo Ishiguro, Ian McEwan, Salman Rushdie e Graham Swift; uma nova lista de escritores com menos de 40 anos deverá ser publicada no ano que vem. Em 1996, a “Granta” publicou a primeira das atuais duas listas de “Melhores Jovens Escritores Americanos”. As listas deram empurrões iniciais às carreiras de Madison Smartt Bell, Jeffrey Eugenides, Jonathan Safran Foer, Jonathan Franzen, Nicole Krauss, Lorrie Moore, Gary Shteyngart e outros.

Versão em inglês terá edição sobre brasileiros
Reconhecendo a utilidade literária e de marketing desse artifício, as edições internacionais da “Granta” seguiram o exemplo: a lista “Os Melhores Jovens Escritores de Língua Espanhola” foi publicada em espanhol em 2010 e em inglês no ano passado, e em julho a edição em português publicou “Os Melhores Jovens Escritores Brasileiros” – são eles: Cristhiano Aguiar, Javier Arancibia, Vanessa Barbara, Carol Bensimon, Miguel Del Castillo, João Paulo Cuenca, Laura Erber, Emilio Fraia, Julián Fuks, Daniel Galera, Luisa Geisler, Vinicius Jatobá, Michel Laub, Ricardo Lísias, Chico Mattoso, Antônio Prata, Carola Saavedra, Tatiana Salem Levy, Leandro Sarmatz e Antônio Xerxenesky.

A edição em inglês da “Granta” planeja dedicar um número à lista brasileira no ano que vem, assim como a edição chinesa, logo após sua estreia, cujo tema é o Reino Unido.

Para mim, o aspecto mais interessante da globalização da ‘Granta’ é o de criar um fórum para intercâmbio de grande literatura que não se limita ao fluxo de literatura de língua inglesa da ‘Granta’ britânica para cada um dos outros países, mas que se move em todas as direções.

Roberto Feith, diretor editorial da edição brasileira

“A Granta é famosa por esses projetos e acreditamos que essas listas viajam bem, e são como um guia para os leitores chineses curiosos”, disse Peng Lun, o editor da edição chinesa da “Granta”, em uma entrevista por telefone de Xangai. “Não são muitos os leitores de literatura estrangeira aqui, e o povo chinês em grande parte desconhece até mesmo escritores como Salinger e Updike. Mas eu acho que há um público crescente formado por pessoas jovens e educadas, pessoas com formação universitária, que querem conhecer essas novas vozes.”

Apesar da “Granta” ser uma venerável instituição britânica, ela é dirigida atualmente por pessoas cujas origens não são. Freeman, que se juntou à revista em 2008, é um americano; sua vice, Ellah Allfrey, nasceu no Zimbábue e estudou parcialmente nos Estados Unidos antes de se tornar editora da Jonathan Cape, uma editora britânica; e a publisher e benfeitora chefe da revista, Sigrid Rausing, é uma herdeira e filantropa sueca.

Mas estabelecer cabeças de ponte internacionais para literatura em inglês nem sempre foi fácil. O primeiro empreendimento em língua estrangeira da “Granta” foi em espanhol, há quase uma década, e livreiros e críticos inicialmente não sabiam o que achar de uma revista publicada em formato de livro, com conteúdo que parecia resistir a classificação.

“A Espanha tinha muitas revistas literárias importantes, mas nenhuma que misturasse contos, reportagens e outras formas de não ficção e novo jornalismo de uma forma original”, explicou Aurelio Major, o coeditor da “Granta en Español”. “E, é claro, em mais de uma ocasião o público de esquerda confundiu a ‘Granta’ com o ‘Granma’”, o jornal do Partido Comunista Cubano que serve como porta-voz de Fidel Castro.

Freeman disse que os editores da “Granta” passaram a pensar nas edições em língua estrangeira “não como franquias, mas sim como batedores” atrás de talento literário por todo o mundo. Essa abordagem também funcionou a favor da divisão de publicação de livros da revista, chamada Granta Books, que tem um histórico de contratar escritores cultivados pela revista e então guiá-los para projetos maiores, mais ambiciosos. Exemplos recentes dessa polinização cruzada incluem o romance de 2011 de Justin Torres, “We the Animals”, e o futuro “Happiness, Like Water”, de Chinelo Okparanta, que Allfrey está editando.

“É como dispor de uma biblioteca da melhor escrita para escolher”, ela disse. Em inglês, a edição mais bem-sucedida comercialmente da “Granta” foi uma de 2010 dedicada ao Paquistão, com mais de 50 mil exemplares vendidos. Mas as vendas de livros também cresceram, colocando a “Granta” em uma posição econômica mais forte do que antes do início da Grande Recessão em 2008.

Conheça a Granta

A Granta foi fundada em 1889 por estudantes da prestigiada Universidade de Cambridge. Nos anos 1970, a revista enfrentou probelmas financeiros e foi resgatada por um grupo de jovens estudantes de pós-graduação, que a tornaram uma publicação focada em novos autores. Desde 1979, alguns dos mais importantes autores emergentes tiveram textos publicados na revista, entre os quais Milan Kundera, Doris Lessing, Ian McEwan, Gabriel Garcia Marquez, Jayne Anne Phillips e Salman Rushdie. A revista é publicada, em geral, a cada trimestre, mas não tem periodicidade fixa.

“Nós somos sustentados por Sigrid, e isso é essencial para a existência da revista”, disse Freeman. Mas a quantia que Rausing gastou para sustentar a revista “caiu pela metade nos últimos três anos”, ele prosseguiu, graças em grande parte ao aumento do número de assinantes nos Estados Unidos e mais propagandas. “Financeiramente, a revista está se saindo melhor do que antes”, ele acrescentou.

À medida que a “Granta” expande, as várias edições estrangeiras fazem recomendações umas às outras diretamente, às vezes até mesmo contornando Londres. Foi instituída uma troca semanal de e-mails entre as sete edições e, em abril passado, durante a feira de livros de Londres, Freeman reuniu seus colegas estrangeiros para um jantar na casa de Rausing.

“Para mim, o aspecto mais interessante da globalização da ‘Granta’ é o de criar um fórum para intercâmbio de grande literatura que não se limita ao fluxo de literatura de língua inglesa da ‘Granta’ britânica para cada um dos outros países, mas que se move em todas as direções”, disse Roberto Feith, diretor editorial da edição brasileira da “Granta” e que esteve presente no encontro em abril. “Ainda resta ver para onde esse processo nos levará, mas será uma viagem interessante.”

Tradutor: George El Khouri Andolfato