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Criador dos Freak Brothers, Gilbert Shelton aconselha quadrinistas: "Arrumem um emprego"

Gilbert Shelton participa de painel na Flip com Robert Crumb (7/8/2010) - Letícia Moreira/Folhapress
Gilbert Shelton participa de painel na Flip com Robert Crumb (7/8/2010) Imagem: Letícia Moreira/Folhapress

Estefani Medeiros

Do UOL, em São Paulo

22/05/2012 07h07

A turnê dos roqueiros falidos da banda fictícia Not Quite Dead chega ao Brasil neste mês de maio em lançamento da editora Conrad. Batizado de "O Último Show", a criação é do autor americano Gilbert Shelton em parceria com o ilustrador francês Pic.

Assim como a banda, Shelton – mais conhecido como o criador da tira “The Fabulous Freak Brothers”, já se aventurou pela música. Além de ter participado da cena junkie e ativa de São Francisco na década de 60, o autor foi amigo próximo da cantora Janis Joplin e confessa que até já pensou em ser rockstar.

Aos 72 anos, Shelton é convidado especial da convenção Comic-Con, que ocorre em San Diego entre os dias 12 e 15 de julho, onde poderá ser premiado com um Eisner Lifetime Achievement Award, prêmio sobre o conjunto de sua obra. Sobre a homenagem, o autor se diz lisonjeado, mas rebate dizendo que prefere conseguir ter seus livros e quadrinhos publicados.

E é com a mesma modéstia que Shelton relembra a participação na FLIP com Robert Crumb, em 2010. "Como não era muito conhecido, podia andar e conhecer a cidade" e aconselha os novos quadrinistas: "Arrumem um emprego". Leia a entrevista completa:

Trecho do quadrinho "O Último Show em Shnagrlic" 

UOL - Se não tivesse sucesso com os quadrinhos, teria tentado seguir a carreira de rockstar, como o Not Quite Dead?
Gilbert Shelton -
(Risos) Uma vez eu pensei que poderia ser. Aí eu vi que nunca conseguiria fazer quadrinhos e música ao mesmo tempo. Seria muito trabalho. Então eu decidi continuar com os quadrinhos, que me davam mais dinheiro. Mas ainda toco piano.

Na tradução para português, o título na capa é “O Último Show”. Este pode ser considerado o último show do Not Quite Dead?
Não, planejo continuá-lo. É que existe um duplo significado no título e as traduções são diferentes em francês, inglês ou português. Em inglês ele tem uma rima: “The Last Gig in Shnagrlic”, a inspiração foi “O Último Tango em Paris” (“The Last Tango in Paris”, no título original em inglês). Mas para mim parece um bom título em português. Fico feliz que o nome da cidade não apareça na capa no Brasil, porque ninguém compraria um livro que não consegue ler o título (risos).

O roteiro do livro se assemelha à notícia da entrada das tropas americanas no Afeganistão. Essa foi realmente sua inspiração para criar a história?
Sim, tem a ver com o imperialismo americano e suas invasões em diversos países. Mas a ideia de mandar os personagens para essa cidade é algo relacionado a uma expedição cultural, o que nós achamos que seria uma ideia engraçada.

O lançamento desta edição nos Estados Unidos é de 2010. O que você vem fazendo desde então?
Estou fazendo as mesmas velhas coisas. Escrevi novas histórias de Wonder Wart-Hog. Acredito que este personagem nunca tenha sido publicado em português. Estou trabalhando em uma história do Freak Brothers para a “Zap”. E principalmente uma nova história do Not Quite Dead junto com Pic. Tudo ao mesmo tempo, mas bem devagar. Não tenho planos de lançar nenhum livro, estou escrevendo histórias soltas quando me pedem.

Você veio ao Brasil em 2010, com Robert Crumb, para participar da Flip. O que ficou marcado dessa viagem?
Foi muito divertido (risos). Fiquei feliz de saber como Robert Crumb era a estrela do festival, mesmo com a presença de outros autores famosos. Ele dava autógrafos todos os dias. O engraçado é que ele e eu somos amigos e assinamos livros juntos. Mas, pobre Crumb, justo ele que não gosta de multidões, não podia sair do hotel por que tinha vários paparazzi o esperando. Ele ficou preso no hotel por mais dois ou três dias. Como eu não era muito conhecido podia sair pela rua e conhecer a cidade sem ser incomodado.

Você é um dos convidados especiais da Comic-Con 2012. Como vai participar?
Suponho que seja para receber o Eisner Lifetime Achievement Award [prêmio pelo conjunto da obra].

Como você se sente recebendo esse tipo de prêmio?
Bem, eu sempre fico muito lisonjeado. Mas, não sei. Para mim, conseguir ter livros publicados é mais importante do que ganhar prêmios.

O que eu diria para os novos quadrinistas é: arrume um emprego (risos). É brincadeira, mas verdade. Arrume um emprego de dia e escreva quadrinhos à noite. Porque é quase impossível conseguir viver fazendo quadrinhos

Gilbert Shelton, autor de HQ

Uma das curiosas histórias que ouvimos sobre a sua juventude é que você era amigo da Janis Joplin. O que você lembra dessa época?
Nós éramos da mesma sala na Universidade do Texas. Ouvíamos folk juntos e era o que ela mais gostava de tocar. Nós nos juntávamos toda semana para tocar e cantar músicas folk. Então sugeri que ela seria uma boa cantora de blues e rock. Mas ela disse: “Não, nós só estamos aqui pelo folk”. Alguns anos depois ela mudou de ideia, mas era tarde demais pra mim.

Músicas são sempre referências nos textos dos seus quadrinhos. O que você ouve hoje em dia?
Eu geralmente ouço rádios de jazz. Atualmente estou ouvindo muito músicas dos anos 50, bebop, blues, rock e pop dessa época porque lembro todas as letras dessas músicas. Nos anos 60 ficamos loucos por bossa nova. Sempre fui fã de bossa nova. Mas ouvimos tanto nos Estados Unidos por anos e anos que ficamos saturados.

O que você diria para os novos escritores de quadrinhos?
O que eu diria para os novos quadrinistas é: arrume um emprego (risos). É brincadeira, mas verdade. Arrume um emprego de dia e escreva quadrinhos à noite. Porque é quase impossível conseguir viver fazendo quadrinhos até se criar uma reputação. Até Crumb precisou ter uma vida fora dos quadrinhos.
 

Mais sobre o livro

Sem saber que está entrando em uma enrascada, a banda Not Quite Dead é convidada para o seu primeiro show fora dos Estados Unidos, uma turnê na cidade muçulmana de Shnagrlic.

O que a banda não sabe é que seu show foi acertado como uma estratégia do exército americano para causar uma desordem civil no país e fazer com que o país roube o petróleo do povo.

"O Último Show em Shnagrlic"
Editora Conrad
Preço sugerido: R$29,90
48 páginas