Ao som de música clássica, John Malkovich faz plateia rir de história real sobre assassino cruel
Com ingressos esgotados, cerca de duas mil pessoas assistiram à estreia do monólogo "The Infernal Comedy - Confissões de um serial killer", com o ator americano John Malkovich, 57, nesta noite de quarta-feira (2), no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Como muitas estrelas de Hollywood, Malkovich começou, há 35 anos, sua carreira de ator no teatro, no Chicago Steppenwolf Theatre. Mas a consagração veio do cinema, no papel do sedutor Visconde de Valmont em "Ligações perigosas" (1988) e, depois, como o assassino de "Linha de fogo" (1993), além, é claro, como ele mesmo em "Quero Ser John Malkovich" (1999). Devido a esses sucessos, John tem atraído cinéfilos que querem vê-lo ao vivo, em uma peça de teatro experimental. No Rio, também atraiu um séquito de atrizes, como Fernanda Montenegro, Giulia Gam, Maitê Proença, Malu Mader e Patrícia Pillar.
“The Infernal Comedy” começa como um concerto de música clássica: os músicos da orquestra barroca a postos no palco aguardam a entrada do maestro Martin Haselböck e executam "L´enfer", trecho do "Don Juan" de Gluck, a primeira das obras clássicas que servirão de trilha para a peça. Malkovich surge logo em seguida, na pele no assassino Jack Unterweger, de terno e sapatos brancos e blusa preta de bolinhas. Em tom jocoso, dirige-se à plateia e explica que a sessão de autógrafos de sua biografia vai começar - em inglês, com legendas eletrônicas em português exibidas em um telão acima do palco. O ator compara o sotaque de seu personagem, que tem origem austríaca, com o do ex-governador de Los Angeles, Arnold Schwarzenegger, e, durante o espetáculo, improvisa algumas palavras em português: "João", "bunda" e "obrigado".
Sentado em uma mesa verde colocada à frente da orquestra, Malkovich lê trechos do que seria o relato definitivo sobre a vida de Jack: as verdades sobre o mentiroso austríaco, condenado à prisão perpétua pelo assassinato de uma mulher em 1976, que, por tornar-se um escritor de sucesso enquanto estava preso, recebeu indulto. Fora das grades, circulou por rodas de intelectuais da sociedade na Áustria até cometer novos crimes. Na busca da verdade, nem o próprio matador sabe precisar quantos crimes cometeu. Faz uma consulta à Wikipedia e coloca em dúvida o que está escrito sobre ele na enciclopédia online.
O monólogo é então alternado por árias de Vivaldi, Haydn, Weber e Mozart cantadas pelas sopranos Marie Arnet e Kirsten Blaise (que dividirá as apresentações no Brasil com Sophie Klussman), que pontuam os assassinatos cometidos por Jack e a relação dele com as mulheres. A música ilustra e cria tensão enquanto Jack estrangula suas vítimas - as cantoras - com sutiãs. Em determinado momento, o ator interrompe a orquestra: "Normalmente, não gosto deste tipo de música. Me deixa nervoso", e arranca risadas da plateia.
Em outra passagem, quando o personagem diz que a primeira coisa que aprendeu na vida - sorrir - foi uma mentira, a interpretação de Malkovich traz à tona a frieza do criminoso que encantava as mulheres antes de matá-las. Com seu cinismo, Jack foi capaz de ser celebrado por intelectuais que acreditaram em sua redenção. Na vida real, foi preso em 1992, condenado por onze homicídios, mas suicidou-se antes de cumprir a pena. Com um toque de charme do ator, a cena final - e a crueldade da história, como um todo - ganha um tom mais leve, de comédia.
No Brasil, a turnê de "The Infernal Comedy - Confissões de um serial killer" segue agora para Salvador, com uma apresentação no dia 3, no Teatro Castro Alves, e depois para três apresentações em São Paulo, nos dias 4, 5 e 6, no Teatro Municipal. Mas outra parceria de Malkovich com o maestro Haselböck e o diretor Sturminger deve se repetir em breve em palcos brasileiros, já que o ator ensaia o papel de Giacomo Casanova em "The Giacomo Variations", com previsão de turnê em 2012.
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