Por que "Roma" foi o vencedor incontestável do Festival de Veneza?
Alfonso Cuarón apresentou o melhor filme da 75ª edição do Festival de Veneza, algo que foi reconhecido pela crítica e pelo público desde sua primeira projeção e que foi reafirmado neste sábado pelo júri, que lhe concedeu, por unanimidade, o Leão de Ouro.
Cuarón era o grande favorito e nem o fato de que seu amigo Guillermo del Toro fosse o presidente do júri lançou dúvidas sobre a incontestável vitória de seu filme mais pessoal, no qual narra em um neorealista preto e banco sua infância na Cidade do México.
A delicadeza com a qual Cuarón mostra suas lembranças convenceu totalmente o júri, no qual também estavam Naomi Watts, Trine Dyrholm e Christoph Waltz.
Um Leão de Ouro decidido por "absoluta unanimidade" dos nove membros do júri - "9 a 0", ressaltou Del Toro - e que foi muito aplaudido na sala de imprensa.
"É preciso entender o passado para não repetir os mesmos erros no futuro", disse Del Toro, para quem "o filme de Alfonso fala de múltiplas dimensões da existência". "É um fresco e ao mesmo tempo um íntimo retrato (...) Convém refletir para poder entender o presente do México em que estamos", acrescentou, sobre um filme produzido pela Netflix e que por essa razão não foi apresentado no Festival de Cannes.
Del Toro foi o encarregado de anunciar o prêmio a seu amigo. "Vamos ver se sei pronunciar corretamente o nome", brincou - com o qual se fundiu em um abraço, um momento destacado por Cuarón na entrevista coletiva posterior.
"É muito significativo estar aqui em Veneza. Ainda mais significativo e surreal recebê-lo (o Leão de Ouro) de Guillermo del Toro", destacou Cuarón.
Com o prêmio em mãos, o diretor mexicano se referiu à importância que o cinema dê voz aos mais frágeis e reconheceu que sua história é de uma "complexidade" um pouco perversa, sobre as relações entre classes. Isso porque "Roma" conta a infância do diretor na Cidade do México e a relação que sua família tinha com as mulheres que cuidavam deles, duas indígenas interpretadas por Yalitza Aparicio e Nancy García.
"Eu não as via como mulheres e sua complexidade, nem como indígenas", declarou Cuarón sobre um filme que "fala de certa invisibilidade de grandes setores das sociedades no mundo".
O segundo prêmio em importância da noite, o Grande Prêmio do Júri - Leão de Prata - foi para "The Favourite", um filme no qual Yorgos Lanthimos dá uma reviravolta no cinema de época e que conta com uma grande interpretação da britânica Olivia Colman, que levou com justiça a Copa Volpi de melhor atriz.
Ela era a grande favorita por seu papel da rainha Ana na Inglaterra do século XVIII, como também era Willem Dafoe, que garantiu a Copa Volpi masculina por sua interpretação de Van Gogh nos últimos meses de sua vida, narrados por Julian Schnabel em "At Eternity's Gate".
Menos esperado foi o Leão de Prata de melhor diretor para o francês Jacques Audiard em seu primeiro projeto em inglês, "The Sisters Brothers", um western em tom de comédia que era o favorito do público. Outro dos filmes que se esperava que estivesse na lista era "The Nightingale", o único na competição dirigido por uma mulher, Jennifer Kent. E conseguiu entrar duas vezes.
O filme, ambientado na Tasmânia do século 19 e que conta uma história de abusos de mulheres e de aborígenes, mas também de vingança, levou o Prêmio Especial do Júri. Além disso, Baykali Ganambarr ganhou o Prêmio Marcello Mastroianni de melhor intérprete emergente por seu papel no filme de Kent e aproveitou seu discurso para defender as culturas aborígenes.
A lista de vencedores foi completada com o prêmio mais contestado e inesperado da noite, o de melhor roteiro para os irmãos Ethan e Joel Coen, por "The Ballad of Buster Scruggs", um conjunto de seis irregulares histórias de western que vão da comédia absurda ao drama.
A maioria dos prêmios foi decidida por unanimidade - "alguns por maioria e nenhum protestado" - e que são o resultado "do diálogo entre 21 filmes e nove seres humanos", detalhou Del Toro.
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