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Polônia aprova lei do Holocausto, apesar das críticas de Israel e EUA

01/02/2018 17h57

Berlim, 1 fev (EFE).- O governo da Polônia defendeu nesta quinta-feira o projeto de lei aprovado no Senado que transforma em ilegal afirmar que os poloneses foram cúmplices no Holocausto e pune com até três anos de prisão o uso da expressão "campos de extermínio poloneses", apesar das críticas de Israel e das advertências dos Estados Unidos.

A lei se une a outros projetos do partido conservador e nacionalista Lei e Justiça (PiS, na sigla em polonês), que governa com maioria absoluta, que causaram apreensão dentro e fora da Polônia, como as sucessivas reformas do sistema judicial que resultaram na abertura de um procedimento por parte da Comissão Europeia por violações do Estado de direito.

"Foram os alemães que atacaram a Polônia, enquanto os poloneses e os judeus foram as vítimas", insistiu hoje a porta-voz do governo polonês, Joanna Kopcinska.

A nova lei aprovada ontem à noite "não inibe a liberdade de expressão e investigação", indicou o Ministério das Relações Exteriores polonês em um comunicado, mas trata apenas de "combater todas as formas de negação e distorção da verdade do Holocausto e de minimizar a responsabilidade dos verdadeiros autores".

"Acusar a nação polonesa, ou o Estado polonês, de cumplicidade com o III Reich alemão nos crimes do nazismo é errado e doloroso para as vítimas que são cidadãs polonesas", acrescentou o ministério no texto.

A Chancelaria polonesa reconhece que existem "diferenças" com outros países por causa do projeto de lei, mas se diz convencida de que a reforma "não afetará a associação estratégica da Polônia com os Estados Unidos".

Pouco antes, os EUA expressaram, através de um comunicado do Departamento de Estado, seus temores de que a reforma poderia afetar a liberdade de expressão e a pesquisa acadêmica, bem como as relações "estratégicas" da Polônia com Estados Unidos e Israel.

"Encorajamos a Polônia a reavaliar esta legislação devido a seu potencial impacto no princípio da liberdade de expressão e na nossa habilidade de sermos sócios efetivos", indicou o departamento americano.

Em nome do governo israelense, o porta-voz de Relações Exteriores, Emanuel Nahshon, condenou a reforma polonesa, ao considerar que "desafiar a verdade histórica" é de "extrema gravidade" e nenhuma lei "mudará os fatos".

Por sua vez, o Knesset (parlamento israelense) estuda reagir com uma lei que tipifique como delito as tentativas de "negar ou minimizar o envolvimento de cúmplices e colaboradores dos nazistas", segundo o jornal "Jerusalem Post"

Em Jerusalém, o Yad Vashem, o museu que lembra as vítimas judias do Holocausto, admitiu que a expressão "campos de concentração poloneses" é equivocada, pois as instalações foram construídas e operadas pelos alemães em território polonês ocupado durante a Segunda Guerra.

No entanto, os responsáveis pelo museu opinaram que "a maneira correta de combater as tergiversações históricas não é criminalizando as declarações, mas reforçando as ações educativas".

A instituição advertiu que a lei pode "obscurecer verdades históricas pelos limites que impõe em expressões sobre a cumplicidade de segmentos de população polonesa em crimes contra os judeus cometidos em solo polonês por seu próprio povo, direta ou indiretamente, durante o Holocausto".

Durante a Segunda Guerra Mundial, poloneses como os integrantes da família Ulma - mãe, pai e seis crianças - foram assassinados pelos nazistas por terem escondido judeus em seu lar.

Mas também houve cidadãos do país, segundo o historiador polonês-americano Jan Gross, que contribuíram, inclusive ativamente, para o genocídio judeu durante a ocupação nazista.

Gross relata em seu livro "Neighbors: The Destruction of the Jewish Community in Jedwabne, Poland" ("Vizinhos: A Destruição da Comunidade Judaica em Jedwabne, Polônia", em tradução livre) como os moradores de uma cidade assassinaram cerca de 1.600 judeus, entre eles mulheres e crianças, diante da passividade dos ocupantes nazistas.

O presidente do Conselho Europeu, o polonês Donald Tusk, lamentou no Twitter que, devido à polêmica em torno do projeto de lei, Varsóvia tenha se transformado no principal difusor em nível mundial da expressão "campos de extermínio poloneses".

O projeto de lei foi aprovado na sexta-feira da semana passada pela Câmara dos Deputados da Polônia e ontem à noite pelo Senado, depois que o premiê polonês e o chefe de governo israelense, Benjamin Netanyahu, concordaram em abrir um diálogo bilateral para buscar acordos durante uma ligação telefônica no domingo.

Para que a lei entre em vigor, só falta a assinatura do presidente polonês, Andrzej Duda, quem se comprometeu a revisá-la em detalhe antes de ratificá-la.