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Bollywood ajuda a aproximar Índia e velha "rival" China

01/06/2017 10h26

Antonio Broto.

Pequim, 1 jun (EFE).- O inesperado sucesso de vários filmes indianos na China serviu para aproximar o público deste país de um vizinho com o qual Pequim nunca teve boas relações, unindo através da grande tela duas sociedades com mais problemas comuns do que elas mesmas acreditavam.

O último destes sucessos, "Dangal", um filme sobre um pai indiano que supera preconceitos sexistas ao transformar duas de suas filhas em campeãs de luta livre, está batendo recordes nos cinemas chineses, onde já arrecadou US$ 131 milhões.

O filme, protagonizado por Aamir Khan, grande estrela da Bollywood atual, é inspirado na história real de Geeta Phogat, uma das melhores lutadoras da Índia, e de seu pai, Mahavi Singh Phogat, que com disciplina espartana treinou ela e a irmã em um esporte que parecia vetado às mulheres.

A produção já é o filme estrangeiro com maior sucesso de bilheteira da história da China não proveniente de Hollywood, e está entre os 50 mais vistos de todos os tempos, naquele que já é o segundo maior mercado cinematográfico do mundo.

"É um marco que deve nos inspirar, mostra que os espectadores do nosso país estão buscando maior diversidade", destacou Gao Qunyao, diretor da multinacional Wanda, a maior distribuidora cinematográfica do mundo.

De acordo com o jornalista indiano estabelecido em Pequim Kjm Varma, habitual comentarista sobre as relações entre as duas potências asiáticas, este filme e outros novos do subcontinente que em anos recentes obtiveram sucesso na China fizeram os espectadores chineses compreender que não são tão diferentes da sociedade indiana.

"A relação entre o pai e as suas filhas, os esforços para se obter sucesso na vida, a motivação das meninas e a pressão que sofrem as classes médias provavelmente mostram similitudes entre as duas sociedades", comentou Varma à Agência Efe.

O filme, que também teve grande sucesso na Índia, está dando muito o quê falar na China, onde alguns o consideram um dos melhores de temática esportiva já rodado - a seleção de basquete chinesa foi obrigada a vê-lo para que lhes inspire -, mas também gerou muitos debates.

Reconhecidas feministas chinesas, por exemplo, criticaram o protagonista do filme por causa de sua dureza com suas filhas, uma polêmica que segundo Varma também foi discutida na própria Índia, indicando uma vez mais a semelhança entre os dois países.

Além disso, lembrou o crítico, o sucesso veio justamente quando China e Índia vivem um dos seus momentos mais frios nas relações políticas, devido ao temor indiano da Nova Rota da Seda, o grande projeto de expansão econômica de Pequim na Ásia e em outros continentes.

"A Índia o boicotou, devido a preocupações em torno da sua soberania (...), mas justo agora este filme mostra que a cultura pode ter um grande papel de aproximação dos dois países", opinou o comentarista indiano.

China e Índia também se enfrentam durante décadas por desacordos fronteiriços (que os levaram a uma breve guerra em 1962), ou pelo fato de o Dalai Lama, líder tibetano no exílio, residir em território indiano desde sua fuga em 1959.

Antes de "Dangal", no começo deste ano a coprodução sino-indiana "Kung Fu Ioga" - um título que por si só retrata desejos de fundir ambos os países - atingiu ainda maior sucesso de bilheteira ao arrecadar US$ 255 milhões, a quarta melhor marca histórica no mercado chinês.

Esse filme de aventuras de arqueólogas no Tibete que lembra a saga hollywoodiana de Indiana Jones, contou como protagonista com Jackie Chan, a estrela de Hong Kong das artes marciais.

Novos dois filmes indianos protagonizados por Aamir Khan, "Três Idiotas" e "P.K.", também tiveram sucesso na China em anos anteriores.

Na China se considera que este surto de popularidade do cinema indiano o devolve a um status que já chegou a ter nos anos 50, quando a estrela de Bollywood da época, Raj Kapoor, era o rei das telonas dos primeiros anos do maoísmo - muitos idosos chineses ainda recitam as canções dos seus filmes.