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Cidade natal de Adolf Hitler tenta se libertar de seu estigma

13/05/2017 06h00

Luis Lidón.

Viena, 13 mai (EFE).- Braunau am Inn é uma cidade austríaca como qualquer outra, exceto por uma casualidade histórica que ainda persegue seus moradores: é o local de nascimento de Adolf Hitler, o ditador mais sanguinário do século XX.

Enquanto Salzburgo é conhecida como a cidade natal de Mozart e isso lhe dá uma imagem positiva, a vizinha Braunau, com 16.000 habitantes, tem que carregar o peso de ser o lugar no qual o fundador do nacional-socialismo chegou ao mundo.

Hitler nasceu em abril de 1889 em um casarão de três andares no centro histórico da localidade que faz fronteira com a Alemanha.

Diante do imóvel vazio de cor amarela há um monumento com uma mensagem para as vítimas do Holocausto, mas em nenhum lugar aparece a palavra Hitler nem se indica que nasceu ali. É um tabu sobre o qual Braunau prefere não falar.

Embora a família daquele que se tornaria o líder nazista tenha passado somente três meses ali, o imóvel é conhecido como "a casa de Hitler", sobretudo para os neonazistas que em algumas ocasiões peregrinam ao local.

O governo austríaco expropriou a casa no início de 2017 e sua proprietária recorreu da decisão no Tribunal Constitucional. Desde 1972, o Estado a alugava para evitar que pudesse ser convertida em um lugar que - de alguma forma - enaltecesse Hitler.

O edifício hospedou nas últimas décadas uma escola, uma filial bancária, uma biblioteca e, até 2011, uma loja-oficina de uma organização para pessoas incapacitadas, que se mudaram porque a proprietária se negava a adaptar o edifício a suas necessidades.

O imóvel será agora reformado e há uma negociação para que abrigue a mesma organização para pessoas com necessidades especiais que já o utilizou no passado.

Desta forma se respeita as recomendações de uma comissão de especialistas que defendeu um uso social ou beneficente, e descartou demoli-la porque seria "negar a história" ou criar um museu, já que isso levaria a uma maior "associação com Hitler".

Seu uso por pessoas com necessidades especiais seria, além disso, uma reparação simbólica para um coletivo perseguido pelos nazistas.

"Isso seria uma afirmação da vida, uma homenagem às vítimas do nazismo", declarou à Agência Efe o prefeito de Braunau, Johannes Waidbacher.

"(Seria) um símbolo claro contra os crimes cometidos por Hitler", acrescentou o politico conservador em declarações por telefone.

Por sua parte, o historiador Andreas Maislinger está há quase 20 anos lutando para criar uma "casa da responsabilidade" nesse lugar, um projeto educativo para divulgar os valores de paz e direitos humanos entre jovens chegados de todo o mundo.

"Braunau é um símbolo", destacou Maislinger à Efe, e isso não vai mudar por meio da negação, mas propondo um novo marco conceitual: deixar de falar da "casa de Hitler" para falar da "casa da responsabilidade".

O historiador e cientista político lamenta que Braunau continue sob o estigma de Hitler, algo que considera "injusto" porque ali não foram cometidos ou sequer planejados os crimes do nazismo.

Em todo caso, ele considera um erro não enfrentar a situação de forma direta e que isso continue sendo um tabu.

"Durante décadas houve uma oficina para pessoas com necessidades especiais, mas isso não mudou nada e todo mundo conhecia o lugar como 'a casa de Hitler'. É preciso criar uma nova marca, uma nova definição", resumiu.

Maislinger não é o único que tem um projeto para mudar a imagem da cidade. Georg Wojak, presidente do consórcio de municípios de municípios cuja capital é Braunau, também impulsiona desde 2008 uma iniciativa para relacionar a região com a paz.

Dessa maneira, estão sendo plantadas tílias como símbolo da paz em todo o distrito e promovidas figuras regionais relacionadas com valores de concórdia, como a de Franz Xaver Gruber (1787-1863), autor da famosa canção de Natal "Noite Feliz".

Wojak reconhece que Braunau ainda sofre com o peso de sua própria história e, da mesma forma que muitos dos moradores, considera que o melhor teria sido desfazer-se da casa.

"Lamento que os americanos, quando libertaram a cidade em maio de 1945, não tenham demolido o edifício", assegurou taxativo, para completar: "A maioria das pessoas pensa como eu".

A má sorte também se conjurou contra Braunau, já que seu nome faz referência à cor marrom ("Braun") vinculada aos nazistas.

Por isso, o povo chegou a colocar cartazes com lemas como "Braunau não é marrom", para mostrar sua oposição à ultradireita. Ainda assim, a cidade continua saindo nos meios de comunicação porque neonazistas de toda Europa se sentem atraídos pela casa.

Em fevereiro deste ano, por exemplo, a polícia deteve um sósia de Hitler que passeava pela cidade e tirou algumas fotos em frente ao imóvel.