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Brasileira estreia no teatro francês com elogiosa adaptação de filme

Brasileira Christiane Jatahy prova o teatro francês “está no século XXI", diz uma das críticas - AFP PHOTO / Eric Feferberg
Brasileira Christiane Jatahy prova o teatro francês “está no século XXI", diz uma das críticas
Imagem: AFP PHOTO / Eric Feferberg

10/02/2017 10h21

Obra-prima da sétima arte, "A Regra do Jogo" (1939), de Jean Renoir, inspirou a diretora brasileira Christiane Jatahy em sua estreia no Comédie-Française, teatro no centro de Paris, onde acaba de entrar em cartaz com um espetáculo que atualiza a trama e tem sido bastante elogiada.

A protagonista é estrangeira em ambas as criações, embora a frágil exilada Cristina de Renoir aqui seja árabe, e não austríaca, nacionalidade objeto de atrações e repulsões radicais quando, às vésperas da Segunda Guerra Mundial, o cineasta tentava compartilhar sua ideia de que o mundo dançava "sobre um vulcão".

Com a direção da brasileira, o herói André Jurieux, que ama com desmedida paixão Cristina, recém-casada com o marquês Robert, não é piloto nem acabava de atravessar o Atlântico, mas um navegante que arriscou sua vida para salvar dezenas de emigrantes de morrerem afogados no Mediterrâneo.

Estas mudanças fazem parte da estratégia da diretora carioca para ilustrar as múltiplas conexões que se percebem entre a época em que Renoir gravou seu filme e a atualidade, segundo comentou em entrevista à Agência Efe.

A diretora fala não de vulcão, mas de "precipício", em sua tentativa de moldar aos dias de hoje os hábitos de aristocratas, burgueses e serviçais, os exagerados privilégios de uns e os conflitos éticos que refletem uma sociedade sem rumo, adormecida, que na sua opinião "só pode se salvar graças ao amor".

"Mas não o amor entre um homem e uma mulher, o amor... entre todos os seres humanos", ressaltou, abrindo seus braços como para abranger o planeta inteiro, sentada em um dos salões da companhia teatral mais antiga da Europa.

A exemplo do filme de Renoir, que teve como pilares de sua "fantasia dramática" autores como Beaumarchais, Marivaux e Musset, na peça-filme de Christiane os serviçais e amos compartilham protagonismo e a profundidade de campo, de modo que as cenas do primeiro plano são tão importantes como as do segundo ou do terceiro.

Além de unir cinema, arte audiovisual e cênica, de romper limites entre realidade e ficção, entre ator e personagem, interagir com o espectador é outro elemento do trabalho da também dramaturga, que estudou teatro, jornalismo e filosofia no Brasil, e fundou a companhia Vértice.

Convencida de que o muro que separa público e artistas pode cair, a artista quer inovar na Sala Richelieu, palco principal do histórico teatro.

Experimental, mas não hermético

No Brasil, Christiane começou a expor em 2002 sua ideia de que a criação experimental não precisa ser hermética, com obras como "A Falta que nos move" e "Corte Seco".

Em Paris, faz sucesso desde 2012, quando mostrou "Julia", inspirada em "Senhorita Júlia", de August Strindberg, no centro cultural Le 104.

Lá estreou depois "E se elas fossem para Moscou?", a partir da obra "As três irmãs", de Anton Tchekhov; e em 2016, sua não menos livre e celebrada adaptação de "A Floresta que anda", inspirada no texto do "Macbeth," de Skakespeare.

A primeira representação de "A Regra do Jogo" aconteceu no último sábado, e nas redes sociais já se elogia a incrível excelência de seus atores e o talento de Christiane, com quem o Comédie-Française "prova que está no teatro do século XXI".

É um "espetáculo inesquecível e memorável", opinou o blogueiro Frédéric Perez em sua crítica, uma das primeiras publicadas na web, retuitada pelo histórico teatro à espera de que os grandes veículos de imprensa nacionais se pronunciem.