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Grafiteiro consagrado teve obra apagada em SP: "Artistas foram massacrados"

O artista Binho Ribeiro, um dos grafiteiros mais expressivos da Zona Norte de São Paulo Imagem: Raquel Cunha/Folhapress

Alba Santandreu

Da EFE, em São Paulo

25/01/2017 14h55

Capital brasileira do grafite, São Paulo declarou uma guerra às pichações ao começar a pintar os muros de várias ruas, ganhando agora o apelido de "cidade cinza".

O novo prefeito de São Paulo, o empresário João Doria, empreendeu uma cruzada particular contra a pichação, um tipo de grafite típico da capital paulista. No centro da cidade, os arranha-céus se amontoam, escurecidos pela poluição, a passagem do tempo e os traços de cores negros feitos pelos pichadores.

Os artistas de rua diferenciam a pichação do grafite. No primeiro caso, as letras são irregulares, com linhas retas e a maior parte das vezes negras, inspiradas originalmente nas capas dos discos de bandas de rock. No segundo caso, há um cuidado maior com a caligrafia, as cores e a harmonia da obra.

O "picho", explica o ativista Cripta Djan, é um movimento social e um grito de liberdade dos jovens da periferia que querem "sair da invisibilidade social" e conseguir "reconhecimento". "O picho acaba reivindicando o espaço. Reivindica um direito que é dele. A propriedade privada acaba dominando cada vez mais e (o picho) é a melhor resposta para a segregação do espaço", disse Djan, um dos pioneiros na modalidade mais arriscada da pichação, a escala.

A presença desse tipo de intervenção não é recente. Nos anos 1980, quando o Brasil caminhava de volta à democracia, os políticos locais já utilizaram essa forma de expressão para realizar campanha eleitoral nas ruas de São Paulo, cidade que completa hoje 463 anos.

João Doria pintou uma parede na avenida 23 de Maio Imagem: Reprodução/Facebook

Arte vs. "agressão"

Doria afirmou recentemente em entrevista ao jornal "Estado de S.Paulo" que os pichadores não são artistas, mas sim "agressores". Casado com uma artista plástica, o prefeito disse que aprecia a arte urbana, mas que não defende que a cidade inteira esteja pichada. Além disso, o prefeito estabeleceu diferenças entre pichadores, muralistas e grafiteiros, apesar de essas nuances, na prática, não terem sido delimitadas.

A Prefeitura de São Paulo mandou pintar de cinza a Avenida 23 de maio, onde, até a semana passada, estava o maior mural ao ar livre da América Latina, com quase 5,5 km de extensão.

Os grafites, explicou a Prefeitura, estavam mal conservados e pichados. Agora, Doria pretende designar áreas específicas para que os grafiteiros possam criar um museu externo ao estilo do Wynwood Arts District, em Miami.

E como ficam os artistas?

Uma das obras eliminadas foi a do grafiteiro Binho Ribeiro, um dos nomes mais consagrados da arte urbana no Brasil e que tem trabalhos expostos em 40 países, entre eles os Estados Unidos.

Para Binho, a iniciativa de Dória é autoritária e mostra a falta de diálogo do poder público com os artistas. "O diálogo deveria ter ocorrido antes. Foi uma agressão violenta. Os artistas estão ofendidos, foram massacrados", afirmou.

A decisão de Doria criou um movimento de resistência. Vários artistas saíram às ruas com esfregão na mão para tirar a pintura acinzentada que cobriu suas obras.

Guilherme Andrade, mais conhecido como Humanos, desfez nesta quarta-feira o trabalho da Prefeitura e deixou uma mensagem para Doria nos muros: "Senhor prefeito, grafite não é remédio contra a pichação", escreveu.

"Doria está tratando os pichadores como dependentes químicos que quer reabilitar, transformando-os em artistas. Isso é uma ilusão. É irreal. Pichação é uma coisa, e grafite é outra, embora sejam da mesma cultura de rua. Um é a evolução do outro, mas ninguém é melhor que ninguém", disse Humanus.

No meio da polêmica, surgiu na internet uma iniciativa que busca proteger os grafites. Os cidadãos devem fazer uma foto de sua obra favorita e inclui-la em um mapa virtual, que posteriormente será entregue ao prefeito.

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