Topo

Burquíni: rejeitado no Ocidente e transgressor no Oriente

03/09/2016 06h01

Mohammed Siali.

Cairo, 3 set (EFE).- O burquíni, o traje que cobre boa parte do corpo e é usado geralmente pelas muçulmanas para mergulhar no mar ou na piscina, é desde a sua criação alvo de críticas tanto em países ocidentais quanto no mundo islâmico.

A recente polêmica que explodiu na França depois que a cidade de Villeneuve-Loubet proibiu a peça nas praias, por considerá-la entre outros aspectos "um símbolo islâmico prejudicial à neutralidade dos espaços públicos", contrasta com a opinião de muitos clérigos do islã, que proíbem o burquíni por considerar que ele transgrede os princípios religiosos.

Apesar de o Conselho de Estado da França ter anulado o decreto emitido pela prefeitura, por considerá-lo "uma afronta grave e manifestação ilegal contra as liberdades fundamentais", a polêmica não acabou.

Se de um lado o problema é cobrir demais, do outro lado do Mediterrâneo são muitos os fiéis muçulmanos e especialistas em religião que consideram que o burquíni transgrede as normas islâmicas.

A professora de jurisprudência comparada da Universidade de Al-Azhar, no Cairo (Egito), Fathia Hanafi, disse à Agência Efe que o islã proíbe que as mulheres se vistam com "roupa provocantes, justas e transparente ou com qualquer peça que mostre os detalhes de seu corpo", como ocorre quando o burquíni está molhado.

Para ela, a polêmica em torno do burquíni há uma base cultural e não religiosa porque "o islã proíbe que as mulheres frequentem praias mistas".

Tradicionalmente, as mulheres conservadoras que decidiam dar um mergulho faziam isso com sua roupa habitual de ir à rua, uma prática que ainda é muito vista em várias praias e piscinas.

De acordo com interpretações mais rigorosas do islã, nem homens nem mulheres podem ir a estes locais de lazer, já que a mistura de sexos, e ainda mais a possibilidade de serem vistos "seminus", não é permitida.

No entanto, nem todas as banhistas escolhem essa peça por motivos religiosos. L.B., de 39 anos, diz que costuma colocar o burquíni em algumas ocasiões por vergonha.

"No ano passado, decidi ir nadar de burquíni, principalmente, por pudor. Ganhei muito peso e, particularmente, achei que o biquíni tradicional não cobria suficientemente minhas curvas. Foi uma maneira de me proteger de olhares indiscretos", explicou a mulher, que preferiu não ter seu nome revelado.

L.B., que se considera uma muçulmana moderada, afirmou que normalmente não usa o véu. "Mas posso usar o burquíni na praia. É uma decisão que vem da minha percepção do corpo", acrescentou.

A criadora do burquíni, a estilista australiana de origem libanesa Aheda Zanetti, uma muçulmana amante dos esportes, sempre defendeu o traje como algo que dá mais liberdade às mulheres e, ao mesmo tempo, é confortável.

Zanetti revelou recentemente, inclusive, que a venda dos burquínis aumentou bastante e que a maioria dos pedidos está vindo de não muçulmanas.

Uma das polêmicas mais recentes geradas no Egito em torno desta vestimenta aconteceu na turística Península do Sinai, depois que uma mulher com burquíni foi expulsa da piscina.

A banhista denunciou o caso ao presidente da administração da região, situada em Ras Sudr, que justificou a expulsão por "motivos de higiene", outra das razões defendidas pela prefeitura de Villeneuve-Loubet.

Consultado pela Efe, o vice-xeique da Mesquita de Al-Azhar, a instituição mais prestigiada do islã sunita, Abbas Shuman, minimizou a importância da controvérsia e evitou avaliar a questão ou abordar o tema de maneira direta.

"É preciso garantir as liberdades individuais, por um lado, e que as pessoas vistam o que quiserem, mas é preciso respeitar também a leis em vigor", disse.

Segundo Shuman, é melhor não intervir no debate criado para evitar aumentar a polêmica e porque este é um assunto interno da França.