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Colômbia vive seu primeiro ano de solidão sem García Márquez

17/04/2015 22h57

Gonzalo Domínguez Loeda.

Bogotá, 17 abr (EFE).- A Colômbia mergulhou novamente nesta sexta-feira na obra de seu Nobel de Literatura, Gabriel García Márquez, no primeiro aniversário da morte do "filho do telegrafista", obscurecido em parte pela 'macondiana' situação política do país que se debate entre a guerra e a paz.

O tributo se iniciou com suas borboletas amarelas inundando as redes sociais, uma ideia que partiu do Ministério de Cultura colombiano, que levou ao Twitter o projeto "#Gabovive" com o qual lembraram sua figura e que se transformou no assunto mais comentado dessa rede social no país.

"Quando descobrimos Macondo, conhecemos a família Buendía e nos apaixonamos pelas borboletas amarelas. Vamos ler!", postou o Ministério junto com uma grande foto de Gabo rodeado desses lepidópteros que circundavam Mauricio Babilonia em enxames em "Cem anos de solidão".

Mas sem dúvida o momento principal do dia chegou na apresentação da Feira Internacional do Livro de Bogotá (Filbo), que começará em 21 de abril com Macondo, o universo mágico da obra cúpula de García Márquez, como convidado de honra.

No ato esteve presente o biógrafo de García Márquez, o britânico Gerald Martin, que com extrema lucidez roubou a cena com suas sentenças derivadas do conhecimento exaustivo: "Escrevia como Cervantes e falava como Chaplin", declarou sobre Gabo.

Ele é o "grande clássico latino-americano", Macondo é "a primeira aldeia global literária", Gabo "será 'top' nos próximos 500 anos" como Shakespeare e Cervantes foram nas centúrias precedentes, foram outras das contribuições do também biógrafo do guatemalteco Miguel Ángel Asturias, ganhador do Nobel de Literatura em 1967.

"Me dei conta na primeira vez que li 'Cem anos de solidão' que Macondo seria como La Mancha de Cervantes, um dos grandes lugares da literatura", concluiu.

Este foi o prelúdio de uma feira que na terça-feira abrirá as portas aos visitantes com mapas e pavilhões dedicados a Macondo em uma evocação do realismo fantástico que se inspira mais que nunca em uma Colômbia paradoxal na qual o sangue segue emanando como nas obras de Gabo.

Não em vão, o processo de paz entre entre o governo e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) caminha na corda bamba após o ataque dessa guerrilha que matou 11 militares na quarta-feira passada apesar do cessar-fogo unilateral que o grupo rebelde tinha iniciado em dezembro de 2014.

Os vaivéns do processo que, após mais de meio século de enfrentamento armado deve dirigir à Colômbia à paz e realizar assim um dos grandes sonhos de García Márquez, acabou competindo com Gabo no noticiário do dia.

O presidente Juan Manuel Santos, que dedicou homenagens ao Nobel de Literatura de 1982 há um ano quando Gabo faleceu na Cidade do México, e inclusive compareceu a seu funeral nesse país, hoje não fez nenhuma menção ao autor nem em seus discursos nem nas redes sociais nas quais é muito ativo.

O aniversário, no entanto, encontrou espaço na inauguração esta noite da exposição "Um espelho do mundo", na Biblioteca Nacional de Bogotá, com o ambicioso objetivo de se aproximar da figura humana de Gabo e conquistar novos leitores para a obra do escritor.

Para conseguir esse objetivo, a instituição exporá a máquina com a qual García Márquez deu à luz a "Cem anos de solidão", sua obra mais famosa, assim como a medalha e o diploma entregues pela Academia Sueca do Nobel.

Além dos homenagens institucionais, a Fundação Gabriel García Márquez para o Novo Jornalismo Ibero-Americano (FNPI) rendeu tributo a seu fundador e renovou seu compromisso com ele.

"Gabriel García Márquez está conosco de maneira intensa. Não tivemos tempo de sentir sua falta, porque não passou nem um só dia sem que seja homenageado ou que apareça nas notícias, nas redes sociais, nas ruas", afirmou a FNPI em seu site.

A fundação, que este ano celebra seu 20 aniversário, destacou que as "manifestações de carinho para Gabo" lhes encorajam a manter o compromisso adquirido com o Nobel: "trabalhar por um jornalismo de excelência com valor de serviço público".

"Não foi um ano de ausência, mas de uma presença distinta, renovada e inspiradora", destacaram.