Novo livro de Umberto Eco discute mau jornalismo e apatia do público
Carmen Sigüenza.
Madri, 6 abr (EFE).- O escritor e filósofo italiano Umberto Eco volta à carga com "Número zero", um romance que critica o mau jornalismo, a mentira e a manipulação da história. Uma paródia sobre estes tempos convulsos, porque "essa é a função crítica do intelectual".
"Essa é minha maneira de contribuir para esclarecer algumas coisas. O intelectual não pode fazer nada, não pode fazer a revolução. As revoluções feitas por intelectuais são sempre muito perigosas", explicou à Agência Efe.
"Uma vez escrevi que o intelectual verdadeiro não é o que fala a favor de seu partido, mas contra", lembrou o autor de "O nome da rosa", em entrevista feita em sua casa em Milão, em frente ao castelo Sforzesco, perto do Duomo.
Uma casa envolvida em livros, literalmente, com mais de 35 mil volumes ordenados por temas em seus infinitos corredores, e repleta de obras de arte onde Eco, aos 83 anos, recebe incansavelmente jornalistas para falar de "Número zero", que será lançado no Brasil pela editora Record ainda este ano.
Um dos semiólogos e intelectuais europeus mais importantes do século, Eco possui títulos tão simbólicos e bem-sucedidos como os romances "O nome do rosa" (1982), "O pêndulo de Foucault" (1988) e "O cemitério de Praga" (2010), além de ensaios "O problema estético" (1956), "O sinal" (1973), "Tratado geral de semiótica" (1975) e o famoso "Apocalípticos e integrados" (1964), referência nos cursos de comunicação em todo o mundo.
Isso pode se repetir com este novo romance jornalístico, mais curto que os anteriores, que costumavam ter 600 páginas; isso o faz soar um pouco diferente, disse o próprio autor. "Este saiu com o ritmo de jazz, os outros eram como uma sinfonia de Mahler. Mais jazz pelo argumento, com temas mais rápidos, como é o jornalismo".
Um ofício que o autor conhece bem, porque faz parte dele. Eco escreve desde 1960 muitos artigos e ensaios sobre os "mass media", e por isso se sente à vontade para fazer a crítica "desde o interior" da profissão.
A história começa com a criação, por um empresário italiano (que remete a Silvio Berlusconi) de "Número zero", um exemplar teste de uma revista, em 1992.
Ela tem intenção não de informar, mas de ser ferramenta de poder para pressionar e desacreditar políticos e rivais, criar relatórios, notícias falsas e complôs.
"Há mais de dez anos tinha este romance em minha cabeça, sempre quis falar dos problemas do jornalismo e agora também da internet, onde se pode mentir muito. Eu a utilizei, por exemplo, para este romance, onde me informei sobre a autópsia de (Benito) Mussolini".
"Mas a internet é como o automóvel, não podemos passar a vida na internet como não se pode estar o dia todo dentro do carro", advertiu.
'Número zero', além de ser uma radiografia sobre o pior do jornalismo, do poder e da corrupção, é uma visão da Itália dos últimos 30 anos, e traz outra questão: "não são as notícias que fazem o periódico, mas o periódico que faz as notícias; e saber juntar quatro notícias diferentes significa propor ao leitor uma quinta notícia", diz um personagem.
Uma Itália cuja história é a de "um povo de punhais e venenos", como diz uma das protagonistas. "Elegi 1992 para situar o livro porque nesse momento houve esperança, nasceu a operação 'Mãos Limpas' e parecia que tudo mudaria, havia a luta contra a corrupção, mas chegou Berlusconi e as coisas aconteceram exatamente ao contrário".
O livro termina com sabor agridoce porque, apesar de antes tudo era mais opaco, e revelar ou descobrir informação poderia custar a vida, mas "hoje, quando aparecem os nomes de corruptos e fraudadores e descobrimos mais, as pessoas não se importam, e só vão presos os albaneses ladrões de frangos", lamentou Eco.
(alerta de spoiler)
E isso acontece no romance, que termina com uma boa reportagem da "BBC", que após ser vista por um personagem diz: "As pessoas decentes continuarão votando nos trapaceiros porque não darão crédito à "BBC", porque não verão programas como o desta noite, porque estarão hipnotizados em reality shows".
Madri, 6 abr (EFE).- O escritor e filósofo italiano Umberto Eco volta à carga com "Número zero", um romance que critica o mau jornalismo, a mentira e a manipulação da história. Uma paródia sobre estes tempos convulsos, porque "essa é a função crítica do intelectual".
"Essa é minha maneira de contribuir para esclarecer algumas coisas. O intelectual não pode fazer nada, não pode fazer a revolução. As revoluções feitas por intelectuais são sempre muito perigosas", explicou à Agência Efe.
"Uma vez escrevi que o intelectual verdadeiro não é o que fala a favor de seu partido, mas contra", lembrou o autor de "O nome da rosa", em entrevista feita em sua casa em Milão, em frente ao castelo Sforzesco, perto do Duomo.
Uma casa envolvida em livros, literalmente, com mais de 35 mil volumes ordenados por temas em seus infinitos corredores, e repleta de obras de arte onde Eco, aos 83 anos, recebe incansavelmente jornalistas para falar de "Número zero", que será lançado no Brasil pela editora Record ainda este ano.
Um dos semiólogos e intelectuais europeus mais importantes do século, Eco possui títulos tão simbólicos e bem-sucedidos como os romances "O nome do rosa" (1982), "O pêndulo de Foucault" (1988) e "O cemitério de Praga" (2010), além de ensaios "O problema estético" (1956), "O sinal" (1973), "Tratado geral de semiótica" (1975) e o famoso "Apocalípticos e integrados" (1964), referência nos cursos de comunicação em todo o mundo.
Isso pode se repetir com este novo romance jornalístico, mais curto que os anteriores, que costumavam ter 600 páginas; isso o faz soar um pouco diferente, disse o próprio autor. "Este saiu com o ritmo de jazz, os outros eram como uma sinfonia de Mahler. Mais jazz pelo argumento, com temas mais rápidos, como é o jornalismo".
Um ofício que o autor conhece bem, porque faz parte dele. Eco escreve desde 1960 muitos artigos e ensaios sobre os "mass media", e por isso se sente à vontade para fazer a crítica "desde o interior" da profissão.
A história começa com a criação, por um empresário italiano (que remete a Silvio Berlusconi) de "Número zero", um exemplar teste de uma revista, em 1992.
Ela tem intenção não de informar, mas de ser ferramenta de poder para pressionar e desacreditar políticos e rivais, criar relatórios, notícias falsas e complôs.
"Há mais de dez anos tinha este romance em minha cabeça, sempre quis falar dos problemas do jornalismo e agora também da internet, onde se pode mentir muito. Eu a utilizei, por exemplo, para este romance, onde me informei sobre a autópsia de (Benito) Mussolini".
"Mas a internet é como o automóvel, não podemos passar a vida na internet como não se pode estar o dia todo dentro do carro", advertiu.
'Número zero', além de ser uma radiografia sobre o pior do jornalismo, do poder e da corrupção, é uma visão da Itália dos últimos 30 anos, e traz outra questão: "não são as notícias que fazem o periódico, mas o periódico que faz as notícias; e saber juntar quatro notícias diferentes significa propor ao leitor uma quinta notícia", diz um personagem.
Uma Itália cuja história é a de "um povo de punhais e venenos", como diz uma das protagonistas. "Elegi 1992 para situar o livro porque nesse momento houve esperança, nasceu a operação 'Mãos Limpas' e parecia que tudo mudaria, havia a luta contra a corrupção, mas chegou Berlusconi e as coisas aconteceram exatamente ao contrário".
O livro termina com sabor agridoce porque, apesar de antes tudo era mais opaco, e revelar ou descobrir informação poderia custar a vida, mas "hoje, quando aparecem os nomes de corruptos e fraudadores e descobrimos mais, as pessoas não se importam, e só vão presos os albaneses ladrões de frangos", lamentou Eco.
(alerta de spoiler)
E isso acontece no romance, que termina com uma boa reportagem da "BBC", que após ser vista por um personagem diz: "As pessoas decentes continuarão votando nos trapaceiros porque não darão crédito à "BBC", porque não verão programas como o desta noite, porque estarão hipnotizados em reality shows".
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