A jihad do Estado Islâmico tem seu próprio gênero musical
Susana Samhan.
Beirute, 20 fev (EFE).- Se a jihad, ou guerra santa, como chama o grupo radical Estado Islâmico (EI), tivesse um gênero musical, seria sem dúvida uma compilação do "enshad", as músicas que acompanham os vídeos das atrocidades dessa organização.
As letras de suas canções, das quais possivelmente a mais famosa seja "Ummati qad lah fayr" ("Minha nação, o amanhecer apareceu"), são uma litania previsível de odes à guerra santa, "aos soldados de Alá" e ao Estado Islâmico, onde se sobressai uma voz principal seguida por um coro.
Embora aparente "beber" da tradição do Oriente Médio, "esta música está mais perto de Lady Gaga do que dos clássicos árabes por sua simplicidade", opinou o artista egípcio Mustafa Said, diretor da Fundação para a Documentação e Pesquisa da Música Árabe no Líbano.
Os radicais não têm cantores conhecidos e os autores de suas músicas costumam ser simpatizantes com boa voz e um bom equipamento.
Em entrevista à Agência Efe em seu escritório em Qornet al Hamra, ao norte de Beirute, Said explicou que o que os jihadistas cantam nada tem a ver com os "enshad" autênticos, um gênero musical que se originou a partir da leitura do Corão "de forma artística".
Os "enshad" tradicionais costumam ser cantados à capela, embora também admitam percussão e outros instrumentos, e têm um grande afinco no sufismo, no qual, como em outras doutrinas místicas, às vezes se fala de Deus como se fosse o amor.
De fato, são cantos típicos do Egito, que conta com um grande número de confrarias sufis, embora estejam presentes na maioria dos países árabes.
Nas últimas décadas, decaíram devido ao auge do pensamento salafista, original da Arábia Saudita, que o considera proibido.
"O problema dos salafistas com as músicas é que é um tipo que reflete uma forma aberta de pensar, porque não só falam da religião, mas também de coisas cotidianas", disse Said.
Paradoxalmente, os que estão se encarregando de ressuscitar os "enshad" hoje em dia são os radicais, que povoam o YouTube com suas músicas propagandísticas e nas quais se aprecia, além disso, uma influência musical saudita.
Mesmo assim, muitos jihadistas levariam as mãos à cabeça se soubessem que se considera "Tala Badru Alani" ("A lua branca ascendeu sobre nós") o primeiro "nashid" para celebrar a chegada do profeta Maomé à cidade santa saudita de Meca e que acredita-se que foi interpretado por um coro de mulheres.
Para o músico e líder da banda libanesa Al Rahil al Kabir, Khaled Subeih, o que os extremistas acreditam em termos musicais é fruto do predomínio da Arábia Saudita na região em todos os âmbitos.
"Antes as músicas eram mais variadas, agora são monótonas, só falam da jihad e estão vinculadas à situação política", comentou à Agência Efe este artista.
De fato, atualmente fica difícil distinguir os "enshad" sunitas dos xiitas, porque todos soam igual. "Não há uma conexão com a tradição e isso ocorre em todos os âmbitos culturais", afirmou.
O "munshid" (vocalista) do grupo xiita libanês Hezbollah, Ali Barakat, concorda que quase não há diferença do ponto de vista musical entre os hinos xiitas ou sunitas, tão só nas letras, sobretudo quando abordam assuntos políticos.
Com relação "aos grupos terroristas, não fazem música, é só voz, quase não há um trabalho por trás de suas canções. Apenas com um computador em casa é possível fazer isso", assegurou o intérprete.
Para este cantor, se há um país de referência dos hinos xiitas é o Irã "por sua cultura e civilização".
Ali Barakat alcançou certa notoriedade no ano passado por uma de suas canções na qual arengava às tropas do Hezbollah, que apoiam o governo de Damasco, na Síria, e esteve há alguns meses na prisão no Líbano por suas músicas contrárias à Arábia Saudita.
A rivalidade entre esse reino e o Irã está onipresente nesta parte do mundo, onde ambos Estados concorrem por obter a supremacia e onde nem sequer a cultura fica a salvo.
Beirute, 20 fev (EFE).- Se a jihad, ou guerra santa, como chama o grupo radical Estado Islâmico (EI), tivesse um gênero musical, seria sem dúvida uma compilação do "enshad", as músicas que acompanham os vídeos das atrocidades dessa organização.
As letras de suas canções, das quais possivelmente a mais famosa seja "Ummati qad lah fayr" ("Minha nação, o amanhecer apareceu"), são uma litania previsível de odes à guerra santa, "aos soldados de Alá" e ao Estado Islâmico, onde se sobressai uma voz principal seguida por um coro.
Embora aparente "beber" da tradição do Oriente Médio, "esta música está mais perto de Lady Gaga do que dos clássicos árabes por sua simplicidade", opinou o artista egípcio Mustafa Said, diretor da Fundação para a Documentação e Pesquisa da Música Árabe no Líbano.
Os radicais não têm cantores conhecidos e os autores de suas músicas costumam ser simpatizantes com boa voz e um bom equipamento.
Em entrevista à Agência Efe em seu escritório em Qornet al Hamra, ao norte de Beirute, Said explicou que o que os jihadistas cantam nada tem a ver com os "enshad" autênticos, um gênero musical que se originou a partir da leitura do Corão "de forma artística".
Os "enshad" tradicionais costumam ser cantados à capela, embora também admitam percussão e outros instrumentos, e têm um grande afinco no sufismo, no qual, como em outras doutrinas místicas, às vezes se fala de Deus como se fosse o amor.
De fato, são cantos típicos do Egito, que conta com um grande número de confrarias sufis, embora estejam presentes na maioria dos países árabes.
Nas últimas décadas, decaíram devido ao auge do pensamento salafista, original da Arábia Saudita, que o considera proibido.
"O problema dos salafistas com as músicas é que é um tipo que reflete uma forma aberta de pensar, porque não só falam da religião, mas também de coisas cotidianas", disse Said.
Paradoxalmente, os que estão se encarregando de ressuscitar os "enshad" hoje em dia são os radicais, que povoam o YouTube com suas músicas propagandísticas e nas quais se aprecia, além disso, uma influência musical saudita.
Mesmo assim, muitos jihadistas levariam as mãos à cabeça se soubessem que se considera "Tala Badru Alani" ("A lua branca ascendeu sobre nós") o primeiro "nashid" para celebrar a chegada do profeta Maomé à cidade santa saudita de Meca e que acredita-se que foi interpretado por um coro de mulheres.
Para o músico e líder da banda libanesa Al Rahil al Kabir, Khaled Subeih, o que os extremistas acreditam em termos musicais é fruto do predomínio da Arábia Saudita na região em todos os âmbitos.
"Antes as músicas eram mais variadas, agora são monótonas, só falam da jihad e estão vinculadas à situação política", comentou à Agência Efe este artista.
De fato, atualmente fica difícil distinguir os "enshad" sunitas dos xiitas, porque todos soam igual. "Não há uma conexão com a tradição e isso ocorre em todos os âmbitos culturais", afirmou.
O "munshid" (vocalista) do grupo xiita libanês Hezbollah, Ali Barakat, concorda que quase não há diferença do ponto de vista musical entre os hinos xiitas ou sunitas, tão só nas letras, sobretudo quando abordam assuntos políticos.
Com relação "aos grupos terroristas, não fazem música, é só voz, quase não há um trabalho por trás de suas canções. Apenas com um computador em casa é possível fazer isso", assegurou o intérprete.
Para este cantor, se há um país de referência dos hinos xiitas é o Irã "por sua cultura e civilização".
Ali Barakat alcançou certa notoriedade no ano passado por uma de suas canções na qual arengava às tropas do Hezbollah, que apoiam o governo de Damasco, na Síria, e esteve há alguns meses na prisão no Líbano por suas músicas contrárias à Arábia Saudita.
A rivalidade entre esse reino e o Irã está onipresente nesta parte do mundo, onde ambos Estados concorrem por obter a supremacia e onde nem sequer a cultura fica a salvo.
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