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Mudança da era maia expõe discriminação indígena histórica

27/11/2012 10h02

Cidade do México, 27 nov (EFE).- A esperada mudança da era maia, que acontecerá no próximo dia 21 de dezembro, deve expor, de acordo com vários especialistas, a discriminação contra algumas comunidades que tiveram pouco acesso ao conhecimento de sua própria história.

"Alguns maias atuais desconhecem a característica básica do calendário. Houve uma ruptura bastante brusca do conhecimento dos antigos maias e da herança dos atuais", afirmou à Agência Efe a professora e pesquisadora de língua e cultura maia da Universidade Autônoma Campeche (UACAM), Cessia Esther Chuc Uc.

Em sua opinião, estas povoações indígenas tiveram "pouco acesso a sua história" por conta do modelo econômico, cultural e social no qual viveram desde a conquista espanhola, agravado pela falta de ajuda e suporte do Estado mexicano, que "não facilitou as condições para seu desenvolvimento".

De acordo com o calendário maia, uma era é composta por 13 ciclos, denominados Baktunes, e é concluída a cada 5.125 anos. Segundo esta visão, a atual era começou em 3.118 a.C e terminará em 21 de dezembro, quando começará o primeiro ciclo Baktun da era seguinte.

Para a pesquisadora da Universidade Católica de Milão, Michela Craveri, a mudança de era "está sendo explorada com fins turísticos e comerciais, sem que as pessoas pensem no significado desta data para a cultura que tenta sobreviver, apesar dos séculos de exploração e discriminação".

A especialista declarou à Efe que esta mudança é um "momento de renovação e de celebração da cultura maia", embora considere que mais do que uma modificação concreta na vida cotidiana, será um "momento de reafirmação da cultura, que manteve suas raízes apesar da forte influência ocidental".

Para Michela, "sem dúvida, mais de 500 anos de contato e imposição cultural ocidental afetaram as comunidades maias de toda região". No entanto, a pesquisadora disse que ainda é possível observar a conservação de práticas culturais antigas deste povo, que atingiu seu apogeu entre 300 e 1000 d.C.

"A espiritualidade ancestral e a celebração de rituais tradicionais serviram como canais de afirmação de identidade, sobretudo nas épocas mais difíceis de imposição cultural, política e religiosa por parte do Ocidente", disse a pesquisadora.

A ideia de um fim do mundo profetizado pelos maias, desmentida posteriormente por líderes indígenas e cientistas, causa "desconcerto" nas comunidades e é um "exemplo de imposição de uma interpretação alheia sobre um significado autóctone".

Além disso, Michela considerou que a percepção que há em volta destes acontecimentos é mais "superficial", baseada na difusão através dos meios de informação de "estereótipos do mundo indígena" e "com fins de exploração turística e econômica".

"O Mundo Maia", integrado por México, Guatemala, Honduras, Belize e El Salvador, prepara-se para aproveitar o empurrão turístico que a mudança de ciclo no calendário dessa civilização pré-colombiana irá gerar.

De acordo com as projeções da Organização Mundo Maia (OMM), só o México espera receber cerca de dez milhões de turistas, e o resto dos países mais de cinco milhões, de modo que o fim do ciclo maia fará crescer em mais de 10% o turismo na região.

Já a pesquisadora Cessia assegurou que a mudança de era é uma "data simbólica e transcendental" que seria preciso aproveitar para que se produza uma mudança de rumo baseada no "desenvolvimento equitativo", para que os habitantes maias tenham melhores condições de vida.

Em sua opinião, é mais necessário do que nunca escutar a voz deste povo, "e não a opinião de certos líderes", mas a de suas comunidades, cujos usos ambientais e dos recursos naturais são extremamente necessários e valiosos.

"Aposto que nesta nova era pode haver um diálogo de respeito, justiça, onde os povos maias possam conversar cara a cara com o Estado, mas que seja real, que não seja nada mais do que um discurso demagógico", concluiu.