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Antiga fábrica de cerâmica em Recife revela arte inquietante do pernambucano Brennand

Coleção de esculturas, pinturas e cerâmicas do artista Francisco Brennand, em Recife (17/4/12) - EFE
Coleção de esculturas, pinturas e cerâmicas do artista Francisco Brennand, em Recife (17/4/12) Imagem: EFE

Manuel Pérez Bella

17/04/2012 10h14

Uma antiga fábrica de cerâmicas que passou 26 anos em ruínas em Recife revela a densa e inquietante coleção de esculturas, pinturas e cerâmicas do renomado artista Francisco Brennand.

O conjunto de edifícios, inserido em uma floresta tropical nos arredores da capital pernambucana era propriedade de seu pai e foi uma fábrica de telha e tijolos. Abandonada em 1945 e restaurada pelo próprio Brennand em 1971, o local se transformou em seu museu particular e também em uma oficina onde, aos 84 anos, ele trabalha diariamente.

Brennand explicou à Agência Efe que a oficina não está concluída e ainda falta muito trabalho no local, onde pretende "glorificar" a memória de seu pai e a história da região, onde, segundo ele, foi forjada a consciência brasileira durante a guerra contra os holandeses, no século XVII.

"A oficina era o lugar dos meus jogos de infância, um lugar propício ao mistério. Era isolado, escuro", lembrou o artista, que com a reforma quis conservar "o fetiche, a magia e a memória" do recinto.

"A floresta cresceu em torno de mim durante 40 anos e a oficina ficou como um ninho. O conjunto passou a ter para mim um valor místico, como se fosse um santuário. Estas peças que vão enchendo o local contam com uma espécie de mitologia pessoal, onde abordo à minha maneira mitos que me interessam, figuras históricas", relatou.

Brennand começou sua carreira artística na década de 40, período no qual viajou à França, estudou e se inspirou em obras de Pablo Picasso e Joan Miró, antes de se encantar pela cerâmica como seu principal meio de expressão.

Centenas de esculturas, com formas abstratas, retorcidas, remetem ao sexo, ao nascimento e à morte, e povoam as salas da velha fábrica, além das fontes e jardins, um deles desenhado pelo célebre paisagista Burle Marx.

Um dos edifícios está dedicado às suas pinturas e tem as mulheres como tema principal, com técnicas variadas que passam da cera ao carvão.

Suas obras foram expostas em várias cidades brasileiras e de Estados Unidos, Alemanha, França, Espanha, Bélgica e Itália, entre outros países. Brennand comentou que sua arte responde a seus problemas e dúvidas pessoais de ordem existencial. Através das suas obras, o artista falou que busca "uma linguagem mais próxima ao eixo do mundo", que faça um retrato profundo do homem.

Brennand comentou que o motivo de suas esculturas serem dotadas de "uma carga sexual" é porque o ser humano não consegue encontrar sentido para o sexo. "Mais do que a morte, ele deixa o homem diante de uma perplexidade insondável", disse Brennand.

O artista também questiona as pessoas que o julgam pelo suposto erotismo de suas figuras. "Minhas esculturas não são eróticas, podem até chamá-las de espantosas, terríveis, o horror da existência. As mulheres querem ser retratadas pela "Playboy", não da forma como eu as vejo. Mas minhas deformações não são a busca do feio, e sim do belo. A deformação é a homenagem à forma", especificou.

Com sua barba branca e apoiado em uma bengala, Brennand gosta de receber os visitantes do museu pessoalmente, embora reconheça que a maioria das pessoas "deteste" sua arte e só consiga apreciar a beleza da oficina e da paisagem da exuberante floresta.

Os edifícios são inteiramente decorados com cerâmicas brilhantes saídas dos fornos da antiga olaria, que dá um aspecto inusitado ao lugar e um feitiço que não é indiferente a nenhum visitante.