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Lars von Trier ofusca sua "Melancholia" ao confessar simpatia a Hitler

18/05/2011 11h47

Mateo Sancho Cardiel.

Cannes (França), 18 mai (EFE).- Como um filho pródigo que volta para casa Lars von Trier foi recebido em Cannes com seu contido filme "Melancholia", mas o diretor, apreciador de uma polêmica após a experiência com o "Anticristo", decidiu buscar outras formas para seguir na mesma linha e afirmou que simpatiza com Adolf Hitler.

"Eu entendo Hitler, embora saiba que fez coisas erradas, sei disso. Só estou dizendo que entendo o homem, não é o que chamaríamos de um bom homem, mas simpatizo um pouco com ele", declarou na entrevista coletiva de apresentação do filme ao ser perguntado por sua aproximação ao judaísmo.

"A única coisa que posso dizer é que durante muito tempo pensei que fosse judeu e era feliz. Depois, entendi que não era. Queria ser judeu, mas na realidade percebi que era um nazista, porque minha família era alemã, o que também me agradava", foi o início de sua argumentação.

No final tentou suavizar: "não estou a favor da Segunda Guerra Mundial nem estou contra os judeus". Mas a polêmica já havia explodido.

Na realidade, tudo havia começado suave, sem a prepotência que imperou dois anos atrás quando autodenominou-se "o melhor diretor do mundo" na apresentação de seu filme anterior; o diretor dinamarquês parecia ajustar-se nesta quarta-feira ao ditado que depois da tempestade vem a bonança para despojar-se de sua obsessão pelo sofrimento, seu ódio as mulheres e sua tendência ao excesso.

Ele mesmo definia seu filme como "romântico", afirmou que sua obra não parece sua, que o "look" lembrava aqueles longas-metragens que tanto detesta e em seu próximo filme confessou que pretende radicalizar e fazer pornografia.

Apesar da polêmica, deixou claro sua alegria por voltar a Cannes, lugar que o premiou com a Palma de Ouro com "Dançando no Escuro", e inaugurou o influente movimento "Dogma 95" com "Os idiotas".

"Tive muitas fases melancólicas em minha vida, mas atualmente estou muito feliz por estar aqui", reconhecia com cordialidade para surpresa dos presentes, sem que pudesse prever as consequências de sua participação.

Uma pena, já que assim desviou a atenção de "Melancholia" que é o equivalente aos exercícios de desarme de outros cineastas como David Cronenbergh e seu "Senhores do Crime" e David Lynch e sua "História Real", de modo que, longe de perder a assinatura, os deixam desnudos com mais força do que nunca.

Certamente, existe a grandiloquência, existe o coquetel de referências artísticas, tem Wagner e há um planeta que arrasará a Terra. Mas o filme "não é sobre o apocalipse, mas sobre a necessidade de expressar-se", que não é mais o ponto forte dos grandes autores escandinavos de todos os tempos.

É visível seu interesse por personagens desequilibrados e sua aproximação ao eterno dilema entre ciência e intuição. O filme encontrou, apesar de não uma ovação fechada, cumplicidade de um público muito mais amplo do que costuma acompanhar um diretor que levanta tanto a paixão quanto o ódio.

Kristen Dunst, a noiva que mergulha em uma depressão poucas horas após dizer o "sim, eu aceito", é a protagonista deste díptico da complexidade feminina. O outro cabe a Charlotte Gainsbourg, como sua controladora irmã, apavorada pelo fim dos tempos.

Até a contagem regressiva da espécie humana completa o quadro psicológico familiar Charlotte Rampling, como a impiedosa mãe, e John Hurt como pai desinteressado.

Dunst, que já esteve em Cannes como a "Maria Antonieta" de Sofia Coppola, deslumbra desta vez por sua capacidade de conduzir na hora de mostrar o leque de fortalezas e fragilidades de sua personagem, Justine. E sua interpretação soa a prêmio se ao fim o júri tiver critérios estritamente cinematográficos.

"A depressão no fundo é um processo de abrir-se de igual para igual e fortalecer-se", disse a atriz.

Lars von Trier também acaba de recuperar-se de uma depressão. E sim, voltou mais forte.