Enredo: desfile da Beija-Flor ignora 'panetones'
Nada de dinheiro na meia ou panetones. Em sua homenagem aos 50 anos de Brasília, a Beija-Flor de Nilópolis levará para o Carnaval do Rio a história do povo que construiu a capital do País, deixando de lado os casos de corrupção.
"Desde o início nós optamos por não olhar para dentro dos ministérios, mas sim para a história do povo", explica Alexandre Louzada, um dos integrantes da Comissão de Carnaval responsável pelo enredo "Brasília 50 anos". "A corrupção é brasileira, não brasiliense. E o Arruda não é brasiliense", lembra. Arruda nasceu em Minas Gerais.
A referência é feita ao atual governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, envolvido em um suposto esquema de coleta e distribuição de propinas. No auge do escândalo, no ano passado, imagens mostravam Arruda recebendo dinheiro e o então presidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal, Leonardo Prudente, colocando pacotes com notas no bolso e nas meias. Em sua defesa, o governador afirmou que o dinheiro foi usado para a compra e distribuição de panetones.
Apesar de ignorar os casos mais recentes de corrupção, a Beija-Flor não conseguiu fugir da polêmica. No desfile que começa às 2h25 da madrugada de domingo, boa parte dos 3.750 integrantes da escola vai utilizar fantasias bancadas pelo governo do Distrito Federal. Dos R$ 8 milhões que a escola vai gastar no desfile, R$ 3 milhões vieram de patrocínio.
"O enredo é fruto de uma licitação pública que passou por várias etapas. E a Beija-Flor venceu", diz Louzada. "Era desejo do governo que uma das escolas do Rio homenageasse os 50 anos de Brasília. E nós vamos fazer isso."
Na homenagem, a escola vai utilizar oito carros alegóricos, distribuídos entre 44 alas. Na voz do histórico intérprete Neguinho da Beija-Flor, o samba vai contar a história da criação da cidade, com direito a detalhes que muitos brasileiros nem conhecem.
"A Inconfidência Mineira, além da separação de Portugal, tinha como objetivo transferir a capital para o interior do País", explica Louzada. "Dom Bosco, fundador (da ordem) dos salesianos, também já havia tido uma visão em 1883 de que uma cidade seria criada naquele local. E José Bonifácio, no primeiro ano de nossa Independência, já dizia que seria Brasília a nova capital do País."
Além do resgate histórico, a Beija-Flor fará uma homenagem em azul e branco aos homens que construíram a cidade. Entre eles estão o arquiteto Oscar Niemeyer, o presidente Juscelino Kubitschek e os trabalhadores de diferentes regiões do País que foram para o Planalto Central erguer a nova cidade. Pelo menos no carnaval, a corrupção ficará de fora.
Confira a letra do samba-enredo da Beija-flor:
"Dádivas o criador concedeu
Faz brotar num sonho divinal
O mais precioso cristal
Lágrimas, fascinante foi a ira de Tupã
Diz a lenda que o mito Goyás nasceu
O brilho em Jacy vem do olhar
pra sempre refletido em suas águas
A força que fluiu deste amor é Paranoá... Paranoá
Oh! Deus Sol em sua devoção
Ergueu-se no Egito fonte de inspiração
Pássaro sagrado voa no infinito azul
Abre as asas bordando o cerrado de Norte a Sul
Ah, terra tão rica é o sertão
Rasga o coração da mata desbravador!
Finca a bandeira nesse chão
pra desabrochar a linda flor
No coração do Brasil,
O afã de quem viu um novo amanhã
Revolta, insurreições, coroas e brasões
Batismo, num clamor de liberdade!
Segue a missão a caravana em jornada
Enfim, a natureza em sua essência revelada
Firmando o desejo de realizar
A flor desabrochou nas mãos de JK
A miscigenação se fez raiz
Com sangue e suor deste País
Vem ver...
A arte do mestre num traço um poema
Nossa capital vem ver...
Legião de artistas, caldeirão cultural!
Orgulho, patrimônio mundial
Sou candango, calango e Beija-Flor
Traçando o destino ainda criança
A luz da Alvorada anuncia!
Brasília, capital da esperança"