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Cientistas fazem comédia stand-up para explicar seu trabalho ao público

11/11/2019 14h51

State College, Estados Unidos, 11 Nov 2019 (AFP) - De dia, Kasha Patel trabalha na NASA escrevendo conteúdo para o site da agência espacial americana, mas, à noite, explica as mais recentes descobertas científicas através de um meio completamente inusitado: a comédia stand-up.

"Parte do meu trabalho é ajudar o público em geral a distinguir entre fato e mito", explicou Patel, de 28 anos, em uma recente apresentação em um bar perto da Penn State University.

"Então, por exemplo, fato: você pode pegar clamídia se um coala urinar em você. Mito: sua esposa acreditará em você", conclui.

O número de Patel fica entre dois campos aparentemente opostos: o método científico, descrito pelo astrônomo Carl Sagan como "indigesto e mal-humorado", e o mundo estridente da comédia, atualmente experimentando um 'boom' que facilitou a ascensão de gêneros de nicho, como o humor intelectual.

Fundadora da DC Science Comedy, hoje um show ao vivo recorrente na capital, Patel está acompanhada esta noite por vários cientistas-comediantes de todo os EUA, unidos em sua crença de que o riso pode ser uma ferramenta poderosa para comunicar conceitos complexos.

Shannon Odell, candidato a PhD em neurociência na Weill Cornell Medical College, que tem um show ao vivo chamado "Drunk Science" (ciência bêbada) em Nova York, diz ao público que, ao contrário do que eles podem pensar, "ciência e comédia na verdade têm muito em comum".

"Ambas estão apenas fazendo observações sobre o mundo e depois compartilhando com o público", diz.

"Jerry Seinfeld é tipo: 'o que acontece com a comida de avião?'... Enquanto os cientistas são tipo: 'o que acontece com o aumento dos níveis de CO2?'"

- Ciência do riso -Em uma entrevista à AFP, Odell explicou que o riso tem um poderoso objetivo evolutivo e ajudou os primeiros humanos a desenvolver camaradagem e redes sociais mais complexas.

"Eu acho que o riso é importante para comunicar a ciência a alguém, porque se você está rindo com ela, é quase como se estivesse em um campo de jogo equilibrado, e as pessoas são mais receptivas às mensagens", disse.

Odell, de 30 anos, usa essa dinâmica em uma série de vídeos do YouTube que exploram a ciência do cérebro humano sob vários estímulos - falando de separações e álcool a imagens de gatinhos.

No caso da bebida, que acumulou meio milhão de visualizações, Odell explora infográficos e analisa o impacto de beber muito no cerebelo, responsável pela coordenação.

Patel, por outro lado, segue um modelo de comédia mais tradicional, e disse à AFP que foi preciso muito trabalho para abandonar seus cuidadosos instintos científicos e abraçar o absurdo necessário para fazer as pessoas rirem consistentemente no palco.

Ela é formada em química e seu material costuma fazer referências a sua formação e vida pessoal.

Um exemplo: "Há alguns anos, a SpaceX lançou o foguete, mas ele explodiu quando saiu da atmosfera da Terra ... Mas a Nasa não chamou isso de fracasso. Eles o chamaram de lançamento não nominal".

"O que é estranho porque na semana passada eu tive um encontro não nominal. Não foi um fracasso, porque ele nunca apareceu", concluiu.

Patel recentemente usou dados para aprimorar seu ato, analisando gravações para ver por quanto tempo a plateia riu depois de 500 de suas piadas para criar uma pontuação de impacto do humor.

"Então eu descobri que minhas piadas científicas são 40% melhores que minhas outras piadas", disse, acrescentando que estava trabalhando em um algoritmo para automatizar a análise.

- Conectando com o público -Uma pesquisa recente do Pew descobriu que a comunidade científica é a segunda instituição mais confiável nos EUA depois das forças armadas, com 44% expressando muita confiança nela - em oposição a apenas 13% para a imprensa.

Isso torna ainda mais importante encontrar novas maneiras de chegar ao público, particularmente em áreas que se tornaram controversas como a ciência do clima, argumenta Odell.

"É ótimo que os cientistas cheguem lá e falem sobre a pesquisa porque eles são os especialistas na pesquisa", afirmou, mesmo que nem todos possam fazê-lo através de piadas ou números de comédia.

Embora os cientistas sejam frequentemente financiados pelo contribuinte, suas pesquisas geralmente acabam sendo apresentadas apenas em conferências especializadas ou em periódicos carregados de jargões e com paywall, criando espaço para o aumento da desinformação.

"Pensamos na ciência como esse tipo de torre de marfim acadêmica ... (mas) há um valor em torná-la divertida, desde que você não perca a precisão científica", concluiu.

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