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Sem luz e internet, fazemos jornalismo 'na marra', conta repórter venezuelana

18/04/2019 17h59

Rio de Janeiro, 18 Abr 2019 (AFP) - Luz Mely Reyes garante que seus mais de 25 anos como jornalista na Venezuela foram marcados pela violência. Em um país arrasado pela crise, a diretora do veículo independente Efecto Coyuco enfrenta atualmente os anos mais difíceis da carreira: "Estamos fazendo jornalismo praticamente na marra".

"São necessários milhares e milhares de jornalistas para contar o que está acontecendo na Venezuela", opina Reyes em entrevista à AFP, à margem da apresentação do relatório anual da organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) no Rio de Janeiro.

A vencedora do prêmio Gabo-2018, moradora de Caracas, decidiu ficar em seu país para exercer um ofício que enfrenta a censura do governo de Nicolás Maduro, como denuncia, e a falta de ferramentas materiais - às vezes, sem luz, internet e jornais.

P: Qual é o principal desafio do jornalismo na Venezuela?

R: Os desafios foram aumentando. Se fosse uma questão de fase, como um videogame, cada dia seria mais difícil. E, neste momento, com todos os apagões que houve na Venezuela, vários dos desafios estão ligados às condições materiais para o exercício do jornalismo.

Em um país onde a eletricidade pode acabar por 25, 30, 40 horas, onde a internet pode falhar e onde até a mobilidade diária está muito complicada, isso está se tornando agora um grande desafio para a Venezuela. Não apenas no exercício do jornalismo (...), mas em como essa informação se difunde para todos os cidadãos.

P: Quais são as principais barreiras?

R: O governo venezuelano já bloqueia domínios de vários veículos investigativos, tira do ar emissoras que considera críticas, que são as televisões estrangeiras, e recentemente outra medida tomada é proibir que se faça referência nos meios radioelétricos a várias situações, e vários programas de rádio foram fechados, que eram alguns que sobravam como refúgio para divulgar informações.

Isto no âmbito de 20 anos de ataque e desmantelamento do sistema de meios independentes. Neste momento, a indústria jornalística da Venezuela está atingida, não apenas pelas restrições através de medidas governamentais, mas da situação econômica, onde mais de 60% dos veículos impressos não conseguem (publicar).

P: Quem ainda pode fazer jornalismo independente na Venezuela?

R: Há uma corrente, um movimento na Venezuela de meios independentes, em sua maioria digitais, que foram sendo criados por vários jornalistas, arrecadando alguns fundos e fazendo jornalismo independente. É muito complicado porque nesse caso o importante é como você vai se sustentar (...) se não houver uma mudança em termos econômicos, uma mudança política que permita a redemocratização do país (...), certamente estamos fazendo jornalismo praticamente na marra.

P: Como continuar a fazer jornalismo na Venezuela?

R: É muito complicado (...). Tem coisas demais acontecendo, histórias demais por contar e seria um crime não contá-las (...). Este é o momento em que são necessários milhares e milhares de jornalistas que possam contar o que está acontecendo na Venezuela.

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