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Nova série documenta a dor após a morte de adolescente negro na Flórida

Pôster da série "Rest in Power: The Trayvon Martin Story" - Reprodução
Pôster da série "Rest in Power: The Trayvon Martin Story" Imagem: Reprodução

Nova York (EUA)

31/07/2018 17h48

A morte de Trayvon Martin, um adolescente negro da Flórida que saiu de casa para comprar doces e foi morto a tiros por um vigilante de bairro, causou indignação nos Estados Unidos em 2012.

Seis anos depois, uma série documental de televisão está revivendo o ocorrido, levando os espectadores a presenciarem a agonia de perder um filho, uma aposta que os pais de Trayvon e os diretores esperam que marque uma mudança.

Financiada parcialmente pelo magnata do rap Jay-Z, a série "Rest in Power: The Trayvon Martin Story" estreou na segunda-feira (30) nas redes Paramount Network e BET e será transmitida em seis episódios semanais.

A série retrata a perda humana, mostrando de perto a mãe de Trayvon, Sybrina Fulton, que tem que escolher entre a dor e a luta pela justiça.

Também mostra seu pai, Tracy Martin, recordando um Trayvon de nove anos que o salvou de uma cozinha em chamas, mas desconsolado por não ter sido capaz de proteger seu filho de 17 anos em uma urbanização fechada da Flórida.

"Quero que as pessoas tomem o que aconteceu com Trayvon como exemplo", disse Fulton em uma exibição no Harlem. "Não esperem até que aconteça algo com seu filho ou ser querido para dizer: 'Está bem, tenho que fazer alguma coisa'".

A série relaciona o atual problema de racismo dos Estados Unidos com o debate sobre o controle de armas e com a pressão da poderosa Associação Nacional do Rifle para que as armas sejam mais fáceis de comprar e disparar.



Desconsolo

A produção repassa a busca de justiça da família e o processo que levou o atirador George Zimmerman a se tornar herói da extrema direita, e traça uma linha desde a morte de Trayvon até o surgimento do movimento Black Lives Matter e do chamado "chicote branco", que influenciou a eleição do presidente Donald Trump.

"Abrimos a caixa de Pandora e não tinha ideia do que ia acontecer", diz Tracy no final do primeiro episódio, depois de um clipe de Trump lançando seu lema de campanha, "Tornar os Estados Unidos grande de novo".

As primeiras críticas foram positivas. The Guardian se referiu à transmissão como um "triunfo", que examina a injustiça racial "com habilidade e implica um golpe poderoso".

"Não há forma de evitar o desconsolo e a dor aqui, e esse é provavelmente o objetivo", escreveu o Los Angeles Times.

Trayvon morreu em Sanford, uma cidade com antecedentes racistas na que Zimmerman chamava com frequência a polícia pela presença de negros e onde o Ku Klux Klan fez com que o herói negro do beisebol Jackie Robinson fosse expulso de campo em 1946.

"Isto é tão antigo quanto o país, e o tipo de ódio e violência e assassinato que acontece em Sanford é emblemático da história dos Estados Unidos", disse o codiretor Jenner Furst à audiência no Harlem.

As imagens de vídeo mostram Zimmerman dizendo à polícia que Trayvon ameaçou matá-lo, antes de que o deixassem ir para casa, e a transmissão de uma ligação ao 911 na que os pais de Trayvon escutaram seu filho gritando "socorro".

O argumento de Zimmerman de que agiu em legítima defesa fez com que ele não fosse preso, obrigando a família de Trayvon a recorrer a advogados de direitos civis, que colocaram o caso no centro do debate nacional.

Anestesiado

A polêmica lei de legítima defesa da Flórida "Stand your ground" (Defenda sua posição), aprovada pelo governador republicano Jeb Bush em 2005, permite que as pessoas no estado usem a força letal para se defender se sentem que suas vidas estão ameaçadas.

Zimmerman foi finalmente absolvido de assassinato em segundo grau por um júri.

A força da série está nos depoimentos da família, nas próprias palavras de Zimmerman e nas entrevistas com o time de advogados de direitos civis que assumiu o caso.

Desde a morte de Trayvon, vários homens negros desarmados morreram nas mãos de agentes de polícia, o que provocou protestos em todo o país e um exame de consciência sobre o racismo institucional e a brutalidade policial.

No início deste mês, Markeis  McGlockton foi morto a tiros em Clearwater, Flórida, depois de uma discussão sobre uma vaga de estacionamento para deficientes. O atirador não foi acusado, amparado pela lei de legítima defesa.

A série tem por trás a mesma equipe de "Time: The Kalief  Browder  Story", uma minissérie sobre um adolescente negro que passou três anos na prisão à espera de julgamento por supostamente roubar uma mochila. Em 2015, se suicidou.

"Estas injustiças ocorrem todos os dias", disse o produtor executivo Chachi  Senior. "O americano foi se anestesiando diante disso tudo".

"A esperança é que os Estados Unidos vejam isto, olhem para si mesmos, reflitam, e esperamos que mude para melhor em alguma medida".