Topo

Quando as periferias do Rio e de Paris disputam para levar sua moda às passarelas

04/07/2018 10h50

Paris, 4 Jul 2018 (AFP) - As marcas de luxo se inspiram no popular estilo de rua? Para os alunos da Casa 93, uma escola de moda gratuita nos subúrbios de Paris, que tem sua origem em uma favela do Rio de Janeiro, nada está mais distante da realidade.

Eles são jovens, talentosos, mas sem recursos ou contatos. Um perfil que dificilmente abre portas no universo exclusivo da moda, não importa quão perto eles vivam do local onde a Semana de Moda mais influente do planeta é realizada periodicamente.

Mas sua outra peculiaridade é que não se encaixam perfeitamente em um sistema que veem como "rígido", "fechado" e "distante" da realidade das novas gerações, certamente uma das mais interessadas em moda, graças às redes sociais. É por isso que eles sonham em criar seu próprio selo e levá-lo para a passarela.

"No subúrbio, as pessoas não se vestem como alguns pensam. Há mais pessoas que se vestem na 'moda da periferia' em Paris", disse Rubi, uma franco-brasileira de 20 anos em um ateliê de Ile-Saint-Denis, ao norte da capital, onde aprende técnicas de corte e costura.

- Na Semana de Moda de São Paulo -Rubi faz parte de um grupo de 20 alunos que a jornalista francesa Nadine Gonzalez recrutou no ano passado para esta primeira experiência que segue os passos de sua escola brasileira, Casa Geração.

Esta escola, nascida na favela do Vidigal, formou uma centena de estudantes desde 2013, e a temporada de 2016 desfilou na Semana de Moda de São Paulo, conseguindo uma inserção de 100% no mercado de trabalho, de acordo com Gonzalez.

"Hoje, por causa das redes sociais, todo mundo quer fazer o mesmo, ir aos mesmos lugares. Mas eles não têm os meios e são forçados a olhar para o plano C, D ou E. Eles têm que ser muito mais criativos para atingir seus objetivos", explica à AFP.

As escolas públicas de design de moda têm enormes listas de espera desanimadoras, enquanto as particulares têm preços proibitivos - milhares de euros por ano. Desta forma, esta "caça-talentos" se cercou de uma dúzia de voluntários para alavancar seu projeto na França, com o apoio da Adidas e da Federação de Alta Costura e Moda, entre outros.

Apenas 11 dos 20 alunos que recrutou - depois de vários meses serpenteando pelos subúrbios do norte de Paris - continuam preparando-se e desenhando coletivamente sua primeira coleção. Alguns deles, forçados a trabalhar para sobreviver, tiveram que abandonar o projeto.

- Endividar-se para estudar? -Cintia, uma brasileira de 25 anos que estuda arte e comunicação, persevera nesse projeto, que a seduz porque "não apresenta a moda de forma espartilhada".

"Eu nasci no outro lado do mundo, não posso ter as mesmas referências que as escolas de Paris", diz esta jovem, que visa criar uma "publicação alternativa" sobre moda na internet.

"Por que se endividar para estudar se com o mesmo montante eu posso lançar minha própria marca?", afirma Rubi, que prepara um site de venda de roupas com sua irmã.

Njeri, de 21 anos, também explora seu próprio caminho. Com uma certa experiência em estilismo, esta jovem quer conhecer os segredos da confecção e dedicar-se à fotografia na moda. Mas não se reconhece nisso, especialmente na feminina, onde "as mulheres cheinhas" não têm lugar.

Embora Njeri defenda uma "moda mais simples pensada para todos", seu parceiro Miguel, de 18 anos, um dos dois garotos no projeto, não está interessado em "vestir as pessoas da rua". Sua moda será "extrovertida", para "o mundo do espetáculo".

A Casa 93 apresentará sua primeira coleção para profissionais da moda e à imprensa no dia 9 de julho, em Paris, quatro dias após o término da Semana da Alta Costura. Para a segunda temporada, Gonzalez disse que, graças ao boca a boca, tem muito mais candidatos.

Quanto à sua filial brasileira, cujos alunos criaram até agora oito marcas, Gonzalez explica que com a "crise econômica e o retorno da insegurança" nas favelas, a escola irá para São Paulo para reabrir na segunda metade de 2019.

app-myl/ra/mr/cc/db