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O Brasil negado no Brasil é o que interessa em Cannes, diz cineasta brasileira

A produtora Isabella Nader e os diretores Renee Nader Messora e Joao Salaviza fazem prostesto em Cannes contra o genocídio indígena - AFP/ Valery HACHE
A produtora Isabella Nader e os diretores Renee Nader Messora e Joao Salaviza fazem prostesto em Cannes contra o genocídio indígena Imagem: AFP/ Valery HACHE

Cannes (FRA)

16/05/2018 17h19

"O Brasil negado no Brasil é o que interessa em Cannes", disse nesta quarta-feira (16) a cineasta Renée Nader Messora, ao apresentar seu filme "Chuva e Cantoria na Aldeia dos Mortos", sobre os indígenas Krahô.

Junto com o português João Salaviza (Palma de Ouro de melhor curta-metragem em 2009 por "Arena"), esta brasileira gravou o filme durante nove meses, depois de ter passado longas temporadas com esta comunidade de 3.500 pessoas, no estado do Tocantins.

O filme, que fica entre o documentário e a ficção e está em competição na seção Um Certo Olhar, contou com os membros da comunidade interpretando eles mesmos e falando em seu próprio idioma, o que fez das gravações uma façanha, dado que "ambos só entendiam 5%" do que diziam, contaram à AFP.

A resistência de um jovem Krahô a se tornar xamã após a morte de seu pai - que o leva a partir temporariamente para a cidade - serve como argumento e pretexto para mostrar o dia a dia destes indígenas, suas tradições e cerimônias.

"Os Krahô são responsáveis por seu próprio bioma, mas estão ameaçados, principalmente pela monocultura de soja e cana e pela pecuária", explicou Nader Messora.

Em sua estreia em Cannes, esta cineasta brasileira, casada com Salaviza, destacou a importância de que no maior festival de cinema do mundo "se esteja vendo um filme sobre os Krahô, falado em seu idioma".

Pôster do filme "Chuva e Cantoria na Aldeia dos Mortos" - Reprodução - Reprodução
Pôster do filme "Chuva e Cantoria na Aldeia dos Mortos"
Imagem: Reprodução


Ser indígena é um modo de ser

"Chuva e cantoria na aldeia dos mortos" não é um filme "abertamente ativista, apesar de todo o respeito que temos pelos indígenas no Brasil que estão gravando filmes militantes pondo sua vida em risco", disse Salaviza.

Ambos os diretores buscaram chegar a uma visão mais justa, a seu ver, para abordar a questão indígena no cinema, no Brasil e no mundo.

"Em geral, o indígena é apresentado ou como um profeta, que sai da floresta para dizer duas palavras e desaparece, ou de uma forma mais política, em contraste com a cultura ocidental", disse o cineasta.

Seu filme mostra com naturalidade o modo de vida familiar e social dessa população.

"Não é por usar uma calça ou ter um celular que se deixa de ser indígena. No Brasil esse discurso ocorre entre os poderosos e é muito perigoso", adverte.

"Ser indígena é um modo de ser e não de aparentar", segundo este cineasta.

Ambos os diretores, que vivem entre Portugal e Brasil, filmaram juntos seu primeiro longa-metragem, "Montanha".

"Chuva e cantoria na aldeia dos mortos" é o terceiro filme brasileiro selecionado nesta edição de Cannes. Também se apresentou "O grande circo místico", de Carlos Diegues, na seleção oficial fora de competição, e "Los silencios", de Beatriz Seigner, na Quinzena dos Realizadores.