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Exposição sobre Holocausto em Jerusalém mostra poder e perigo de imagens

Museu do Holocausto, em Jerusalém, em Israel - BBC/Reprodução
Museu do Holocausto, em Jerusalém, em Israel
Imagem: BBC/Reprodução

Jerusalém (Israel)

24/01/2018 18h57

No coração do memorial do Holocausto de Israel, em Jerusalém, fotografias que glorificam Hitler e desumanizam os judeus são exibidas ao lado de imagens angustiantes de guetos judaicos e da libertação dos campos de concentração.

As imagens exibidas no memorial Yad Vashem fazem parte de uma nova exposição que combina fotos tiradas por perpetradores nazistas, vítimas judias e membros das forças aliadas que testemunharam os horrores dos campos de concentração em primeira mão no final da Segunda Guerra Mundial.

A exposição, chamada "Flashes de Memória", abriu nesta quarta-feira, antes do Dia Internacional da Memória do Holocausto, celebrado em 27 de janeiro.

As diferentes perspectivas oferecem um olhar complexo sobre o Holocausto, da propaganda nazista a fotografias que mostram o sofrimento nos campos de extermínio.

"A documentação visual durante o Holocausto moldou a forma como percebemos o Holocausto e o analisamos, e afetou a maneira como foi este foi gravado na memória coletiva", disse Vivian Uria, diretora da divisão de museus de Yad Vashem, que organizou a exposição.

"A câmera e sua força manipuladora têm habilidades de grande alcance para influenciar".

A exposição inclui 1.500 fotos, das quais 450 são exibidas nas paredes, com 17 vídeos. Há também recortes de jornais, cartazes e câmeras.

"Nós projetamos o espaço como uma câmera escura", disse Yossi Karni, da Design Mill, uma empresa envolvida na exposição.

Linhas de fotos ordenadas em paredes pretas trazem à mente o filme em uma câmera, e as paredes arredondadas que separam os espaços interiores fazem alusão à curva da câmera segurando um rolo de filme.

Entre todas as seções há mesas de luz contendo centenas de imagens.

"Nenhuma fotografia é inocente"

A exposição em si é dividida em seções separadas que tratam de diferentes períodos e temas, começando com imagens pré-guerra de alemães glorificando oficiais e valores nazistas, com outras imagens que desumanizam os judeus.

Mais adiante há fotografias da vida nos guetos judeus da Polônia, criados pelos nazistas depois que ocuparam o país, em 1939.

As imagens foram tiradas por fotógrafos alemães oficiais para mostrar como eles estavam usando os judeus para o esforço de guerra enquanto os "reeducavam" para uma vida de produtividade.

Outra seção mostra fotos tiradas em guetos por soldados e civis alemães, que oferecem um vislumbre mais autêntico da vida nos enclaves judeus.

"Queríamos expor o sofrimento, o que realmente aconteceu nos guetos", disse Uria. "A pobreza, a fome, as doenças, a morte".

Os judeus obrigados a colaborar com os ocupantes alemães também tiraram fotografias que mostram a produtividade dos guetos, imagens que buscavam impedir a deportação de judeus para os campos de concentração.

Fotos tiradas secretamente pelos mesmos fotógrafos mostraram a sombria realidade dos guetos.

A última seção da exposição mostra fotos e filmes feitos por soldados soviéticos, americanos e britânicos nos campos de extermínio que eles libertaram.

"Antes de mais nada, lembro-me das filmagens", disse Tomy Shacham, um sobrevivente de Auschwitz que participou da abertura da exposição.

"Foi filmado uma semana depois que os russos chegaram (para libertar Auschwitz), e eu já tinha 11 anos, então eu lembro de tudo".

As imagens foram usadas para mostrar às sociedades ocidentais e comunistas os males do fascismo e como testemunho nos julgamentos dos criminosos de guerra nazistas.

Elas foram inclusive distribuídas entre o público alemão para mostrar a extensão dos horrores, de acordo com Uria.

"Nós queríamos mostrar, 'olhe como essa história começa com a estética, com este espaço final expressando os horrores e o fim da história'", afirmou.

"A propaganda e esse tipo de ideologia trazem este tipo de resultado destrutivo", disse.

A exposição desafia os fotógrafos atuais a considerarem seu trabalho.

É crucial ter em mente "a responsabilidade do fotógrafo - sua perspectiva, posição moral e responsabilidade pelos resultados de suas fotos", disse Uria. "Com a fotografia tão difundida, a questão é: o que você faz com ela?"

Daniel Uziel, chefe da coleção de fotos de Yad Vashem e consultor histórico da exposição, disse que a mostra "não é sobre fotografia durante o Holocausto, e sim sobre o uso da fotografia durante o Holocausto".

"Mesmo hoje, ou talvez hoje mais do que no passado, você deve dar uma olhada crítica nas fotografias", disse, observando que a guerra civil na Síria é um conflito que incluiu a manipulação de imagens.

Uria disse: "não há dúvida - nenhuma fotografia é inocente".