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Dusty e Peche, duas modelos trans desafiam preconceitos em Nova York

14/09/2017 15h04

Nova York, 14 Set 2017 (AFP) - Dusty Rose tenta há um ano dedicar-se a ser modelo em Nova York. Depois de muitas recusas e discriminações, a sorte finalmente lhe sorriu graças a Peche Di, fundadora de uma agência de modelos transgêneros em plena ascensão.

A jovem de 19 anos que nasceu homem, na área rural do Alabama (sul), pulou de alegria quando descobriu o Instagram de Peche e sua agência Transmodels, especializada em transgêneros, fundada em março de 2015.

"Eu disse 'Meu Deus, essa é exatamente a razão pela qual me mudei para Nova York, para encontrar pessoas como ela!", conta a jovem muito magra de 1,85 m de altura, vestida com jeans e camiseta preta e maquiada com capricho.

Apesar de muitas modelos transgênero começarem a ser conhecidas pelo público, como a brasileira Valentina Sampaio, capa da Vogue francesa em fevereiro, a entrada nesse mercado continua repleta de obstáculos e preconceitos.

Isso acontece até mesmo em uma metrópole como Nova York, onde as pessoas transgênero são mais aceitas que em outros lugares, diz Dusty, que mudou sua identidade aos 15 anos, quando ainda estava no ensino médio.

"No dia em que cheguei a Nova York, estava com minha mãe na rua e alguém gritou para mim 'puta!'. Minha mãe disse 'Meu Deus, estamos em Nova York, achava que isso não acontecia aqui'", diz.

Mais tarde, Dusty Rose encontrou emprego em um salão de cabeleireiro.

- "Não quero que me toque" -"Há clientes que dizem 'não quero que isso me atenda, não quero que me toque'", lembra. A situação chegou ao ponto de um dia Dusty se sentir enojada com uma cliente que se negava a se deixar pentear por ela.

Antes de encontrar Peche, Dusty tinha enviado seu currículo para várias agências de modelos, apresentando-se sempre sinceramente como uma jovem mulher transgênero do Alabama. "Não posso mentir, isso é parte de mim", diz.

Mas não teve sucesso e enfrentou muitas críticas, com empregadores lhe dizendo que devia ser mais baixa, mais magra. "Quando se é trans, você é tipicamente maior, não dá para evitar. E além disso, é muito masculina, não é suficientemente feminina", explica.

Com Peche, pelo contrário, Dusty Rose se sentiu bem desde o primeiro encontro, uma sessão de fotos recente em um estúdio de Greenwich Village.

Talvez porque Peche, de 27 anos, também transgênero e nascida na Tailândia, tenha passado pelos mesmos momentos difíceis antes de fundar em 2015 a agência Transmodels, uma das primeiras agências do mundo a se especializar em modelos trasgênero.

Ela trabalha hoje com 19 modelos, principalmente mulheres mas também alguns homens, assim como pessoas que não se reconhecem nem como homem, nem como mulher.

Desde o início do trabalho como modelo na Tailândia há 10 anos, "evidentemente houve um progresso", diz Peche.

"As modelos trans são agora um pouco fashion, mas até recentemente não eram aceitas", lembra.

- Furor contra Trump -Peche cita como exemplo as campanhas para marcas como Nike, Mercedes Benz, a vodca Smirnoff e a L'Oréal Paris, que elegeu Hari Nef como garota propaganda nos Estados Unidos.

Sua própria agência conseguiu em dois anos e meio contratos com empresas muito variadas, de hotéis ao departamento de saúde da cidade de Nova York, passando pela rede de academias Equinox.

Qualquer retrocesso, como a vontade do presidente americano Donald Trump de não aceitar mais pessoas transgênero nas Forças Armadas, a enfurece. "É horrível para os trans", diz. "Tenho a impressão de que o governo não nos aceita. Como vamos sobreviver?".

Peche, que passou toda a infância escondendo seu desejo de ser mulher, espera agora que Trump "termine sendo ejetado" da Casa Branca, e poder continuar com seus projetos a serviço dos trans.

Um deles é o aplicativo de relacionamento entre trans "Teadate", que ela criou logo depois de o popular Tinder bloquear os transgênero, e que hoje reivindica ter 25.000 usuários por dia.

Para a Semana de Moda de Nova York, que termina nesta quarta-feira, seu objetivo é impor a presença de suas modelos na maior quantidade possível de desfiles.

A longo prazo, espera ver suas modelos em campanhas publicitárias que exponham "a beleza" de seus corpos metamorfoseados.

Essa meta é compartilhada com Dusty Rose, que sonha "ser um dia uma 'Angel' da Victoria's Secret", as modelos da famosa marca de lingerie.