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Destruição de cidade histórica no Iraque provoca revolta internacional

06/03/2015 19h21

Bagdá, 6 Mar 2015 (AFP) - A Casa Branca manifestou sua indignação nesta sexta-feira com a demolição "incompreensível" das históricas ruínas na antiga cidade assíria de Nimrod, no Iraque, por parte do Estado Islâmico (EI).

Estamos "profundamente tristes com a incompreensível destruição de objetos históricos, culturais e religiosos no Iraque, incluindo os recentes ataques em Nimrod", declarou o Conselho de Segurança Nacional em sua conta no Twitter.

O governo americano classificou a devastação como um "crime de guerra", mesma expressão usada pelo secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon.

"A destruição deliberada da nossa herança cultural comum constitui um crime de guerra e representa um ataque à humanidade como um todo", declarou Ki-moon, em um comunicado divulgado hoje.

Mais tarde, nesta sexta, estava prevista uma reunião do secretário-geral com a diretora da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), Irina Bokova, para discutir a situação em Nimrod.

Em nota, Irina Bokova também fez menção ao "crime de guerra" cometido pelo EI.

"Condeno nos mais duros termos a destruição do encrave de Nimrod", afirmou Irina, nesta sexta.

"Não podemos permanecer em silêncio. A destruição deliberada do patrimônio cultural constitui um crime de guerra. Faço um apelo a todas as autoridades políticas e religiosas da região que se rebelem contra este novo ato de barbárie", declarou.

A diretora da Unesco disse ter informado o presidente do Conselho de Segurança das Nações Unidas e a procuradora do Tribunal Penal Internacional sobre o assunto, além de ter pedido "ao conjunto da comunidade internacional" que "una esforços" para "deter essa catástrofe".

Segundo Bokova, "a limpeza cultural, da qual o Iraque é objeto, não pára diante de nada, nem de ninguém: tem como objetivo a vida humana e as minorias e é acompanhada da destruição sistemática de um patrimônio milenar da humanidade".

Depois de ter incendiado a valiosa biblioteca de um museu de Mossul em fevereiro, o EI começou na quinta-feira a destruir com escavadeiras as ruínas assírias de Nimrod, anunciou o Ministério iraquiano do Turismo.

O governo de Bagdá acredita que o equipamento de demolição começou a ser levado para a região das ruínas na semana passada.

A joia arqueológica, de valor incalculável, fica 30 km ao sudeste de Mossul, um reduto estratégico para os jihadistas. Em 2014, eles iniciaram uma rápida ofensiva a partir da Síria, assumindo o controle de amplos territórios no Iraque.

"Ainda não sabemos até que ponto a cidade foi destruída", disse à AFP um funcionário do governo que pediu para não ser identificado.

Situadas na bacia do rio Tigre, as ruínas são as vítimas mais recentes do que parece ser uma campanha sistemática dos jihadistas para dizimar o rico legado patrimonial do Iraque.

"Estou arrasado, mas era uma questão de tempo. Agora, estamos esperando o vídeo. É triste", desabafou o arqueólogo iraquiano Abdelamir Hamdani, da Universidade Stony Brook, de Nova York.

A destruição da cidade fundada no século XIII a.C. acontece poucos dias depois de os jihadistas divulgarem um vídeo sobre a destruição de várias esculturas pré-islâmicas.

Uma parte dos impressionantes frisos e estátuas colossais de touros alados com cabeças humanas de Nimrod foi deslocada para vários museus em diversos países ao longo do século XIX.

Em 1988, a descoberta de 613 peças de joalheria, ornamentos e pedras preciosas encontradas em uma tumba real foi considerada uma das maiores descobertas arqueológicas do século XX.



Destruição do patrimônio "O plano é destruir o patrimônio iraquiano", afirmou Hamdani, que acredita que é lógico pensar que o próximo alvo dos jihadistas será Hatra, uma localidade com 2.000 anos e que também está registrada no catálogo da Unesco.

Muito bem preservada, Hatra foi construída com influências helênicas, romanas e também incorporou estilos orientais.

O EI justifica a destruição do patrimônio cultural, alegando que as estátuas podem induzir à idolatria. Já os analistas destacam a hipocrisia do EI. Apesar de criticar as imagens, o grupo não vê problema em vendê-las para colecionadores no mercado negro.

As estátuas destruídas são aquelas imponentes, impossíveis de transportar, segundo os especialistas.

A comunidade internacional condenou com veemência as destruições, mas parece relegada a um papel de simples observador, já que não pode atuar nos territórios controlados pelo EI - lamentou o diretor da Unesco, Stuart Gibson.

"No passado, pressionamos a população local a reconhecer o valor inestimável de seu patrimônio e a necessidade de protegê-lo", disse Gibson.

"Mas, infelizmente, agora as pessoas estão esgotadas e aterrorizadas", afirmou o especialista.

O avanço das tropas iraquianas, com o apoio dos ataques aéreos da coalizão internacional liderada pelos EUA, parece provocar um recuo dos jihadistas, aumentando a possibilidade de salvar o que resta do patrimônio.

Os civis continuam pagando, porém, o maior preço do conflito.

A Organização Internacional para as Migrações (OIM) informou que 28 mil pessoas foram deslocadas esta semana e se uniram aos 2,5 milhões de iraquianos expulsos de suas casas pela violência.