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Britânicos discutem o uso do apóstrofe nos nomes de rua

25/03/2014 10h32

LONDRES, 25 Mar 2014 (AFP) - Para alguns pode parecer uma disputa extravagante, mas a decisão de muitas prefeituras britânicas de suprimir os apóstrofes dos nomes das ruas é encarado como um ultraje em áreas culturais como Cambridge.

A venerável cidade universitária ainda está em choque com o que considera um "ato de vandalismo" cometido no início do ano pelas autoridades locais, decididas a acabar com os apóstrofes e outros sinais de pontuação na nomenclatura das ruas.

Vários governos locais também preferem "Kings Road" (estrada dos reis) a "King's Road" (estrada do rei), apesar da mudança de significado, e justificam o "crime" com diretriz nacional que recomenda suprimir qualquer pontuação empolada.

O objetivo é facilitar o trabalho dos serviços de emergência, para evitar erros fatais, como o que custou este ano a vida de uma adolescente que morreu vítima de um ataque de asma depois que a ambulância seguiu para o endereço errado.

"A pontuação pode ser mal-interpretada por certos programas de informática ou pelo GPS. Conheço pelo menos dois sistemas nos quais seu uso provoca problemas", disse à AFP Tim Ward, responsável pela questão na prefeitura de Cambridge.

Nos Estados Unidos ou Austrália, as autoridades travam a batalha gramatical há algum tempo sem muitos obstáculos, mas no Reino Unido a medida é mal vista pelos protetores da língua inglesa e outros defensores do ponto e vírgula.

Muitos deles saíram às ruas durante a noite para restaurar com marca-textos os sinais ausentes nas placas das ruas.

O prefeito de Cambridge acabou recuando em fevereiro.

"Porque a diretriz nacional foi retirada", disse Tim Ward.

"Bobagem, o que acontece é que estavam envergonhados. Não vi em lugar algum a retirada da diretriz", afirmou Kathy Salaman, diretora da "Good Grammar Company" (a companhia da boa gramática) de Cambridge, a vanguarda do protesto.

Mas o GeoPlace, o organismo público que supervisiona a nomenclatura, insiste que prefere "não receber dados que incluam sinais de pontuação".

"Isto diminui a velocidade da busca e pode ser mal-interpretado pelos computadores", destacou o organismo, que, no entanto, admitiu que a decisão final cabe às autoridades locais.

"É grave", sentencia John Richard, presidente da solene Sociedade Protetora do apóstrofe, que não entende a necessidade de "mudar os nomes e não os computadores".

"É ainda mais incompreensível quando se leva em consideração que os bombeiros, a polícia e as ambulâncias de Cambridge afirmaram que nunca tiveram nenhum problema", disse Kathy Salaman, que sonha com uma "campanha nacional" contra o "vandalismo gramatical".

Para ela, a medida é sintomática de um país em briga com o dicionário, onde a solução é "livrar-se de tudo o que é complicado".

"Depois do apóstrofe, o que vamos suprimir? A vírgula?", questiona, antes de atribuir a culpa às "correntes linguísticas americanas".

"Estamos no caminho errado e nossa língua está em queda por conta da preguiça e ignorância. Como querem que nossas crianças acreditem no professor que tenta ensinar os sinais de pontuação, se elas observam que os apóstrofes foram eliminados das ruas?", completa John Richard.

jk-al/fp