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Europa conhece a tradução de um primeiro romance norte-coreano

01/09/2011 16h23

PARIS, França, 1 Set 2011 (AFP) -Um casal se divorcia. Ela é cantora, ele é operário. Seria um drama conjugal comum, se não fosse o primeiro romance norte-coreano a ser traduzido na Europa. Em francês, "Des Amis", Amigos (Actes Sud), abre uma janela para um dos países mais fechados do mundo.

"É a primeira vez, na Europa, que se toma conhecimento do cotidiano da Coreia do Norte, através das repercussões de um divórcio", comentou para a AFP Patrick Maurus, tradutor do livro de Baek Nam-Ryong publicado em seu país, em 1988.

Foi no alvorecer de uma nova era literária, quando os dirigentes do regime e os operários, heróis obrigatórios dos livros, começavam a ser destronados por juízes, cientistas, o próprio casal, a família...

"Este romance não poderia jamais ser escrito para olhares estrangeiros. Não é uma diatribe contra o regime, não é, também, propaganda, como se entende no ocidente, mas uma ficção literária que se apresenta como tal", insistiu.

Nunca foi permitido penetrar, assim, no coração do país, com exceção de "Coréennes", Coreanas, documentário de Chris Marker, de 1959. Até os coreanos do sul não conhecem os vizinhos do norte.

"A palavra propaganda não é grosseira na Coreia do Norte e os textos devem ensinar a virtude, o que corresponde à tradição confuciana", observou Maurus, também diretor da coleção 'Lettres coréennes chez Actes Sud' e mestre na Escola de Línguas Orientais.

Na Coreia do Norte, o divórcio é um ato social, não um problema da vida privada. Quando a heroína, Soon Hwi, mãe de uma criança, entra com seu pedido, ela sabe que vai causar comoção, e incorrer em uma falta social. O trabalho do juiz será pesar os prós e os contras das dissensões familiares e da perturbação de um divórcio para a sociedade.

Injustiças Investigando, o magistrado vai, no entanto, descobrir injustiças; algumas páginas, críticas contra os dirigentes, valeram aborrecimentos ao autor. Mas ele conseguiu se sair disso explicando como sua denúncia do arrivismo era uma crítica construtiva.

O juiz passou a questionar, também, o seu próprio lar e as pessoas do entorno, percebendo que "a família está longe de ser, hoje, os pilares do país, como é forçada", revela Patrick Maurus.

Patrick Maurus começou a ter contatos com o idioma coreano quando pequeno - seu pai trabalhava em Seúl -, e "encontrou, depois, por acaso, o romance +Des Amis+, numa livraria da Coreia do Sul", contou ele.

Nascido em 1949, Baek Nam-Ryong trabalhou numa fábrica durante dez anos estudando, depois, a arte de escrever na faculdade central Kim Il-Sung. Tornou-se um escritor muito representativo de seu país.

"Quando encontrei o autor em Pyongyang, em 2009, ao lado de seus +amigos+ da Sociedade de Escritores, insistiu muito sobre sua formação operária. Sua criação demonstra isso, por uma dedicação à precisão do vocabulário, aos detalhes", prosseguiu.

No país de Kim Jong-Il, "discute-se com a Associação, jamais individualmente. Assim, o contrato foi assinado bem antes de termos o manuscrito original em mãos".

"Em alguns dias, partirei para a Coreia do Norte para entrevistá-lo. Faz três anos que pedi uma autorização!"