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Quase 30 anos depois, justiça chilena volta a investigar a morte do poeta Pablo Neruda

Pablo Neruda é fotografado se recuperando de suposto ataque da polícia em Cuernavaca, na Cidade do México (29/12/1941) - AP Photo/Arquivo
Pablo Neruda é fotografado se recuperando de suposto ataque da polícia em Cuernavaca, na Cidade do México (29/12/1941) Imagem: AP Photo/Arquivo

02/06/2011 15h43

Santiago, Chile, 2 Jun 2011 (AFP) - A Justiça chilena aceitou, nesta quinta-feira, investigar o falecimento do poeta Pablo Neruda, morto de câncer 12 dias depois do golpe de Estado liderado por Augusto Pinochet, em 1973, mas que pode ter sido assassinado, segundo denúncia apresentada pelo Partido Comunista, informou o poder judicial.

Pablo Neruda deixou registrada em sua obra uma mensagem universal, que lhe valeu, em 1971, o Prêmio Nobel de Literatura. Nascido Neftali Reyes Basualto, em Parral, no sul do Chile, em 12 de julho de 1904, adotou o nome artístico Pablo Neruda antes dos 15 anos, ao criar seus primeiros versos de uma aventura literária que o consagrou como um dos principais poetas de língua espanhola.

Autor de "Odas Elementales", "Estravagario" e "Confieso que he Vivido", seus versos inundaram múltiplas antologias e o levaram a conquistar o Prêmio Nobel, quando ocupava o cargo de embaixador do Chile na França.

Desde seus "20 Poemas de Amor" (1924) até a "Arte de Pajaros", a poesia de Neruda fala de temas eternos, como o cosmos, a água, o ar, as raízes históricas, os problemas sociais e os sonhos dos casais.

Ele já era uma jovem promessa literária em 1927, quando abandonou seus estudos de francês na Universidade do Chile, para percorrer o mundo. Passou por Argentina, Portugal, Espanha, França, Índia, Cingapura, Java e Birmânia, onde foi nomeado cônsul.

Nessas viagens, conheceu sua primeira esposa, a holandesa Maria Antonieta Lagenaar, com quem teve sua única filha, Malva Marina, que morreu oito anos depois.

Após o fim do casamento, em 1935, Neruda conheceu em Madri a pintora argentina Delia del Carril, 20 anos mais velha que ele, durante os longos encontros literários com Federico Garcia Lorca, Rafael Alberti e outros intelectuais espanhóis.

Seu casamento terminou, porém, em 1955, porque o poeta descobriu uma nova musa, a soprano chilena Matilde Urrutia. Com ela iniciou um romance tão clandestino quanto sua clandestinidade política na época, pois seu Partido Comunista havia sido proscrito no Chile e Neruda foi destituído do cargo de senador em 1948.

Preso a um compromisso militante, em 1970 seu partido o proclamou candidato à presidência, mas desistiu da candidatura em favor de seu amigo e líder socialista Salvador Allende.

A obra de Neruda também reflete este compromisso ("Canto General", "España en el Corazon"), atravessando as correntes do pós-modernismo ("Crepusculario"), e do surrealismo ("Residencia en la Tierra"), além do romantismo ("Versos del Capitan").

Pablo Neruda morreu em 23 de setembro de 1973, aos 69 anos, 12 dias depois do suicídio do presidente Allende, durante o sangrento golpe do general Augusto Pinochet, que se instalou no poder até 1990.

Em meio à violência desses dias, a casa do poeta em Santiago foi saqueada. Uma patrulha militar foi até sua casa na praia de Isla Negra, a 100 km a Oeste da capital chilena, com uma ordem de busca para procurar armas.

Reza a lenda que Neruda explicou aos soldados que sua única arma era a poesia. Depois, o poeta entrou numa profunda depressão. Segundo o livro de memórias de Matilde Urrutia, o artista jamais conseguiu se livrar da melancolia, desde o episódio.

Matilde morreu em 1985 e descansa no jardim de Isla Negra, junto ao poeta e sua casa, transformada em museu e que conserva suas coleções de búzios, garrafas e carrancas de proa de barcos, diante das eternas ondas do Pacífico, que uma vez foram comparadas pelo poeta às teclas de um piano.