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Por que as franquias de terror não dão mais medo?

Cena de "Invocação do Mal 2" - Reprodução
Cena de "Invocação do Mal 2" Imagem: Reprodução

Rodolfo Vicentini

Do UOL. em São Paulo

19/01/2018 04h00

Tomar susto é diferente de sentir medo, concorda? E os grandes filmes de terror são justamente aqueles que criam um clima para transmitir medo ao público. Então, por que as franquias de hoje estão apostando mais em sons altos e aparições repentinas do que em um cuidado maior pela abordagem visual?

"Sobrenatural: A Última Chave" chegou aos cinemas nesta quinta-feira (18) seguindo a ideia de que quanto mais sustos, mais assustador -- e acabou desperdiçando uma ótima oportunidade.

O quarto capítulo da franquia, que começou 2010 com o diretor James Wan fugindo de certos clichês do gênero, foca na vida da paranormal Elise Rainier. A trama segue uma trajetória esperada -- e divertida até metade do filme --, mas uma reviravolta facilmente contornável acontece, e a partir daí parece que tudo se perde entre os próprios demônios.

A atriz Lin  Shaye já se incorporou ao papel da experiente médium, e ao lado de sua equipe (a parte cômica do filme, que funciona muito bem, por sinal), precisa voltar à casa em que foi criada e onde viu sua mãe sendo morta por uma entidade sinistra. Entre alguns momentos de tensão e personagens criativos, o filme escorrega justamente na necessidade de provocar sustos. O expectador absorve a tensão do susto e não do medo, sem contar que muitas vezes a cena é tão rápida que nem é possível entender o que está acontecendo na tela.

Cena do filme "Sobrenatural 4: A Última Chave" - Reprodução - Reprodução
Cena do filme "Sobrenatural 4: A Última Chave"
Imagem: Reprodução

Muitos outros filmes de terror acabam seguindo esse mesmo caminho, e quanto mais episódios uma franquia tem, pior fica. "Atividade Paranormal" fez sucesso em 2007 por ser considerado um dos filmes mais assustadores da história sem mostrar absolutamente nada, apenas criando um ambiente de expectativa que nunca chega a lugar algum. 

Agora já no quinto, sexto ou sétimo capítulo da franquia -- todo ano pinta mais um e você só descobre quando vê o cartaz no cinema --, a qualidade despencou muito. Olhos revirados, as mesmas câmeras absurdamente resistentes registrando tudo e gritos atrás de gritos compõem as novas produções.

Fora das franquias, os últimos anos foram recheados de bons filmes de terror que não custaram centenas de milhões de dólares, mas que foram orquestrados de forma com que os chavões ficassem de lado e que realmente o medo predominasse. 

Filmes que realmente dão medo

Cena do filme "A Bruxa" - Reprodução - Reprodução
"A Bruxa"
Imagem: Reprodução

. "A Bruxa"

Século 17, região rural dos Estados Unidos, bruxas, magias negras e um grande bode chamado Black Phillip. O assustador filme custou apenas US$ 4 milhões e arrecadou dez vezes o valor. A incrível Thomasin, que se vê cercada de mistérios e culpa pelo desaparecimento do irmão, decide se entregar ao desconhecido para realizar todos os seus desejos mais sórdidos, voando como as bruxas que o pintor espanhol Francisco de Goya tirou de sua mente. O diretor/roteirista Robert Eggers tratou com maestria o ambiente pavoroso e os personagens misteriosos, acertando até na escolha do dublador para o demoníaco bode.

Bill Skarsgard interpreta Pennywise no remake de It: A Coisa - Brooke Palmer/Warner Bros - Brooke Palmer/Warner Bros
Bill Skarsgard interpreta Pennywise no remake de It: A Coisa
Imagem: Brooke Palmer/Warner Bros

. "It: A Coisa"

A nova adaptação da obra de Stephen King ensinou como dar susto sem subir som -- lembra de Pennywise perseguindo Ben na biblioteca? O diretor Andy Muschietti --que já havia mostrado talento com o curta "Mama" e que chamou a atenção de Guillermo del Toro -- ganhou pontos com a imagem aterrorizante do protagonista e não poupou temas pesados para dissecar a primeira parte do livro -- a mão do palhaço seguindo o pobre George para puxá-lo ao esgoto é certeira.

Cena do filme "Corra!" - Divulgação - Divulgação
Cena do filme "Corra!"
Imagem: Divulgação

. "Corra!"

Não é à toa que Jordan  Peele está cotado para concorrer ao Oscar e foi indicado ao Globo de Ouro e ao prêmio do Sindicato dos Diretores. O filme lançado no início do ano passado -- com uma atuação brilhante de Daniel Kaluuya -- acerta na boca do estômago ao falar sobre racismo e cultos tétricos. A produção dribla vários clichês dos filmes de terror e transforma sua cabeça em uma pilha de nervos.

 

Susto atrás de susto

Cena do filme "Invocação do Mal 2" - Divulgação - Divulgação
Imagem: Divulgação

. "Invocação do Mal 2"

Já que no primeiro "Invocação do Mal" James Wan fez jus à fama que recebeu por "Jogos Mortais" -- que também se perdeu após o filme original --, por que ele erraria na sequência? Pois é, mas acabou errando. A freira demoníaca funcionou pelo marketing -- tanto que vai até estrelar um filme solo ainda neste ano --, mas não dava medo e as cenas com o auxílio de computação gráfica não funcionaram nada bem.

Pôster do filme "Annabelle 2" - Divulgação - Divulgação
Pôster do filme "Annabelle 2"
Imagem: Divulgação

. "Annabelle 2: A Criação do Mal"

A boneca medonha apareceu pela primeira vez em "Invocação do Mal" e ganhou até filme próprio. Ou melhor, dois. O sucesso do primeiro, que já é esquecível, piorou ainda mais na sequência, quando todos os jargões do gênero estão lá: crianças, uma tragédia, um poço fundo, uma boneca possuída e aquela pausa na trilha sonora antes de você pular da cadeira e não entender nada. Mesmo assim, o filme arrecadou 15 vezes mais do que custou.

Cena do filme "Atividade Paranomal: Marcados pelo Mal" - Reprodução - Reprodução
Cena do filme "Atividade Paranomal: Marcados pelo Mal"
Imagem: Reprodução

. "Atividade Paranormal: Marcados pelo Mal"

Falando de um falamos de quase todos. "Atividade Paranormal" foi um sucesso e com merecimento. Claro que a galinha dos ovos de ouro estava nascendo e uma série de filmes com a mesma pegada foi brotando nos cinemas. Em "Marcados Pelo Mal", gritos desnecessários, movimentação da câmera enjoativa, manchas na tela (as temidas "aparições") e o final para resgatar ainda algum detalhe do enredo original -- só para ter aquele gancho -- definem o filme.