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Chalita lançará "Rei Leão brasileiro" em Hollywood: "Política não motiva"

O escritor Gabriel Chalita, presidente da Academia Paulista de Letras - Isadora Brant/Folhapress
O escritor Gabriel Chalita, presidente da Academia Paulista de Letras Imagem: Isadora Brant/Folhapress

Do UOL, em São Paulo

17/04/2017 04h00

Devorador de Homem-Aranha, Hulk, Thor e Quarteto Fantástico, o futuro escritor Gabriel Chalita lia tudo o que conseguia encontrar da lenda dos gibis Stan Lee. Hoje, ele se prepara para lançar em Hollywood um livro em quadrinhos que será transformado em uma animação ambientada na selva amazônica. Será uma espécie de “O Rei Leão tupiniquim”. Pixar e Disney já estariam interessadas.

Informação demais? “Fui procurado pelo Frederico Lapenda [produtor brasileiro que vive em Los Angeles]. Ele havia lido o meu livro "A Ética do Rei Menino" e disse que estava procurando um escritor com esse perfil para participar de um projeto com ele e o Stan Lee”, diz Chalita ao UOL, sem revelar valores do projeto. O contrato, sigiloso, foi assinado no ano passado em Los Angeles.

Autor de quase 50 livros, entre romances, títulos jurídicos, pedagógicos, filosóficos e até de poesias combinadas a receitas de chef, ele concebeu a trama a pedido de Lee em apenas um mês. Os personagens: um macaco, uma tartaruga, uma vitória-régia e um pássaro uirapuru, que unem forças para combater um vilão usurpador com planos destruir a floresta.

A inspiração veio de viagens feitas à Amazônia quando Chalita ainda se dizia motivado por política. Alvo de delação envolvendo caixa 2 na Lava Jato, o ex-vice-prefeito de São Paulo, que nega a acusação, atualmente não é investigado em nenhum inquérito e nem foi citado na lista do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que colocou 108 nomes na berlinda.

“Hoje a política está muito estranha. Confesso que não tenho muito entusiasmo para essa política que está aí. Ainda esta semana, fui procurado para escrever um musical sobre uma grande cantora brasileira. Vou aceitar. Isso me motiva.”

Os produtore Terry Dougas e Frederico Lapenda, o quadrinista Stan Lee e o escritor Gabriel Chalita se juntam para produzir uma graphic-novel ambientada na Amazônia - Eddie Sakaki/Divulgação - Eddie Sakaki/Divulgação
Os produtores Terry Dougas, Frederico Lapenda, o quadrinista Stan Lee e o escritor Gabriel Chalita
Imagem: Eddie Sakaki/Divulgação

UOL - Como um projeto com o Stan Lee foi parar na sua mão?

Gabriel Chalita - Fui procurado pelo Frederico Lapenda. Ele havia lido o meu livro "A Ética do Rei Menino" e disse que estava procurando um escritor com esse perfil para participar de um projeto com ele e o Stan Lee. Disse que havia lido vários autores brasileiros e que havia gostado muito da minha narrativa. Falou de detalhes do meu livro, da descrição das personagens e me perguntou se eu aceitaria fazer um argumento de uma história ficcional que se passasse na Amazônia.

Stan Lee, Terry Dougas e o Frederico Lapenda haviam decidido fazer um projeto sobre a Amazônia. Era preciso mostrar ao mundo a beleza e a riqueza dessa grande floresta. Eles me lembraram do que foi o "Rei Leão" para a África. Queriam esse conceito para a nossa história. Pedi uns 30 dias e escrevi o argumento. Uma história de super-heróis que se passa na Amazônia. Expliquei as personagens, a trama, o antagonista e o possível desfecho. Enviei. Eles leram. Aprovaram. E marcaram uma reunião comigo em Los Angeles. Saí de lá com o contrato assinado. E um grande projeto que começa com a primeira história de uma saga que acontece na Amazônia.

Em que fase está o projeto?

O texto está pronto. Agora é uma fase que não é tão simples que é a aprovação das ilustrações para o livro. Esperamos que o lançamento do livro ocorra ainda este ano. Do livro, virão os outros projetos.

Você já tinha algum esboço da história? O que te inspirou?

Não tinha nenhum esboço. Ouvi o Lapenda e fiquei imaginando que tipo de história me daria prazer em escrever e, ao mesmo tempo, tivesse as características que marcam a genial trajetória do Stan Lee. Já fui muitas vezes à região amazônica. Lancei livros. Dei palestras. Conheci projetos. Então, fiz o argumento baseado nas emoções que já vivi naquela imensidão verde. Nos barcos deslizando no grande rio. Nas conversas que tive com a população que vive lá. Depois do encontro em Los Angeles, voltei para a Amazônia e fiquei alguns dias por lá. Por exemplo, um dos super-heróis da história, que é o uirapuru, nasceu de uma conversa com um nativo que, no final de uma tarde, me disse: "Silêncio, o uirapuru está cantando. Quando ele canta, toda a floresta presta atenção". Eu achei aquilo tão incrível. Depois escrevi a história e enviei para eles.

Você afirmou que encontrar o Stan Lee foi mágico. O que ele te disse?

Foi realmente mágico. Ele tem uma energia diferente. O olhar. A atenção. Os detalhes. A emoção. Falamos sobre o processo criativo. Sobre as personagens que pedem para nascer. Ele quis saber como me tornei escritor. Eu fui explicando. Contei do asilo que frequentava quando morava em Cachoeira Paulista. Das conversas com uma professora aposentada, Dona Ermelinda. De como ela me incentivou a ler e a escrever. Dos primeiros rabiscos. E ele pedia mais detalhes. “Como era o asilo?”; “Qual a vista que vocês tinham de lá?”; “Como era a dona Ermelinda?” Parecia que ele, ao me ouvir, queria compor um cenário.

Depois falamos dele. Do seu entusiasmo. Com mais de 90 anos, ele me disse que este nosso projeto precisa ajudar o mundo a refletir sobre a tolerância entre as pessoas e os cuidados com o meio ambiente. A floresta tem que ser esse palco. As emoções da história precisam ajudar as pessoas a aprender que é possível viver as diferenças sem agressões. Há espaço para todos.

Saí da longa conversa ainda mais fascinado por ele. Sua simplicidade. Sua juventude acumulada. Um homem movido a sonhos. Alguns de seus personagens, como o Homem-Aranha, ele fez contrariando equipes e pesquisas. Achavam que aranha era uma animal muito asqueroso para ser personagem de HQ. Ele insistiu. "Ele queria nascer. O Spiderman queria nascer". E nasceu. Stan Lee é um grande empreendedor. Objetivo. Fazedor. Mas é, antes de qualquer coisa, um sonhador.

Será um filme ecológico?

Certamente. Mas não é didático. Não é uma aula sobre a Amazônia ou sobre como proteger o meio ambiente. É uma ficção. O vilão Lamal quer destruir a floresta. O seu maior poder é a dissimulação. Ele confunde os animais que acabam entrando em guerra. Há seres que vivem além das nuvens e que são o objetivo de Lamal: pôr fim em tudo. Paralelamente a isso, é possível conhecer um pouco a vida dos peixes, das árvores —algumas são falantes—, das aves. Os super-heróis são a vitória-régia, o uirapuru, o macaco uacari e a tartaruga. Há um boto que tem um papel central na história.

O que você lia de quadrinhos você quando era garoto?

Desde as experiências com a Dona Ermelinda, tornei-me um leitor constante e aberto. Li e leio muito. Do Stan Lee colecionava tudo. Jamais imaginaria conhecê-lo. Senti uma emoção parecida quando lancei três livros com o Maurício de Sousa. Lia tudo da Turma da Mônica. Quando assinamos o contrato, olhei para o Maurício e agradeci a Deus por aquele presente. Imagine quando abracei o Stan Lee. Quando recebi dele um desenho da Amazônia com a sua assinatura e os nossos nomes. Ele assinou quatro. Um para cada um de nós (Stan, Lapenda, Terry e eu).

Estamos vendo o início do fim da sua carreira política?

A literatura e a educação fazem parte de toda a minha vida. A política é um instrumento de realizar sonhos ajudando muita gente. A verdadeira política é uma abnegação. Você deixa de lado muitos projetos individuais para trabalhar pelo coletivo o tempo todo. Mas hoje a política está muito estranha. Confesso que não tenho muito entusiasmo para essa política que está aí. Ainda esta semana, fui procurado para escrever um musical sobre uma grande cantora brasileira. Vou aceitar. Isso me motiva. Entrar em uma sala de aula me motiva. Dar palestras, também. A política já me motivou mais.

Foi uma honra ser secretário da Educação do Estado e do município de São Paulo. Sei que muitos projetos que implementei serviram de exemplos para outros estados e países, como o programa "Escola da Família" e "A escola de tempo integral". Meu trabalho no parlamento também foi gratificante. Presidir a comissão de educação da câmara dos deputados, enquanto escrevíamos o Plano Nacional de Educação, possibilitou-me colocar na lei muitas ideias que já defendia em meus livros. Não gosto, portanto, de falar mal da política. Não é bom. Precisamos de renovação. De gente inquieta e correta. De jovens que tenham uma postura ética e um tema de vida.