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A carreira brilhante de Edward e Bella depois da Saga Crepúsculo

Roberto Sadovski

06/12/2017 05h57

No começo de 2004, visitando as filmagens de Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban, eu conversei com o jovem trio de protagonistas sobre os planos para o futuro. Naquele momento, a manutenção de Daniel Radcliffe e seus colegas na série do bruxo inglês ainda era uma incógnita. Emma Watson e Rupert Grint, talvez bem treinados pelos assessores do estúdio, foram vagos sobre sua permanência nos filmes. Radcliffe, entrando na adolescência, não hesitou. "Claro que eu quero trabalhar em todos os filmes", respondeu, incisivo. "Imagine, eu terei uma série de sucesso no currículo, trabalhando com os melhores cineastas do mundo, e ainda serei muito jovem, com minha carreira inteira pela frente." O fato é que não só o jovem astro estava certo, como o mundo torcia para que o trio, simpático e talentoso, encontrasse espaço no cinema pós-Harry Potter.

Com Crepúsculo, porém, a coisa não foi bem assim. Desde sua concepção, a adaptação da "saga" escrita por Stephenie Meyer foi acompanhada de um certo escárnio por parte dos fãs de cinema – não sem motivo, já que todos os filmes da série são deploráveis. Ao contrário dos meninos de Harry Potter, porém, o casal central da história, interpretados por Robert Pattinson e Kristen Stewart, foram colocados no olho de um furacão midiático em que a dupla – que por um breve momento foram namorados do lado de cá das câmeras – teve cada movimento acompanhado, analisado, explorado e escancarado, não raro por um braço mais sensacionalista da mídia. O vampiro Edward Cullen e sua amada, Bella Swan, pareciam estar fadados à ridicularização e ao esquecimento, mesmo com os milhões amealhados pela saga. Nada desprezíveis 3,3 bilhões de dólares nas bilheterias mundiais dos cinco filmes.

Kristen Stewart em Personal Shopper

A Saga Crepúsculo foi encerrada em 2012, com a segunda parte de Amanhecer – eu falei sobre o filme aqui. E, então, algo curioso aconteceu. Pattinson e Stewart poderiam aproveitar os muitos milhões que faturaram com os filmes e tocar a vida longe dos holofotes. Outra opção seria se manter no jogo dos blockbusters e continuar a trabalhar como "astros de cinema" (ela bem que tentou, com Branca de Neve e o Caçador). Mas os atores foram, aos poucos, abraçando projetos de diretores pouco convencionais em filmes arriscados e estranhos. Ao longo do caminho, cresceram como intérpretes e foram muito além da mesmice que os acompanhou durante a Saga. A impressão é que tanto Robert Pattinson quanto Kristen Stewart não fizeram mais do que cumprir um contrato, breve e lucrativo, mas que os deixou livres para abraçar seu ofício com um olhar menos comerciais e mais artístico. Bom pra eles!

Uma espiada na carreira de Kristen Stewart, por exemplo, sugere uma jovem atriz dedicada a encarar papéis complexos em filmes diversos. Em 2012 ela pez parte do elenco da adaptação de Jack Keruac, Na Estrada, sob direção de Walter Salles. E não parou de trabalhar. Em 2014 ela esteve em três ótimos filmes: Para Sempre Alice, ao lado de Julianne Moore; o drama Marcados Pela Guerra; e o interessante Acima das Nuvens, com Juliette Binoche. No ano seguinte ela fez a ficção científica esquisita Quando Te Conheci, o drama Anestesia e a tentativa de comédia de ação American Ultra. Se 2016 a atriz fez uma quase obrigatória parada na estação Woody Allen (Café Society), além do pouco visto Certain Women (com Michelle Williams e Laura Dern), este ano Kristen brilhou no excelente Personal Shopper, que anda pipocando em diversas listas de melhores filme de 2017. Em comum, suas escolhas primam por um cinema menos bombástico e mais independente, longe das amarras dos grandes estúdios e trabalhando com elencos e criadores talentosos que só a fazem crescer como profissional.

Robert Pattinson em Bom Comportamento

O caso de Robert Pattinson é ainda mais radical – e muito mais bacana! Aos 31 anos, ele emendou o final de Crepúsculo com uma curiosa parceria com o diretor David Cronenberg. Com ele fez o estranhíssimo Cosmópolis (2012) e o intenso Mapas Para as Estrelas (2014). É fato que Cronenberg queria Pattinson para uma refilmagem de seu próprio A Mosca – e é fato que o estúdio deu para trás ao exigir um corte de 5 milhões de dólares de um orçamento já enxuto. The Rover – A Caçada, com Guy Pearce, é um daqueles papéia para se aplaudir de pé, ao passo que Rainha do Deserto foi uma tentativa nem sempre bem sucedida do lendário Werner Herzog em colocar o ator no papel do igualmente lendário Lawrence da Arábia, num filme centrado na arqueóloga e escritora Gertrude Bell, papel de Nicole Kidman. Se pouca gente viu o excelente Z: A Cidade Perdida (de James Gray, com Charlie Hunnam e Tom Holland), talvez ainda seja possível pescar em algum cinema pelo Brasil o suspense Bom Comportamento, que, olha só, também anda ilustrando algumas listas de melhores filmes do ano.

Tanto Robert Pattinson quanto Kristen Stewart poderiam, em sua carreira pós-Crepúsculo, continuar no caminho dos blockbusters que garantiria seus nomes no topo das marquises, cheques mais e mais vistosos e uma vida paralela como celebridades. Mas é claro a essa altura que nenhum dos dois planejou seu trabalho como atores dessa forma. A fantasia romântica que misturou vampiros, lobisomens e o bebê mais bizarro da história do cinema (ah, Renesmee, já faz assim tanto tempo?) parece ter sido apenas um degrau para conquistar independência artística e financeira – o próprio Pattinson me disse, durante a Comic Con de San Diego em 2011, que passou os anos depois de Harry Potter (ele fez o bruxo Cédrico, morto por Voldemort) torrando cada centavo que ganhou em Hogwarts. Nenhum deles faz a mínima questão de "vestir" o manto de estrela de cinema. Talvez, neste planeta estranho chamado Hollywood, existam mesmo artistas focados não em fama e fortuna, mas na melhor maneira de crescer como profissionais em projetos que eles possam ter orgulho. Edward e Bella, aparentemente, tiveram seu final feliz. E alguém sabe por onde anda Taylor Lautner?

Sobre o autor

Roberto Sadovski é jornalista e crítico de cinema. Por mais de uma década, comandou a revista sobre cinema "SET". Colaborou com a revista inglesa "Empire", além das nacionais "Playboy", "GQ", "Monet", "VIP", "BillBoard", "Lola" e "Contigo". Também dirigiu a redação da revista "Sexy" e escreveu o eBook "Cem Filmes Para Ver e Rever... Sempre".

Sobre o blog

Cinema, entretenimento, cultura pop e bom humor dão o tom deste blog, que traz lançamentos, entrevistas e notícias sob um ponto de vista muito particular.