Desiludida com o Brasil, Nana Gouvêa estuda Shakespeare
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Sou um grande entusiasta de Nana Gouvêa. Uma mulher sem papas na língua, que desde os anos 90 vive no imaginário popular e segue sua jornada sem fazer maiores concessões.
Atualmente vivendo em Nova York, para onde foi em busca do sonho americano e da carreira internacional, a atriz conversou comigo na estreia de um novo segmento da Coluna Chico Barney: "Conversas Republicanas" trará sempre ao prezado leitor uma valorosa troca de ideias com figuras mitológicas do nosso panteão tropical.
Nana conversou a respeito de novos projetos, a carreira internacional da cantora Anitta, política, Shakespeare e ainda revela o que motivaria seu retorno ao Brasil. Prestigie.
"Desde que me dou por gente, o Brasil tá em crise"
Nana Gouvêa está morando fora do Brasil desde 2011. O exílio autoimposto me deixou curioso sobre os sentimentos da atriz em relação aos momentos difíceis que o país vem atravessando.
Coluna Chico Barney - Tem se atualizado sobre as questões do Brasil?
Nana Gouvêa - Um pouco, bem pouco mesmo. Tenho estado mesmo é muito ocupada com trabalho e família. Mal tenho tempo para mim mesma.
O que acha do conturbado momento político que estamos atravessando?
Desde que me dou por gente, o Brasil tá em crise. É péssimo! A população é quem sofre muito, os políticos não receberam a punição merecida. Tudo muito triste, revoltante e embaraçoso. O fato de não poder contar com o seu governo é inacreditável e inaceitável!
Qual projeto faria você voltar ao Brasil?
Um bom filme ou uma minissérie, até mesmo uma novela. Mas o mais importante: um bom personagem.
"O povo americano é absolutamente racista e preconceituoso"
O momento político dos Estados Unidos também é bastante delicado. A opinião de Nana sobre o novo presidente era um dos assuntos que mais me interessavam nesse papo, e certamente não me decepcionei com a visão da atriz.
Como é ser uma imigrante nesses primeiros meses de governo Trump?
Na realidade prática, minha vida não mudou. O povo americano é absolutamente racista e preconceituoso, isso pra mim não é novidade nenhuma. Venho testemunhando isso desde quando vim morar aqui, seis anos atrás. Eles realmente se acham melhores que o resto do mundo. Eles simplesmente passaram a agir, a partir da eleição do Trump, como se não precisassem mais disfarçar a arrogância e preconceito deles. E como se o fato de o Trump ter sido eleito desse a eles o direito de serem bullies, sem a necessidade de se desculparem por isso. Para os imigrantes ilegais, a situação é bem séria. Muitos estão sendo deportados e humilhados. Mesmo os que tinham direito a anistia estão em risco de perdê-la. Uma boa parte já perdeu.
O que você acha da forma como o terrorismo tem sido tratado pelo novo governo?
Acho parcial. Trump protege os países com os quais ele tem negócios, como Arábia Saudita, por exemplo, mesmo sendo países "exportadores" de terrorismo. E por outro lado, proíbe a entrada de pessoas de outros países que, de acordo com ele, são tidos como ameaça. Eu acho as medidas dele ineficientes, preconceituosas, regadas a interesse próprio, ineficazes e o pior, muito injustas.
Já se viu em algum momento de perigo iminente, seja por conta de ameaças internas ou externas nos EUA?
Não, nunca.
Você acha que Donald Trump corre algum risco de sofrer impeachment, a exemplo do que ocorreu no Brasil?
Dificilmente. A estrutura política americana é diferente da nossa. Mesmo com todas as evidências de crimes eleitorais, mesmo com ele escondendo seus impostos, mesmo ele sendo investigado pelo FBI, impeachment hoje parece improvável.
"Agora tô estudando Shakespeare"
Nana Gouvêa é a estrela principal de "Black Wake", ao lado do decano ator Eric Roberts, irmão de Julia Roberts. O filme de zumbis teve um primeiro teaser publicado no YouTube há quase 2 anos e o público ficou sabendo de poucas novidades desde então. Conversamos sobre o status desse projeto e também a respeito de suas próximas incursões na sétima arte.
Você pode contar quais fatores estão levando a essa demora do aguardado filme "Black Wake"?
Sim, claro! Inicialmente, "Black Wake" foi escrito na forma de curta-metragem. Mas o script era muito bom e tinha muito potencial para se tornar um longa. Depois de terminarmos as filmagens do primeiro script, quando o filme já estava editado e a caminho de receber os efeitos especiais, já havia uma demanda enorme de distribuidores querendo comprar o filme. O produtor Carlos Keyes, o diretor Jeremiah Keep, o autor da versão curta Jerry Janda e eu, Nana Gouvêa, trabalhamos por meses a fim de refinar nossas novas ideias e então "Black Wake" evoluiu para o que está sendo preparado hoje.
Depois escolhemos nomes fortes para encabeçar o projeto como Tom Sizemore ("Nascido em 4 de Julho"), Jonny Beauchamp ("Nerve: Um Jogo Sem Regras"), Chuck Zito ("Sons of Anarchy"), Vincent Pastore ("Sopranos"), J.W. Cortez ("Gotham"), Rich Graff ("Law & Order: Criminal Intent"), Kelly Rae LeGault ("John Wick: Chapter 2", onde viveu a personagem Switchboard Operator #2), Brett Azar ("Jessica Jones") e dezenas de outros atores que nem dá para citar aqui, para dar vida aos nossos personagens.
Escolhemos e treinamos centenas de atores para fazerem os zumbis. Tivemos que contratar um novo produtor para dar conta de encontrar os novos cenários internos e/ou construí-los, locações externas, providenciar autorizações das cidades --o filme foi filmado em Nova York, New Jersey e Connecticut. Os atores de nome, como os citados acima, todos têm uma agenda muito complicada, foi dificílimo conseguir conciliar agendas a fim de fazer as filmagens funcionarem. Eu mesma estou com tempo limitado ultimamente porque estou filmando uma série japonesa que consome bastante do meu tempo.
O filme mudou, cresceu. Agora estamos trabalhando na trilha sonora, correção de cor, som, efeitos especiais, produção de posters, enfim, é um trabalhão! Mas "Black Wake" está quase pronto. Eu prefiro não prometer uma data de lançamento, mas me parece que sai em alguns meses, ainda esse ano, se Deus quiser!
Assista ao teaser de "Black Wake" que deixou os distribuidores animadíssimos (em inglês):
Quais são os próximos projetos como atriz?
Fiz uma detetive no filme "House Rules", que teve o nome trocado para "Blood Circus", que está em processo de finalização também. Sou parte do elenco fixo da série de "Otona No Kiso Eigo", onde faço Isabella, na temporada 6. [A série] do Canal NHK do Japão está no ar todas as terças-feiras até 2018. E agora que meu trabalho como atriz para "Black Wake" já terminou, comecei a me preparar para o meu próximo longa, "Killer Response", também com o ator Tom Sizemore, entre outros. Tenho um outro filme para gravar em setembro, onde farei uma médica muito bem-sucedida, chefe de um pronto-socorro, mas não posso anunciar ainda. Tenho realizado um trabalho bem diferente em cada uma dessas produções. Definitivamente, gosto muito de criar novos personagens. São completamente diferentes uns dos outros. Espero que gostem, espero que vejam. Fora o trabalho, continuo meus estudos na língua inglesa, agora tô estudando Shakespeare.
O que você está estudando sobre Shakespeare?
O meu estudo é focado na linguagem, na forma de falar, nas palavras shakespearianas que não fazem parte do vocabulário comum do inglês cotidiano, no ritmo da fala shakespeariana. Enfim, é um trabalho específico para atores que trabalham com o mercado de filmes, TV e teatro falados em inglês de forma clássica.
Tem alguma peça do Shakespeare preferida?
Ainda não, estou no começo do estudo e acho que preciso de mais tempo pra poder escolher a minha peça preferida.
Qual personagem dele você gostaria de fazer?
Não sei te responder essa pergunta ainda, me dá uns meses e eu te digo. Rsrsrs
Você foi abordada por olheiros de uma grande agência de modelos em Nova York. Pode contar mais a respeito?
Eu estava numa festa, uma das convidadas me abordou, se apresentou como agente de modelos e começamos uma conversa. Trocamos contato, marquei uma reunião no escritório dela, fui. Gostei dela, da proposta de fazer parte do casting. Ela até já me mandou para um teste muito bacana, que eu não pude ir porque estava em estúdio trabalhando no ADR de "Black Wake". (Nota da Coluna: ADR é a sigla para Automatic Dialogue Replacement, processo de redublagem para corrigir problemas de áudio em cenas de filmes) Enfim, não há promessas de nada, mas estou aberta às possibilidades. O tempo dirá no que isso vai dar. O bacana é que ela entende que a minha prioridade é o meu trabalho como atriz e me apoia nisso.
“A Anitta não é do meu tempo”
Anitta é outra brasileira que também está batalhando por uma carreira internacional. Há mais tempo na labuta, quis saber qual era a visão de Nana sobre a ousada movimentação da cantora.
Você gosta do trabalho da Anitta?
Minha filha me mostrou uns vídeos dela no YouTube, quando eu vim morar em Nova York em meados de 2011. Ela ainda não tinha acontecido por aí, então vamos dizer. assim, que ela não é do meu tempo e eu não tive oportunidade de curtir o som quando morava aí. E aqui fiquei muito absorta na cultura americana. Mas eu gostei! Achei Anitta muito bonita e corajosa, acho que tem qualidade no trabalho. E apesar de não acompanhar o sucesso dela aí no Brasil, eu sei que existe e é concreto. Do contrário, minha filha não seria fã. Respeito muito quem trabalha duro e conquista seu espaço! Ela tem todo meu respeito e é sempre ótimo ter mais um brasileiro fazendo e acontecendo, assim como Rodrigo Santoro, Wagner Moura, Morena Baccarin, Alice Braga, Sônia Braga. Desejo a Anitta toda sorte e sucesso!
Tem alguma dica para passar para ela sobre como conquistar espaço no exterior?
Acho que não precisa de dica minha nenhuma, me parece que ela sabe muito bem o que está fazendo e não sou nenhuma expert em carreira musical.
“O humor americano não me convence”
Alguns elementos do teaser de "Black Wake", além de uma série de interpretações dramáticas de monólogos no YouTube, foram recebidos como humor involuntário por parte de seus detratores. Mal sabem eles que Nana é escolada na arte de fazer rir, assim como também vem aprimorando cada vez mais seus dotes dramáticos.
Você fez muitas participações em humorísticos na TV brasileira. Se considera uma pessoa engraçada?
Olha, o único humorístico que eu trabalhei no Brasil foi a "Turma do Didi". Trabalhei com Renato Aragão por dois anos e meio. Foi incrível --ele é incrível! Aqui, meus colegas de trabalho e professores dizem que eu sou muito engraçada mas, ironicamente, tenho conseguido trabalho mesmo para papéis dramáticos, então não sei. Talvez eu seja engraçada, rsrs.
Quem são seus ídolos no humor?
Não sou muito de assistir comédia, não, viu? Mas já que você perguntou, vou dizer Renato Aragão. Eu amava o Didi quando eu era criança e trabalhar com ele me fez amá-lo ainda mais.
Acompanha a cena dos bares de comédia em Nova York?
Não. Definitivamente! O humor americano não me convence, em muitos casos as piadas são de mau gosto, sem graça nenhuma e ofensivas.
No vídeo abaixo, Nana interpreta Leah, personagem de "Like Dreaming, Backwards", sobre o suicídio de uma jovem estudante
As séries de TV americanas vivem uma fase de ouro. Quais você está assistindo?
Agora, agora, estou assistindo "The Handmade's Tale" e "House of Cards", mas praticamente assisto tudo!
Qual sua favorita?
"Game of Thrones" é imbatível!
"Não faço a menor ideia"
Entre 1996 e 2010, Nana protagonizou diversos ensaios inesquecíveis nas principais publicações masculinas do Brasil. Revistas como "Playboy", "Sexy" e "VIP", além de sites como Paparazzo, foram enobrecidos pela luminosa presença da atriz ao longo do período.
Desde sua mudança para os Estados Unidos, o mercado para esse tipo de entretenimento mudou radicalmente no país e no mundo. O assunto não pareceu despertar o interesse de minha interlocutora.
Como vê o atual momento desse filão editorial?
Não faço a menor ideia. Isso está tão distante da minha realidade atual, não sei o que está acontecendo realmente. Tô por fora.
Chegou a conferir alguma edição da "Playboy" brasileira em sua nova encarnação?
Não. Não vi, desculpa. Não tenho ideia.
Dentre os ensaios que você fez, qual seu preferido?
Huuuummmm, não sei. Achei todos lindos.
***
Fiquei ainda mais fã de Nana Gouvêa depois desse elucidativo bate-papo. Não se abstenha de dizer o que achou da estreia de "Conversas Republicanas", o talk show da Coluna Chico Barney.
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