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Cartazes retirados e ameaça de extinção: os golpes à Ancine em 2019

Guilherme Machado

Do UOL, em São Paulo

04/12/2019 14h03

Mais uma polêmica envolvendo a Ancine (Agência Nacional de Cinema) foi deflagrada nessa semana, quando, segundo o jornalista do jornal o Globo Ancelmo Gois, cartazes de filmes nacionais que estavam expostos nos corredores da agência foram retirados, e informações sobre as obras foram retiradas do site. De acordo com a colunista da Folha de São Paulo Mônica Bergamo, os cartazes removidos serão expostos em São Paulo, no Festival Verão Sem Censura.

A situação ocorre em um ano em que a organização esteve constantemente em pauta, seja por ameaças de corte ou acusações de censura.

Relembre algumas da polêmicas que envolveram a Ancine em 2019:

Extinção e filtros

Em julho deste ano, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que tinha intenção de transferir a Ancine do Rio de Janeiro para Brasília, e transformar a agência em uma secretaria. Fora isso, ele ainda declarou que queria que a instituição passasse a ter "filtros" para decidir que projetos deveriam ser aprovados. "Vai ter filtro, sim, já que é um órgão federal. Se não puder ter filtro, nós extinguiremos a Ancine. Privatizaremos ou extinguiremos. Não pode é dinheiro público ficar usado para filme pornográfico", disse em referência ao filme Bruna Surfistinha.

Posteriormente, em uma transmissão ao vivo pelo Facebook, o mandatário disse que iria buscar a extinção da agência.

"Depois desse anúncio de fazer um filme sobre a minha pessoa, a Ancine ganhou mais um FO positivo, Fato Observado positivo. Vamos buscar a extinção da Ancine. Não tem nada que o poder público tenha que se meter em fazer filme. Que tenha uma empresa privada, sem problema nenhum. Mas o estado vai deixar de patrocinar isso daí", disse.

Suspensão de edital

Cena do curta "Afronte", criticado por Bolsonaro - Divulgação - Divulgação
Cena do curta Afronte, criticado por Bolsonaro
Imagem: Divulgação

Uma outra controvérsia envolveu o cancelamento de um edital da Ancine que tinha entre as produções séries de temática LGBT para serem exibidas nas TVs públicas, algo criticado pelo presidente, que citou quatro obras afirmando "não ter cabimento fazer filmes com esse tema".

A situação levou a uma abertura de inquérito pelo Ministério Público Federal no Rio de Janeiro, que avaliou que "tal ameaça ou discriminação podem importar em inobservância das regras editalícias, de caráter vinculante para a administração pública, bem como em discriminação constitucional vedada", além do pedido de demissão Henrique Pires, subordinado ao ministro da Cidadania, Osmar Terra. À Folha de S.Paulo, Pires sugeriu que o governo tenta impor uma censura.

Adiamento e corte

Seu Jorge e Adriana Esteves em cena de "Marighella" - Divulgação - Divulgação
Seu Jorge e Adriana Esteves em cena de Marighella
Imagem: Divulgação

As polêmicas com a Ancine também chegaram a produções nacionais. O longa Marighella, dirigido por Wagner Moura e que narra os últimos anos do ativista baiano que recorreu à luta armada para lutar contra a ditadura militar, teve sua estreia no Brasil adiada após não conseguir cumprir trâmites da Ancine para a liberação de verbas utilizadas na produção e que precisariam ser ressarcidas. "Marighella segue sendo apresentado com muitos sucesso em vários festivais de cinema no mundo. Nosso objetivo principal sempre foi a estreia no Brasil. Os produtores e a distribuidora Paris Filmes vão seguir trabalhando para que isso aconteça", declarou em nota a O2 Filmes.

Já o filme Greta, protagonizado por Marco Nanini, teve o apoio financeiro para participar no Festival Internacional Queer Lisboa rescindido pela agência, algo que seus produtores atribuíram a homofobia. "O ponto difícil de aceitar nessa resolução da agência, sem entendê-la como censura, é que o nosso apoio foi aprovado há 3 semanas, a decisão retroativa poupou os projetos que participaram dos festivais de Toronto e Veneza, entretanto recaiu sobre dois filmes com temática LGBTQI+ inviabilizando a representação do Brasil num dos maiores festivais do gênero no mundo", diz o comunicado.

Denúncia e Renúncia

Christian de Castro, presidente afastado da Ancine - Zanone Fraissat/FOLHAPRESS - Zanone Fraissat/FOLHAPRESS
Christian de Castro, ex-presidente da Ancine
Imagem: Zanone Fraissat/FOLHAPRESS

O presidente da agência, Christian de Castro, também teve o nome envolvido em polêmica, tendo sido denunciado três vezes pelo MPF do Rio sob a acusação de falsidade ideológica e estelionato, em concurso material, por prestar declaração falsa a respeito de vínculos societários à Ancine e à Comissão de Ética Pública da Presidência da República.

Após ser afastado do cargo por uma decisão da 5ª Vara Criminal Federal do Rio, Castro renunciou ao cargo em novembro.

"Dirijo-me à Vossa Excelência para apresentar meu pedido de renúncia ao cargo de Diretor-Presidente da Agência Nacional do Cinema (Ancine), para o qual fui convidado em agosto de 2017, pelo então Ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão. Nestes dois anos de mandato, quase integralmente exercendo a presidência da agência, cumpri o meu dever e o compromisso assumido em minha sabatina de trabalhar incessantemente pelo desenvolvimento do mercado audiovisual brasileiro (...) Sou um técnico. Não pertenço a grupos políticos. Nunca tive o desejo ou a ambição de ocupar cargos públicos ou políticos", declarou ele.