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Contra o machismo, HQ retrata preconceitos sofridos por quadrinistas mulheres

A quadrinista Cris Camargo expõe sua HQ Ser Artista Mulher é... - Divulgação
A quadrinista Cris Camargo expõe sua HQ Ser Artista Mulher é... Imagem: Divulgação

Felipe Branco Cruz

Do UOL, em São Paulo

14/07/2019 04h00

Em 2016, a editora e publicitária gaúcha Cris Camargo deu uma guinada na carreira e decidiu se dedicar ao que mais ama: os quadrinhos. Desde então, começou a participar de eventos de cultura pop no Brasil e no exterior apresentando a sua arte e vendendo suas HQs, sempre de maneira independente.

Mas a artista percebeu que o ambiente da cultura pop ainda é majoritariamente masculino e machista e ela resolveu canalizar para os quadrinhos as situações preconceituosas que vivenciou ou testemunhou nesses eventos. O resultado é a HQ Ser Artista Mulher É?, em que retrata 22 situações (sendo 15 sofridas por ela) de machismo na área.

Tirinha da quadrinista Cris Camargo - Reprodução/Cris Camargo - Reprodução/Cris Camargo
Tirinha da quadrinista Cris Camargo
Imagem: Reprodução/Cris Camargo

Cris percebeu também que ainda vigora uma antiga noção cultural que classifica desenho, quadrinhos, ilustração e pintura como competências masculinas. "Ainda persiste uma mentalidade de que quadrinhos são coisa de 'homem', e infelizmente boa parte do público nerd masculino médio ainda é muito preconceituoso e conservador", contou ao UOL.

Quadrinho da Cris Camargo sobre machismo nas ferias de cultura pop - Reprodução/Cris Camargo - Reprodução/Cris Camargo
Quadrinho de Cris Camargo sobre machismo contra as artistas
Imagem: Reprodução/Cris Camargo
Os quadrinhos retratam situações graves sofridas por mulheres que vão do assédio à invisibilidade das autoras. "Eu, por exemplo, sofri assédio por parte de um cara que me perseguiu por vários eventos seguidos. Contatei minha advogada, fiz B.O. e a organização do evento tomou as devidas providências", disse.

A HQ retrata de maneira bem-humorada as diversas situações de preconceito e assédio que as mulheres (especialmente as quadrinistas) são submetidas nessas feiras. O preconceito se estende também ao ambiente virtual. Em sua página no Facebook, Cris costuma receber comentários ofensivos e já recebeu até ameaças de morte de homens que criticam seus quadrinhos.

Dentre as situações descritas por Cris estão algumas aparentemente inofensivas, como perguntar "onde está o autor daqueles desenhos", sem perceber que a autora é uma mulher, ou criticar um desenho sombrio ou mais agressivo dizendo que "mulher tem que fazer trabalhos mais delicados".

Reprodução das tirinhas publicadas por Cris Camargo sobre preconceito - Reprodução/Cris Camargo - Reprodução/Cris Camargo
Reprodução das tirinhas publicadas por Cris Camargo sobre preconceito
Imagem: Reprodução/Cris Camargo
"Entendo que o absurdo de algumas situações faça o leitor achar que há exagero ou invencionice de minha parte, mas todas as situações retratadas nessa coletânea, que envolvam autoras, são reais. Infelizmente", contou.

A boa notícia é que o número de mulheres quadrinistas está aumentando desde 2015. Cris estima que cerca 35% dos quadrinistas que participam de feiras de cultura pop atualmente são mulheres. "Ainda é pouco, mas estamos ganhando cada vez mais espaço", disse, apontando como exemplo no Brasil as meninas do Studio Seasons (Montserrat, Simone Beatriz e Sylvia Feer), a Lu Caffagi e a Laura Athayde. No exterior, ela aponta Marjane Satrapi e Gail Simone.

"A coletânea não pretende apenas denunciar as diferenças de tratamento no meio artístico, mas também conscientizar sobre a desigualdade de gênero que ainda existe", concluiu.

Como se trata de uma publicação independente, ela pode ser comprada por R$ 20 direto com a autora no Facebook ou nas feiras e eventos de cultura pop.