Topo

Pagode, gospel e sertanejo: um passeio pela inusitada discografia de Magno Malta

O senador, pastor e cantor evangélico Magno Malta - Divulgação
O senador, pastor e cantor evangélico Magno Malta Imagem: Divulgação

Leonardo Rodrigues

Do UOL, em São Paulo

12/12/2018 04h00

"Magno Pereira Malta nasceu na cidade de Macarani, no estado da Bahia, em 16 de outubro de 1957. Se tornou pastor evangélico e integrante da banda de pagode gospel Tempero do Mundo, começando sua carreira pública em 1993 como vereador em Cachoeiro de Itapemirim, no Espírito Santo."

***

O verbete da Wikipédia, assim como a maioria das fontes de pesquisa da internet, traz poucas informações sobre a carreira musical do senador Magno Malta (PR-SP), uma das lideranças conservadoras mais controversas da política brasileira, que está se despedindo do Congresso Nacional após 16 anos consecutivos de mandato.

Malta perdeu a reeleição no Espírito Santo e, contra sua vontade e expectativa, foi descartado pelo presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) na nova composição ministerial. O que ele fará daqui pra frente? O pastor evangélico de 61 anos já sinalizou que agora pretende se dedicar a palestras e à continuidade de sua carreira de cantor gospel.

É isso mesmo. Magno Malta é músico profissional. Cantor, compositor e produtor com dezenas de discos lançados. Parte de sua obra, que vai do gospel clássico ao pagode e sertanejo de raiz, pode ser acessada no YouTube e nas plataformas de streaming.

Procurado pelo UOL para comentar sobre seu novos rumos, o senador não respondeu ao pedido de entrevista, mas nem por isso vamos deixar de falar dele. Veja abaixo um resumo de suas principais investidas musicais disponíveis na internet.

Primeiro LP Solo

Há poucas informações disponíveis, mas, aparentemente, este é o primeiro trabalho solo de Magno Malta. Na contracapa, ele explica que lançou o álbum para poder "ajudar as famílias". Trata-se de uma extensão de seu projeto Vem Viver, que auxilia dependentes químicos e é parcialmente financiado pelas vendas de discos. Com arranjos de teclado que parecem ter saído de alguma churrascaria dos anos 1980, o disco soa como se Humberto Gessinger, dos Engenheiros do Hawaii --é nítida a semelhança vocal--, fosse um garoto que amasse Amado Batista e Reginaldo Rossi. As letras, sobre os percalçados da vida, variam do vício em álcool e psicotrópicos à prostituição.

"Bebendo de Uma Fonte"

A aura de churrascaria é levada às últimas consequências neste disco que, segundo o blog "Paraíso da Raridades", foi lançado em 1981. É uma obra difícil de ser consumida. Magno Malta capricha no louvor, mas derrapa na afinação. As faixas que atiram para todos os lados. "Olhos Cegos" parece ter saído de um disco do Balão Mágico, enquanto "Poder de Deus" tem baixo funk e guitarras à la David Gilmour, do Pink Floyd. Mas isso não é exatamente um elogio. Para completar, "Suplica Nordestina" emula um baião estranho, que soa como sido gravado em um abrigo antiaéreo na Bahia.

"Panorama"

Não se engane com a duvidosa camisa estampada com temas espaciais, Magno Malta quer te conquistar -e não é pela cientologia. Louvando a vida consagrada e em defesa da família, ele se assume como crooner romântico, e a produção melhora um pouco. É um disco para quem gosta Nelson Ned, Roberto Carlos e Odair José, mas com Deus acima de tudo. "O Rosto de Cristo", "Antes que Os Cimos Caiam" e "Perdoa-me" são os destaques. Nos comentários do YouTube, por sinal, o professor Willians Moreira Damasceno acusa Malta de assumir ilegalmente a coautoria das duas últimas, que seriam só dele. "Para completar a sua façanha, não colocou o meu nome correto nem completo", desabafa.

"Eu Te Amo"

A foto pagando de galã Caiçara chega a enganar, mas foi aqui que Magno Malta começou, ainda que discretamente, a explorar sua verve sertaneja. Com participação da cantora Marina de Oliveira, "Pedra Viva", já gravada por Nelson Ned, se destaca. Mas é um disco que fica o tempo todo no "quase". "Eu te Amo", conhecida na voz de Ozeias de Paula, quase consegue superar seu arranjo brega. "Vem Cantar Comigo", creditada a Malta, quase chega a lembrar "Homem Com H" (Ney Matogrosso). Já a suingada "Eu Quero Ver" quase poderia ser cantada por Alceu Valença. Bastaria mudar o arranjo, a produção e o vocal.

"Meu País"

Lançado em 2005, é um dos poucos trabalhos do senador disponível nas plataformas de streaming. É perceptível a evolução em arranjos e composições. As letras têm menos pregação explícita e (um pouco) mais de reflexão. Certos temas, no entanto, não mudam. "Menino do Sinaleiro" retoma a vertente social de "Menino de Rua" e "A Menina da Esquina", sobre os percalços de uma jovem prostituta, ganha uma nova versão, mais moderna, com sonoridade de tema de novela das 6. "Alguém ama você sem interesse no seu corpo/Ele não olha aparências, ele vê o coração/Jesus ama você". Vale para quem não tem preconceito.

"Nosso Tributo"

Nada de "topzêra" ou sofrência. O sertanejo aqui está mais para modão com sanfona e cheiro de fazenda. Sim, Magno Malta tem um bom disco, bem produzido, capaz de agradar a qualquer fã de sertanejo raíz. O único porém seria abstrair as letras. Foi lançado em 2018 em parceria com a mulher, a cantora gospel e deputada federal Lauriete (PR-ES), um dos grandes nomes do gospel brasileiro. O empurrãozinho ajudou. Eles cantam como uma afinada e entrosada dupla. "Desejo Missionário", "Se Isso Não for Amor" e "Sempre Alegre" vão te transportar para um lugar, sem luz elétrica nem corrupção, num ranchinho goiano a milhas do Congresso Nacional.

"Festa" (Tempero do Mundo)

Se você curte samba mas acha que ambiente de pandeiro e cavaco é ambiente de álcool, pecado e perversão, este álbum do Tempero do Samba pode ter sido lançado para você. Foi lançado em 2009 misturando diversas sonoridades do estilo, do pagodinho do bem ("No Silêncio") ao partido alto ("É Ruim de te Deixar"), mas o teclado ao junto não ajuda. Magno divide o vocal com colegas nas faixas e também dá espaço a uma balada soul ("Sol e Lua") e a letras involuntariamente engraçadas como "Sem Vergonha". "Crente tem que ser sem vergonha. Tem que passar na rua e o povo dizer 'ali tá passando um crente sem vergonha.' Um ótimo esquenta para o culto.