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Site dá "spoilers do bem" para pessoas com fobias e transtorno de ansiedade

Você só assistirá ao novo "Benji" se tiver certeza que o cãozinho não morrerá no fim? Seus problemas acabaram - Divulgação
Você só assistirá ao novo "Benji" se tiver certeza que o cãozinho não morrerá no fim? Seus problemas acabaram Imagem: Divulgação

Leonardo Rodrigues

Do UOL, em São Paulo

15/08/2018 04h00

Você está zanzando pelo seu serviço de streaming favorito e se depara com aquele filme incensado, sobre o qual todos estão comentando, mas que você nunca teve coragem de assistir. O motivo: há um personagem canino na história e você não tem estrutura emocional para lidar com sua possível morte. Tudo se resolveria com um mero e providencial aviso.

Já passou por algo assim? Se a resposta for "sim", saiba que existe um site feito para você, o sugestivo "Does the Dog Die?" (o cachorro morre?). A ideia é simples: fornecer uma espécie de "spoiler do bem” a quem não tem estômago para determinadas desgraças.

Imagem do DoesTheDogDie.com - Reprodução - Reprodução
Imagem do DoesTheDogDie.com
Imagem: Reprodução

Todo em inglês, o endereço funciona como um grande e colaborativo banco de dados que rastreia 57 elementos fixos nas histórias, que não se restringem a mortes de animais e também incluem séries, livros e videogames. Chamados de "gatilhos", os tópicos trazem perguntas reveladoras acompanhadas apenas das alternativas “sim” e “não". Elas vão desde detalhes aparentemente infantis como “Alguém solta pum ou cospe?” e “O Papai Noel é revelado?” a revelações um tanto mais pesadas: “Alguém é torturado?”, “Alguém morre por suicídio?”, “Alguma criança é abusada?”. É o próprio internauta quem responde às perguntas e definem o que o que há e não há no título em questão.

A ideia surgiu da mente do desenvolvedor de softwares John Whipple. Fanático por cinema, que percebeu uma verdadeira proliferação de filmes com cães colocados em perigo por roteiristas com único intuito de manipular o sentimento do espectador. No início, ele queria apenas avisar sobre cachorros, mas o projeto foi crescendo. Lançado em 2011 com informações de 80 títulos, o "Does the Dog Die?" traz alertas de de 6.000 filmes, 600 programas de TV, 300 livros e 150 videogames, todos sob o escudo de “prevenção de ansiedade”.

“Na minha opinião, não se trata de dar spoiler. Spoiler é uma revelação que muda drasticamente a história. Estamos mais interessados em mostrar tópicos comuns que o criador do filme usa para evocar uma resposta emocional rápida das pessoas. Às vezes, a morte de um cachorro pode servir de spoiler, mas na maioria das vezes nós só permitimos às pessoas terem controle sobre seus medos específicos”, diz ao UOL Whipple.

Além de tranquilizar o público, o site também funciona como uma forma de interessante de pais monitorarem o que os filhos planejam assistir, já que os gatilhos incluem variáveis que vão muito além dos critérios tradicionais de classificação indicativa. Traumas provenientes de filmes aparentemente “tranquilos”, tão comuns na tenra infância, podem ser contornados. Outra função, segundo Whipple, é contribuir para a indústria do entretenimento fazendo com que filmes e outros produtos culturais não deixem de ser consumidos por puro preconceito.

Cena de "Marley e Eu" - Reprodução - Reprodução
Você teria começado a ver "Marley e Eu" se soubesse como termina o filme?
Imagem: Reprodução

Como tudo na vida, há o outro lado da moeda. Você é do tipo que curte cenas fortes e não não teme absolutamente nada na tela? O site dedica um ranking para as produções filmes com mais gatilhos de trauma de ansiedade. Os explícitos “Akira”, “Hannibal” e a "Teen Wolf” lideram a lista de filmes com mais de 30 alertas.  Famosa pelas cenas de sangue e sexo, a popular "Game of Thrones" também está entre as produções mais "problemáticas", com 37 avisos.

A necessidade crescente por informação prévia seria sinal de que estamos cada vez mais impressionáveis e hipersensíveis a qualquer coisa? O criador do "Does the Dog Die?" diz que não. “Quando lancei o site eu pensava desse jeito. Mas, conversando com internautas, percebi que muitos não assistem a filmes se não tiverem certeza que suas fobias não estarão na tela. Pessoas com fobias simplesmente não assistem a muitos filmes. Com o site, eles podem ver mais filmes e se expor a mais produtos culturais.”

Cena de "Game of Thrones" - Reprodução - Reprodução
Sem revelar muitos detalhes, site dá alertas de cenas potencialmente traumáticas em filmes e séries, como "Game of Thrones"
Imagem: Reprodução

Assédio

Em tempos de denúncias contra assédio e intolerância a comportamentos abusivos, o gatilho “Alguém é sexualmente abusado?" não poderia ser ignorado pela plataforma. Quem clica nesse gatilho é direcionado ao site "Unconsenting Media", que John Whipple ajudou a desenvolver com alunos da Universidade de Cambridge, e que acompanha com mais detalhes casos de violência sexual que pipocam no showbusiness.

Assim como plataformas irmãs, como o “Rotten Apples”, "Common Sense Media" e o "Where’s the Jump?", o "Does the Dog Die? tem seus problemas. Exemplo: atrações com títulos idênticos acabam se misturando no banco de dados. Os avisos de conteúdo da série "Teen Wolf" incluem os do filme homônimo, e o mesmo acontece em livros que ganharam adaptações para o cinema.

O problema de desenvolvimento deve ser resolvido em breve. “Eu gosto de equilibrar o tempo que gasto em melhorias para o site com a adição de novos gatilhos sugeridos pelo nosso público. Esses problemas serão corrigidos, mas isso pode levar algum tempo.”