Topo

Controle mental: Como o culto sexual de atriz de Smallville atraía vítimas

A atriz Allison Mack - Drew Angerer/Getty Images
A atriz Allison Mack
Imagem: Drew Angerer/Getty Images

Do UOL, em São Paulo

30/05/2018 16h34

Em outubro de 2017, o New York Times publicou um alarmante artigo que trouxe à tona práticas extremamente nocivas de um grupo chamado NXIVM (pronuncia-se nexium). Desde então, uma avalanche de denúncias de abusos envolvendo fome, humilhação e sexo fez com que o grupo que pregava empoderamento tivesse sua nomenclatura alterada para seita ou culto. Liderada Keith Raniere, de 57 anos, preso em março deste ano, a Nxivm logo revelou membros conhecidos do grande público, como a atriz Allison  Mack, que interpretou por dez temporadas a jornalista Chloe  Sullivan na série "Smalville". Ela era uma das responsáveis por buscar e convocar novas integrantes para o Nexium. Mas como essas mulheres eram convencidas a entrar no grupo?

O New York Times publicou um novo artigo, nesta quarta-feira (30) para tentar o entender o poder de persuasão da seita. A repórter Vanessa Grigoriadis acompanhou uma sessão que supostamente ajuda as novas integrantes a buscarem cura para traumas ou simplesmente diminuir distúrbios de insegurança. Neste caso, quem conduziu a conversa foi Nancy Salzman, de 63 anos, que atendeu Jacqueline, uma estudante de psicologia de 27 anos, que afirmou que nunca havia sentido algo tão "efetivo" quanto o Nxivm.

Keith Raniere - Site oficial/Divulgação - Site oficial/Divulgação
Acusado de tráfico humano, Keith Raniere foi preso após fugir para o México
Imagem: Site oficial/Divulgação

Nesta sessão de terapia, Salzman, que estudou programação neurolinguística - incluindo hipnose e técnicas de empatia -, faz com que Jacqueline vá buscar memórias de sua infância. A tentativa era de solucionar um medo de voar de avião, que chegou fazer com que a estudante fosse impedida de embarcar por surtar dentro da aeronave antes da decolagem. Após fazer várias perguntas pessoais, ela logo relaciona a fobia ao relacionamento dos pais da estudante, lembrando a dependência da mãe pelo pai e o fato da família se mudar constantemente - sempre de avião -. A conclusão é que o seu medo de voar estava conectado com a crença de que sua mãe teve uma vida terrível causada por seu pai. Tudo isso estaria conectado com sua incapacidade de ser uma mulher independente.

"Você está fingindo ser uma mulher desamparada", questionou Salzman. "Assim que eu recebo atenção. Esse é o meu tipo de coisa", respondeu Jacqueline. Neste momento da jornada é que Salzman explica para a estudante que é "permitido que mulheres sejam dependentes dos homens". 

Leia mais:

A reprogramação de Raniere

Após meia hora, Jacqueline afirma ter "tirado um peso" e se sentir muito bem após a sessão. Parte de seu processo também incluiria "fazer algo que a aterrorizasse muito" nos próximos 30 dias.

De acordo com a matéria, este tipo de prática foi fundamental para que novas integrantes fossem convocadas para o grupo. Cria-se um relacionamento de confiança baseado na empatia e "rituais de cura" baseado na penitência.

"Essa é a maneira mais potente de desconstruir um gatilho emocional e mudar totalmente a maneira que você pensa", disse uma ex-integrante não identificada da seita ao artigo.

A seita tinha como objetivo "zerar" alguns desses traumas e basicamente reprogramar as pessoas que ingressavam em níveis cada vez mais mais profundos da organização. Quando menos imaginavam, já estavam plenamente integradas com o universo de Raniere, privadas de sono, com fome e sendo abusadas sexualmente.

A reportagem afirma que conversou com diversas ex-integrantes que eram entusiastas de matemática, ciência e com a percepção acima da média. E todas concordaram: a "tecnologia" funciona, Raniere pode te reprogramar. "Ele havia solucionado a equação do ser humano feliz. Ele decidia sobre sua ética e as criava sob disciplina", diz o texto.

Allison Mack é fotografada ao deixar tribunal em Nova York, nos Estados Unidos - Jemal Countess/Getty Images - Jemal Countess/Getty Images
Allison Mack é fotografada ao deixar tribunal em Nova York, nos Estados Unidos
Imagem: Jemal Countess/Getty Images

Allison Mack e a fiança de US$ 5 milhões

A atriz de "Smallville" pagou o valor milionário e foi liberada para aguardar seu julgamento em liberdade, usando uma tornozeleira eletrônica. Durante o período, Allison, que alegou inocência, só poderá viajar com autorização da justiça, está proibida de de usar o telefone celular, internet e se comunicar com membros da NXIVM.

O site da revista People diz que os advogados de Allison estariam trabalhando em um acordo de delação com a promotoria. A atriz estaria interessada em cooperar com a justiça para provar as acusações contra Raniere para tentar diminuir sua pena, que pode variar de 15 anos a perpétua.