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Descobri que estava fazendo pro Tarcísio, diz idealizador de "O Camareiro"

Miguel Arcanjo Prado

Colaboração para o UOL, em São Paulo

21/11/2015 06h00

Quando viu o filme "O Fiel Camareiro", em 1984, o ator carioca Kiko Mascarenhas, 51, foi fisgado pela história sobre os bastidores do teatro. Porém, não imaginava que mais de 30 anos depois seria responsável por levá-la ao palco no Brasil, possibilitando a volta aos palcos de Tarcísio Meira, após 20 anos de jejum teatral do maior galã da TV.

Na peça "O Camareiro", em cartaz  até 13 de dezembro no Teatro Porto Seguro, em São Paulo, Mascarenhas dá vida ao personagem título, que se esmera nos cuidados de um grande astro de uma companhia teatral inglesa, vivido por Meira, enquanto Londres é bombardeada pelos nazistas na Segunda Guerra Mundial.

"O Camareiro" acabou sendo um presente de Mascarenhas a Meira. "Acho que num primeiro momento pensei em montar uma peça para mim, mas, depois descobri, no meio do caminho, que estava fazendo uma peça para o Tarcísio. E não me arrependi", diz o ator, em seu camarim, enquanto vai se transformando para entrar em cena.

Mascarenhas conta que ficou surpreso quando o amigo tradutor Diego Teza lhe falou do texto de "O Camareiro". Este fazia uma pesquisa de peças que viraram filmes e disse que Mascarenhas deveria encená-lo. "Li primeiro em inglês, mas achei que ninguém se interessaria por uma peça com os bastidores do teatro. Depois, quando o Teza traduziu, vi que era uma história de pessoas lutando por sobrevivência", conta.

Ao perceber a universalidade da peça, resolveu montá-la: "O mundo está desabando em volta deles, e a grande missão dos personagens é sobreviver e manter a arte viva. E o mundo continua em guerra, e o teatro continua em frangalhos, com artistas lutando para sobreviver".

Sonho com Tarcísio Meira

Assim que comprou os direitos, Mascarenhas convocou Ulysses Cruz para dirigir. "Foi o Ulysses quem me apresentou o teatro londrino. Como ele é apaixonado por Shakespeare, e a companhia da peça é shakespeariana, tinha de ser ele", explica.

Foi quando começou a sonhar em ter Tarcísio Meira como Sir, a estrela da companhia da peça. A admiração vinha desde a novela "Irmãos Coragem", de 1970, quando "ele usava aquele couro de vaca e contracenava com a Glória Menezes", no folhetim de Janete Clair, lembra.

"Pensei em Tarcísio de cara, porque o Sir é um homem de grande porte, com personalidade marcante, que já fez muito sucesso e dedicou sua vida à arte de interpretar. O similar a ele no Brasil é o Tarcísio Meira", diz Mascarenhas.

Amigos quase o fizeram desistir da ideia. "Deixa disso", diziam, falando que o astro nunca aceitaria, que tinha fazenda e muitos compromissos com a TV Globo. "Como já tinha o não, resolvi tentar. Mandei o texto para ele. E ele se apaixonou e topou, para nossa felicidade", comemora.

Para Mascarenhas, "O Camareiro" faz sucesso pela simplicidade e verdade do texto. "Tem drama, comédia, é um texto linear que escapa dessa cilada do teatro contemporâneo de fragmentar os textos. Porque hoje em dia desconstruíram Tchekhov da cabeça aos pés", alfineta.

Água para Tarcísio

Nesta condução de bastidores, Mascarenhas acabou sendo uma espécie de camareiro do próprio Tarcísio, durante os ensaios, repetindo na vida real a função de seu personagem. "Cuidei para que tudo fosse prazeroso e tranquilo para ele. E não o deixava ficar sem beber água", recorda. "Teve momentos em que o Tarcísio ficava exausto, mas ele sabia disso, que teatro é artesanal, e foi muito paciente. Hoje, está todo empolgado e quer viajar com a peça pelo Brasil depois de encerrarmos em dezembro a temporada aqui em São Paulo", conta.

Muitas falas do personagem de Meira na peça ganham "dimensão real" aos ouvidos de Mascarenhas e da própria plateia. "É metalinguagem total, até porque ele é um ídolo que sempre esteve em nossa casa. A gente só finge que é normal estar ali com ele", explica.

"Tem uma hora que o Tarcísio diz em cena: 'é mais fácil atingir o sucesso do que se manter nele'. O Tarcísio fala isso com a propriedade de ter sido um dos poucos que se mantiveram. Viu tantos ascendendo e caindo à sua volta, enquanto ele permanecia de pé", pondera.

TV e cinema

Além da peça, Kiko Mascarenhas ainda se divide entre o papel de Galeão Cumbica na reedição da "Escolinha do Professor Raimundo", no canal pago Viva — "está um elenco fantástico e é uma honra participar desse projeto" —, e o mordomo Gomes, da série "Mister Brau", da Globo, com Lázaro Ramos e Taís Araújo — "ele fica boquiaberto porque seus patrões não ligam para os protocolos, e aí está o humor".

O ator ainda guarda fôlego para estrear nos cinemas o filme "Até que a Sorte nos Separe 3", em dezembro, "em mais uma etapa da saga".

Mesmo com a correria, Mascarenhas afirma estar feliz: "Estou trabalhando muito, graças a Deus, não posso reclamar, porque tem atores aí que passam até cinco anos sem receber um convite. Então, só posso reclamar de não dormir. Um amigo fala: a gente passa a vida inteira pedindo a Deus uma oportunidade, aí Ele resolve dar tudo de uma vez, tipo um rali Paris-Dakar [risos]".

Serviço

"O Camareiro"
Quando: até 13/12. Sessões: Sex. e sáb., às 21h; dom., às 18h
Onde: Teatro Porto Seguro - al. Barão de Piracicaba, 740 - Campos Elísios
Quanto: R$ 100 (Plateia, inteira)  e R$ 80 (Balcão/Frisas, inteira)
Vendas: www.ingressorapido.com.br
Capacidade: 508 lugares
Duração: 120 min., com intervalo
Classificação: Não recomendado para menores de 12 anos
Mais informações: www.teatroportoseguro.com.br